O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, chegou à metade de seu mandato. Esses dois anos foram marcados por grandes expectativas, esperanças de mudança e propostas ambiciosas de transformação social promovidas pelo governo. No entanto, os problemas estruturais persistem, e alguns avanços foram prejudicados por escândalos de corrupção e decepções com o lento progresso de algumas reformas.
Vale lembrar que desde o início do governo de Petro, como o primeiro governo de esquerda do país, apresentou uma agenda ambiciosa no marco de uma oportunidade histórica no que o próprio governo chamou de “o governo da mudança”. No entanto, houve vários obstáculos que impediram o avanço de várias propostas para as quais foi eleito em junho de 2022.
Em primeiro lugar, o antipetrismo conseguiu se consolidar como uma força que afetou a gestão do presidente. Essa rejeição a Petro como líder político, e não à esquerda ou ao partido do governo em si, tem sido um dos principais obstáculos para avançar com várias reformas. Precisamente, elas receberam pouco apoio tanto no âmbito legislativo quanto na opinião pública.
Esse anti-petrotrismo surge desde a gestão de Petro como prefeito e se intensificou nas ocasiões em que Petro foi candidato à presidência. Não é de surpreender que a frase “culpa de Petro” tenha se tornado comum, pois reflete como o atual presidente começou a gerar cada vez mais ódio e, consequentemente, várias das emoções associadas, como raiva, desprezo, frustração e medo.
A militância de Petro no M-19 durante sua juventude contribuiu para que fosse visto como um símbolo do comunismo e que encarna “o fantasma da Venezuela” no país, o que levou a ataques frequentes nas redes sociais com o disfemismo “o presidente guerrilheiro”.
Por sua vez, vários meios de comunicação colombianos, que não tinham exercido um papel muito ativo na denúncia e crítica de governos anteriores, foram decisivos para aumentar a opinião pública negativa em relação a Petro, questionando a grande maioria de suas decisões e ações e dando ampla cobertura, por exemplo, aos escândalos que afetaram a gestão atual. Essa relação tensa com a mídia tem sido determinante para o aumento dos níveis de desaprovação do presidente, que, segundo as últimas pesquisas, estão próximos de 60%.
Por sua vez, o presidente tentou defender seu governo e a relevância de suas reformas por meio de canais oficiais e redes sociais, embora com um uso muitas vezes excessivo e pouco assertivo da rede social X (antigo Twitter).
Em segundo lugar, houve escândalos de corrupção que comprometeram direta e indiretamente o avanço de várias das mudanças propostas pelo atual governo. Esse é o caso do escândalo de compra de votos que afetou o filho do presidente, Nicolás Petro, e, sobretudo, o da Unidade Nacional de Gestão de Risco de Desastres (UNGRD), entidade que havia sido usada pelo governo para que congressistas aprovassem reformas por meio de contratos milionários.
O fato de o “governo da mudança” continuar com práticas de corrupção e clientelismo, como os governos anteriores, gerou indignação entre seus eleitores, enquanto a oposição e os detratores do governo veem esses escândalos como novos e incomuns na história do país. No entanto, vale lembrar o escândalo da Oderbrecht durante o governo Santos ou o chamado escândalo da “ñeñepolítica”, que consistiu na compra de votos para as eleições de Iván Duque com dinheiro do narcotráfico, ou a corrupção no contrato de conectividade rural, também no governo Duque, para mencionar apenas alguns exemplos.
Em terceiro lugar, a ingovernabilidade tem sido um fator determinante para os lentos avanços na agenda governamental. A frágil coalizão com a qual o governo começou no Congresso entrou em colapso em poucos meses, especialmente com os debates sobre a reforma da saúde. Apesar de ter avançado em algumas reformas, como a tributária e a previdenciária, outras reformas importantes, como a da saúde e a da educação, sofreram forte oposição do Congresso e da opinião pública.
Nesse sentido, é evidente que, diferente de governos anteriores, este governo teve de demonstrar habilidades de negociação significativamente superiores, pois está claro que não se trata apenas de um debate técnico sobre a relevância das reformas, mas também reflete o poder persistente dos partidos tradicionais e conservadores no Congresso. Da mesma forma, o debate público tem sido dominado mais por ataques pessoais e críticas generalizadas ao governo do que por um debate sério sobre a relevância das reformas e seu conteúdo.
Por fim, há fatores estruturais que impediram o progresso da agenda do governo. Por exemplo, o governo propôs metas ambiciosas relacionadas à consolidação da paz no país, talvez o maior desafio que a Colômbia enfrentou nas últimas décadas. Foi assim que se promoveu a Paz Total, que abriu caminho para negociações com praticamente todos os grupos armados, como o Clã do Golfo, o ELN e os dissidentes das FARC.
No entanto, diferentemente dos processos de paz anteriores, a fragmentação dos grupos armados e o maior controle territorial que eles obtiveram, entre outras coisas porque ocuparam os espaços vazios deixados pelos guerrilheiros das FARC, dificultaram as negociações. Como resultado, vários desses grupos não continuaram na mesa de negociações e o governo fez apenas progressos parciais e muito concretos.
Em conclusão, o governo de Petro enfrentou vários obstáculos que muito provavelmente continuarão a condicionar o progresso das reformas até o fim de seu mandato. O fato de ser o primeiro governo de esquerda do país gerou grandes expectativas entre os eleitores, mas também gerou uma oposição que continuará usando vários recursos, como influenciar a opinião pública, para impedir qualquer ação que implique mudanças substanciais.
Os erros que o governo de Petro cometeu, como os relacionados a nomeações imprudentes e escândalos de corrupção, não devem ofuscar a necessidade de avançar com várias reformas sociais. Mas, além disso, é importante não esquecer a relevância de continuar a ampliar a democracia na Colômbia, historicamente excludente e violenta contra forças alternativas, como demonstra o assassinato de candidatos presidenciais e pelo extermínio da União Patriótica.
Autor
Professor da Escola Superior de Administração Pública - ESAP (Bogotá). Doutor em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ).