Por mais de seis décadas, mais de meio milhão de cubanos foram detidos ou presos por motivos políticos. A prisão política em Cuba criou uma profunda crise humanitária, devastando milhares de famílias e deixando marcas duradouras por gerações. Apesar dessa dura história, os esforços para promulgar uma Lei de Anistia para libertar dezenas de milhares de pessoas presas injustamente por exercerem seus direitos enfrentam uma resistência obstinada do regime atual. Ironicamente, esse mesmo regime deve sua existência a uma Lei de Anistia: a legislação de maio de 1955 que libertou Fidel Castro, Raúl Castro e outros após o violento ataque ao Quartel Moncada. Diferentemente dos paramilitares revolucionários de 1953, os prisioneiros políticos de hoje estão presos por protestos pacíficos, não por atos de violência ou terrorismo.
Atualmente, Cuba tem o segundo maior número de presos políticos da América Latina, depois da Venezuela, com 1.117 pessoas encarceradas, incluindo 120 mulheres e 30 menores de idade. Dezenas de milhares de outras pessoas estão presas por acusações arbitrárias, como desobediência criminosa pré-delinquente, que se aplica a pessoas por possíveis ofensas percebidas sem que elas tenham cometido qualquer crime. Não se sabe quantas dessas pessoas foram detidas especificamente por causa de suas crenças políticas.
As famílias dos presos políticos cubanos relatam condições horríveis: negação de atendimento médico, confinamento solitário, violência sexual, espancamentos, desnutrição e tortura. O líder pró-democracia José Daniel Ferrer, detido arbitrariamente desde julho de 2021, sofre espancamentos, isolamento e 20 meses sem visitas familiares por se recusar a ir para o exílio e escolher ficar em Cuba para lutar pela liberdade.
A detenção do jornalista José Gabriel Barrenechea Chávez, acusado de liderar protestos em Encrucijada, Villa Clara, durante o apagão cubano, destaca a repressão do regime. Barrenechea, que enfrenta acusações de dissidência por sedição, iniciou uma greve de fome para protestar contra sua detenção arbitrária.
A campanha do Latinoamérica21 e de outros meios de comunicação pela libertação de Barrenechea ressalta um apelo global para libertar todos os cubanos detidos injustamente por exercerem direitos humanos fundamentais, incluindo a liberdade de expressão, associação e manifestação pacífica.
Aproveitando esse impulso, em um momento em que Cuba tem mais pessoas detidas arbitrariamente do que nas décadas anteriores, a iniciativa da Lei de Anistia liderada pelo Conselho para a Transição Democrática em Cuba (CTDC), uma coalizão de organizações dentro e fora da ilha, oferece uma possível solução. Apoiada por líderes pró-democracia na prisão e pelas famílias dos presos políticos, a iniciativa oferece um caminho legal para a justiça.
Anunciada em 24 de fevereiro de 2022, a iniciativa da Lei de Anistia sofreu atrasos devido a obstáculos legais impostos pelo regime cubano. O CTDC agora planeja relançá-la no Dia dos Direitos Humanos, renovando seu apelo pela libertação de presos políticos. Em um país onde as leis e práticas violam os padrões internacionais de direitos humanos, a proposta da Lei de Anistia oferece uma solução transformadora. Ela extinguiria a responsabilidade criminal, eliminaria condenações e limparia registros criminais, potencialmente libertando dezenas de milhares de pessoas presas por crimes politicamente motivados ou acusações pré-criminais arbitrárias. A proposta do CTDC, que requer a aprovação da Assembleia Nacional, é fundamental para descriminalizar a dissidência, afirmar o direito da oposição de existir e restaurar os direitos soberanos do povo cubano.
Mudar a lei dentro do sistema totalitário de Cuba é uma batalha difícil. De acordo com a constituição de 2019, são necessárias 10.000 assinaturas para que um projeto de lei seja considerado, mas essas assinaturas não são vinculantes. Uma legislação menos conhecida, a Lei 131, exige que os signatários obtenham certificados de eleitor do Conselho Nacional Eleitoral em Havana. Para a maioria dos cidadãos fora da capital, os custos de viagem excedem em muito o salário médio mensal, o que os priva de seus direitos. Essas barreiras legais, juntamente com a perseguição e a vigilância da oposição cubana, tornam assustadora a mobilização em meio a apagões e escassez severa. No entanto, a situação dos presos políticos e de suas famílias continua sendo uma força poderosa que leva muitos cubanos a se levantarem em busca de justiça.
Historicamente, qualquer legislação impulsionada pelos cidadãos exige alguma vontade política dos que estão no poder para ser aprovada. Em Cuba, essa vontade está completamente ausente. Quando o Projeto Varela de Oswaldo Payá reuniu 25.000 assinaturas para reformas democráticas, o regime respondeu com prisões em massa e os assassinatos de Payá e Harold Cepero.
Apesar dos desafios, tirar proveito das estruturas legais pode ser eficaz em contextos autoritários. A oposição venezuelana expôs a fraude eleitoral nas eleições de 28 de julho, demonstrando a vitória majoritária de Edmundo González por meio de registros eleitorais, reconhecidos pela UE e pelos EUA. Esse sucesso, alcançado sob forte repressão, demonstra o poder do ativismo organizado e da mobilização dos cidadãos.
Desde a repressão do regime cubano em julho de 2021, que deixou milhares de pessoas detidas, a solidariedade internacional com os prisioneiros cresceu. A resolução do Parlamento Europeu de 19 de setembro, exigindo a libertação de José Daniel Ferrer e de todos os presos políticos, foi aprovada com forte apoio, destacando o respaldo mundial. Os ativistas cubanos pró-democracia devem aproveitar esse impulso e pedir à UE que vincule seus acordos de cooperação às condições de direitos humanos. Os EUA, com suas políticas de máxima pressão, e o Canadá, por meio de plataformas como o Conselho de Direitos Humanos da ONU, estão bem posicionados para ajudar nesses esforços.
A América Latina, marcada por ditaduras, tem sido lenta em apoiar o movimento democrático de Cuba, mas isso está mudando à medida que as crises na Venezuela e na Nicarágua expõem o legado totalitário de Castro, adotado por autocratas em Caracas e Manágua. Em meio aos retrocessos democráticos e à retórica antiestadunidense, os pedidos de libertação dos presos políticos cubanos estão aumentando na sociedade civil, nos fóruns regionais e nos partidos políticos. As transições da região destacam os riscos de os autocratas explorarem as leis de anistia, oferecendo lições valiosas para a oposição cubana.
As duas últimas décadas em Cuba mostram que a pressão contínua é fundamental para a libertação de presos políticos. Entre 2010 e 2011, 75 prisioneiros da Primavera Negra, condenados a penas entre 6 e 28 anos de prisão, foram libertados em liberdade condicional e enviados para o exílio. Sua libertação foi resultado de pressão interna e condenação internacional, incluindo manifestações das Damas de Branco, que levaram a negociações com Raúl Castro e a Igreja Católica.
Uma lei de anistia em Cuba não é apenas um objetivo político ou legal: é uma obrigação moral para aqueles que encarnam a coragem e a resistência contra a repressão. A contínua recusa do regime em atender à vontade do povo e sua insistência obstinada em prender injustamente milhares de pessoas exigem uma resposta decisiva: a prisão política é bárbara e inaceitável. As nações democráticas devem estar do lado certo da história e condicionar as relações com Cuba à libertação imediata e incondicional de todos os presos políticos, não por meio de exílio ou prisão domiciliar, mas como cidadãos livres com o direito de permanecer e lutar pacificamente pela democracia.
Tradução automática revisada por Giulia Gaspar.
Autor
Pesquisador e diretor da Espacios Democráticos, ONG dedicada a promover a solidariedade no Canadá com os defensores dos direitos humanos e a sociedade civil em Cuba. Mestre em História da América Latina pela Universidade de Toronto