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As sombras da soberania na México

A soberania mexicana hoje não é exercida a partir do Palácio Nacional, mas disputada em um campo de sombras entre o Estado, o crime organizado e os Estados Unidos.

No México, a soberania é defendida em coletivas de imprensa, mas também é corroída pelo silêncio do poder.

Assim, enquanto a presidente Claudia Sheinbaum fala de “cooperação com os Estados Unidos no respeito à nossa soberania”, Ismael El Mayo Zambada — invisível para o Estado, ao contrário do que representa — deixa sua marca na Corte de Justiça do Brooklyn. O fato é que o chefe mais antigo do Cartel de Sinaloa até seu sequestro e extradição reapareceu com declarações que, mais do que confissões, são lembranças do poder estabelecido.

Sua única palavra — dada na penumbra, nunca sob os holofotes — pesa midiaticamente e simbolicamente como a de um presidente em exercício. Enquanto Sheinbaum insiste que a relação com Washington tem limites claros, El Mayo lança uma mensagem entre linhas: o que ele representa continua a marcar o rumo.

A paradoxo é brutal. A presidente fala de soberania frente aos Estados Unidos, mas, na prática, o governo mexicano anda com pés de chumbo. A DEA continua investigando, o Departamento do Tesouro congela contas e os promotores federais esperam a peça adequada para expor as cumplicidades. O México coopera, sim, mas apenas até onde o equilíbrio político interno permite.

O caso de Genaro García Luna, ex-secretário de Segurança Pública durante o governo de Felipe Calderón (2006-2012) e atualmente cumprindo pena nos Estados Unidos, deixou uma lição: Washington pode derrubar narrativas inteiras se decidir colocar um funcionário mexicano no banco dos réus.

Por isso, quando 55 chefões são entregues com processos que envolvem políticos ativos — principalmente do Morena —, a retórica do respeito mútuo se dilui. A linha vermelha é evidente: não tocar nos narcotraficantes políticos aliados do regime, pelo menos enquanto a Casa Branca não exigir.

Mas a soberania, essa palavra tão repetida, parece cada vez mais desgastada. Nos territórios do norte e do sul, nas cidades fronteiriças e nas comunidades do Pacífico, quem decide não é o governo federal, mas o crime organizado.

Em Washington, os arquivos sobre o México são usados como fichas de negociação migratória e comercial. Assim, o discurso oficial sobre soberania fica em um slogan que não consegue encobrir nem a ingerência nem o vácuo de poder.

As declarações de El Mayo e de Sheinbaum, vistas em paralelo, desenham uma verdade incômoda: no México, a soberania não está no Palácio Nacional, mas dividida entre três forças.

A primeira é o Estado mexicano, que fala com voz diplomática para as clientelas políticas; a segunda é o crime organizado, que fala da clandestinidade e age abertamente semeando o terror; e a terceira é os Estados Unidos, que não precisam falar muito porque acumulam informações e as utilizam como arma política para pressionar dia após dia, como tudo indica que aconteceu com a visita de Marco Rubio ao Palácio Nacional.

Nesse tabuleiro, Sheinbaum joga com margens estreitas de operação política. Ela pode repetir insistentemente que a cooperação com Washington tem limites, mas sabe que esses limites se movem ao ritmo das pressões da Casa Branca.

El Mayo Zambada, por outro lado, não precisa fazer precisões: com poucas palavras, deixa claro que esse poder paralelo continua lá, tão presente e tão ativo quanto as limitações do próprio Estado mexicano.

E assim, a soberania mexicana se tornou um campo de sombras: proclamada no discurso reiterativo do Palácio Nacional, disputada nos territórios controlados pelos cartéis que sabem onde reside sua força e condicionada pelas salas da Casa Branca, pelas agências de segurança, pela mídia e pelos tribunais dos Estados Unidos.

A presidente Sheinbaum não sai do roteiro de seus assessores e proclama, às vezes com veemência e outras com tribulação, a defesa da soberania nacional. Ela mantém o discurso de López Obrador de “respeito mútuo” e “não intervenção”, mas sabe que sua margem de manobra política é estreita.

Washington não precisa, até agora, impor a força militar; basta insinuar que há processos abertos contra políticos para que Sheinbaum ceda nas questões de interesse dos Estados Unidos e, diante disso, o governo ajusta sua narrativa para não desencadear tempestades.

El Mayo representa simbolicamente a outra sombra. Sabe-se que ele continua sendo um ator poderoso, e ele mesmo o diz ao declarar perante o Tribunal de Brooklyn que, para operar em sua longa carreira, deu dinheiro a “policiais, militares e políticos” até seu sequestro e extradição.

Lembremos apenas que ele tinha como guarda de segurança um agente do Ministério Público de Sinaloa. Essa sombra do crime não só cobre territórios inteiros, mas também esferas de poder onde estão à espreita os narcopolíticos, essas figuras híbridas que não respondem ao partido no poder, nem ao governo, mas ao financiamento e à proteção dos cartéis.

E assim, quando a presidente Sheinbaum fala de soberania, essa sombra se infiltra. Como declarou lapidariamente Rubén Rocha, governador de Sinaloa, em uma entrevista off the record com o jornalista Salvador García Soto: “Não sejamos idiotas. Aqui todo mundo sabe como estão as coisas. Eu fui e conversei com eles… Fui pedir o apoio deles”.

Finalmente, como dizíamos, os Estados Unidos não precisam de enviar forças militares para o território mexicano para marcar limites: os seus tribunais são suficientes. Esta sombra funciona como uma lembrança permanente: o governo mexicano pode falar de soberania, mas a justiça americana reserva-se o direito de expor o que no México se silencia para manter o equilíbrio.

As sombras sobrepõem-se e a soberania mexicana já não é uma luz clara, mas sim uma penumbra. O Estado se sustenta em um discurso desgastado, o crime no controle do território e os Estados Unidos nos processos judiciais. E ali, em meio às sombras que dialogam, colidem e pactuam, a cidadania está presa.

Em definitiva, por enquanto, o México não vive sob plena soberania, mas em campos de sombras onde todos se escondem, todos se protegem e todos, em silêncio, precisam uns dos outros.

Tradução automática revisada por Isabel Lima

Autor

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Professor da Universidade Autônoma de Sinaloa. Doutor em Ciência Política e Sociologia pela Universidade Complutense de Madri. Membro do Sistema Nacional de Pesquisadores do México.

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