A crise climática tem se evidenciado com eventos extremos em diversas regiões do planeta – secas prolongadas, tempestades e enchentes severas e ondas de calor recorde. Seus efeitos atingem diretamente a vida das pessoas, especialmente os mais pobres e vulneráveis, ampliando desigualdades e pressionando economias. Segundo Relatório do IPCC, publicado em 2023, as soluções técnicas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa já existem; contudo, para implementá-las, faltam ações e coordenação política, cooperação internacional e financiamento adequado. É nesse cenário que a COP30, em Belém, ganha centralidade histórica.
Ao longo das últimas décadas, o debate climático internacional consolidou o princípio das responsabilidades comuns porém diferenciadas, segundo o qual os países desenvolvidos devem assumir parcela maior dos esforços, por seu peso histórico nas emissões, mas com os países em desenvolvimento assumindo também suas atribuições. Enquanto as nações industrializadas enfrentam grandes desafios para descarbonizar os setores de indústria e energia, o Brasil e seus vizinhos amazônicos têm um perfil distinto, tendo em vista que suas principais fontes de emissões decorrem da mudança no uso da terra, especialmente do desmatamento e da degradação florestal.
Segundo a FAO, o Brasil, embora responsável por uma parte relativamente pequena das emissões globais, está entre os dez maiores emissores e abriga o maior estoque mundial de carbono em biomassa florestal viva. A existência da Amazônia, portanto, é decisiva para o cumprimento da meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5°/2°C em relação aos níveis pré-industriais.
A região amazônica, no entanto, enfrenta desafios profundos e foi historicamente marcada por conflitos fundiários, grandes disputas econômicas e desigualdades sociais. A Amazônia brasileira, por exemplo, desenvolveu grandes projetos nas áreas de energia, mineração e agropecuária, atraiu mão-de-obra, constituiu cidades populosas, porém com pouca infraestrutura e baixíssima qualidade de vida para a população. No contexto sul-americano, a região constituiu-se em um espaço de insuficientes políticas de desenvolvimento, com baixa coordenação política e econômica regional; inserção econômica internacional periférica, com poucos legados ao desenvolvimento local; baixo aproveitamento das riquezas locais; modelo econômico dominante pouco sustentável; altos níveis de pobreza, desigualdade, exclusão, e baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano); baixo nível de implementação legal e acesso à justiça; e alto índice de violência, com crescimento vertiginoso em período recente.
Apesar desse contexto, a COP30 representa um marco no tocante às oportunidades para o desenvolvimento sustentável da região.
Nos últimos anos, sob a liderança dos países amazônicos, evidenciou-se a defesa de um modelo regional de desenvolvimento sustentável e de um paradigma de floresta produtiva com inclusão social, que valoriza a biodiversidade e gera renda local. Em termos de financiamento, destacaram-se mecanismos de pagamento por serviços ambientais (PSA) e as iniciativas de financiamento de ações de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD+), desenvolvidas no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Estes instrumentos buscam promover a inclusão de povos tradicionais, ribeirinhos, comunidades indígenas e pequenos agricultores.
No Brasil, o Fundo Amazônia, um fundo baseado na cooperação norte-sul, não reembolsável e baseado em resultados, é um exemplo concreto de um processo de governança participativa e desenvolvimento inclusivo, ao apoiar organizações comunitárias e iniciativas de ciência, tecnologia e inovação, além de ações de monitoramento e controle e de ordenamento territorial, esforços que precisam ser continuados e ampliados (e que evidenciam a importância das doações e do financiamento público para o setor florestal).
Em agosto de 2025, na V Cúpula de Presidentes da OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônia), os países amazônicos, por meio da Declaração de Bogotá, destacaram eixos consensuais de ação como: reforçar uma economia orientada ao desenvolvimento sustentável na Amazônia, incluindo a bioeconomia, com destaque para os avanços alcançados na construção da Estratégia para uma Economia Sustentável na Região Amazônica; promover o Fórum de Cidades Amazônicas, a Rede Amazônica de Autoridades Florestais e o mecanismo de cooperação entre a OTCA e a Associação das Universidades Amazônicas (UNAMAZ); aprovar a construção de um espaço de diálogo entre governos e povos indígenas (Mecanismo Amazônico dos Povos Indígenas, MAPI); avançar na definição e estabelecimento do Mecanismo Financeiro da OTCA; apoiar o lançamento do Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF); entre outras importantes iniciativas.
Na área de financiamento, além do TFFF, outras iniciativas importantes lideradas pelo Brasil na COP30 buscam estabelecer mecanismos para harmonizar e escalar o financiamento climático, como o Mapa do Caminho de Baku a Belém para alcançar o valor de 1,3 trilhão de dólares anuais de financiamento climático; e as recomendações definidas no Círculo de Ministros de Finanças, com destaque para a ampliação dos fundos climáticos internacionais e do financiamento com taxas de juros reduzidas; a reforma dos bancos multilaterais de desenvolvimento e o aumento do crédito sustentável; o fortalecimento das capacidades e marcos nacionais de investimento verde; a criação de instrumentos financeiros inovadores para mobilizar capital privado; e a integração dos riscos climáticos à regulação financeira, promovendo a harmonização de taxonomias e o desenvolvimento de mercados de carbono integrados.
Essas são algumas das oportunidades abertas aos países amazônicos no marco da COP30, para que a região possa transformar seu potencial em avanço concreto no caminho do desenvolvimento sustentável, promovendo a sociobioeconomia com agregação de valor, o desenvolvimento de bioprodutos, o adensamento das cadeias produtivas sustentáveis, o fortalecimento das infraestruturas e as ações de educação e de ciência, tecnologia e inovação.
Nesse sentido, é necessário aprimorar a capacidade de ação dos Estados da região, em parceria com a sociedade civil; assim como é urgente fortalecer a atuação da principal instituição de cooperação regional, a OTCA, no sentido de promover uma coordenação mais ampla de ações entre os países amazônicos. Além disso, é fundamental a existência de mercados para os produtos sustentáveis da região; a promoção de políticas de redução de desigualdades sociais e estruturais; assim como a ampliação do financiamento e o aprimoramento dos mecanismos de cooperação internacional para o desenvolvimento.
A Amazônia pode ser protagonista de um novo modelo de bem-viver global, onde floresta em pé signifique produtividade e sustentabilidade, com qualidade de vida. As tarefas são imensas, de dimensões amazônicas, mas as oportunidades estão colocadas, e a hora é agora.










