Uma região, todas as vozes

L21

|

|

Leer en

As políticas do governo Boric em relação ao povo Mapuche são mais do mesmo

As políticas implementadas durante o governo de Boric em relação aos Mapuche representam mais uma continuidade com os governos anteriores do que uma tentativa real de pôr fim ao conflito.

Gabriel Boric, o jovem presidente oriundo do movimento estudantil da década passada, assumiu seu governo encarnando o ímpeto por mudança expressado durante o estallido social de 2019, impulsionado também pela rejeição à ultradireita pinochetista que havia vencido o primeiro turno das eleições presidenciais. No entanto, já no seu primeiro ano, o governo demonstrou que sua linha, no que diz respeito à questão mapuche, seria a continuidade da dominação do Estado chileno sobre os povos indígenas. De fato, seu mandato tem sido marcado pelas lutas desses povos para abrir espaços de participação política, integrar processos políticos e institucionais, apresentar propostas concretas, enfrentar ataques racistas, a militarização dos territórios e a eterna decepção pela falta de resultados.

Para compreender as políticas implementadas pelo Estado durante o governo de Gabriel Boric, é necessário aprofundar-se em três pontos fundamentais: a derrota da Convenção Constitucional e suas consequências; o Plano Buen Vivir e a manutenção do estado de exceção; e, por fim, a criação da Comissão para a Paz e o Entendimento.

Em primeiro lugar, a derrota estrondosa nas urnas da proposta constitucional elaborada entre 2021 e 2022 pela Convenção Constitucional deixou marcas profundas. O processo havia começado com a esperança de inclusão, com a inédita presença de cadeiras reservadas para indígenas (7 Mapuche), sendo sua primeira presidente Elisa Loncon, uma dirigente Mapuche, e o rascunho da nova constituição incluía muitas das reivindicações históricas dos povos indígenas. No entanto, essa esperança se transformou em frustração após a derrota esmagadora no plebiscito de setembro de 2022, sendo apontadas especialmente as propostas indígenas — em particular a plurinacionalidade — como grandes responsáveis pelo fracasso.

A direita interpretou isso como uma rejeição dos chilenos às demandas mapuche, o que teve consequências claras quanto à presença e influência do movimento indígena, tanto nas ruas quanto no processo constitucional seguinte de 2023, no qual houve apenas um representante indígena — que acabou renunciando. Esse segundo processo coincidiu com o crescimento do apoio à direita e à extrema direita nas pesquisas, com a demonização das demandas mapuche e a normalização do discurso racista e xenofóbico, especialmente nas redes sociais, tendo como principal vítima a ex-presidenta da Convenção, Elisa Loncon.

Esse contexto abalou a esquerda e os movimentos e organizações sociais chilenas, mas principalmente o governo, que perdeu o controle da agenda. Boric havia chegado ao poder apoiando medidas de reparação territorial e direitos coletivos dos mapuche, além de criticar o uso do estado de exceção na região por parte do governo de Sebastián Piñera.

Embora o novo governo não tenha renovado o estado de exceção inicialmente, poucos meses após assumir, Boric voltou a implementá-lo, alegando o aumento dos ataques incendiários. Na prática, trata-se da militarização da região, com presença de Carabineros, militares, Marinha e patrulhamento aéreo para controlar o território. Os atos de violência diminuíram, mas a região permanece há mais de três anos (praticamente todo o mandato de Boric) sob controle militar. Assim, o governo recorre ao mesmo expediente utilizado desde a invasão desses territórios: repressão e coerção. O estado de exceção já foi renovado mais de 50 vezes.

A partir de 2022, o governo de Boric implementou o chamado “Plano Buen Vivir”, em referência ao conceito da cosmovisão indígena, mas que nesse caso se refere a um plano de políticas públicas em meio ao estado de emergência. O plano inclui construção de estradas, acesso à água potável, investimento em infraestrutura para comunidades e diálogo territorial.

A nove meses do fim do governo Boric, foi apresentado o relatório da Comissão para a Paz e o Entendimento, criada em 2023 visando encontrar soluções de médio e longo prazo para o conflito na Araucanía. A instância foi composta por oito membros, incluindo representantes mapuche com longa trajetória no movimento e políticos como Francisco Huenchumilla (senador) e Adolfo Millabur (ex-convencional).

Entre as 21 recomendações do relatório estão promessas já recorrentes, como o reconhecimento constitucional, a revitalização da língua ou a representação política, além de outras mais inovadoras, como a reparação a todas as vítimas da violência. Essas medidas foram apoiadas por sete dos oito membros da Comissão, sendo curioso o apoio de uma integrante do Partido Republicano (de extrema direita), que alegou ter sofrido pressão de seu partido para rejeitar o relatório. Como consequência, ela teve que renunciar à legenda.

As recomendações foram recebidas com moderação e cautela, pois colocam em pauta demandas históricas, como enfrentar a apropriação das terras pelo Estado — origem do conflito. Nas últimas décadas, muitas iniciativas geraram a ilusão de pôr fim ao conflito, mas acabaram engavetadas. Além disso, muitas dessas recomendações ainda precisam seguir o trâmite legislativo, o que depende do calendário eleitoral.

A nove meses do fim do mandato, parece ilusório pensar que essas iniciativas possam se concretizar, especialmente considerando que é muito provável que a direita pinochetista vença as próximas eleições. Nesse contexto, até mesmo o nome da Comissão — “para a Paz e o Entendimento” — soa irônico em um território militarizado.

Portanto, podemos dizer que as políticas implementadas durante o governo de Boric em relação aos Mapuche representam mais uma continuidade com os governos anteriores do que uma tentativa real de pôr fim ao conflito.

*Tradução automática revisada por Janaína da Silva

Autor

Otros artículos del autor

Cientista político. Professor externo da Universidade de Girona (Espanha). Doutor em Processos Políticos Contemporâneos pela Univ. de Salamanca. Especializado em movimentos sociais e povos e movimentos indígenas da América Latina.

spot_img

Postagens relacionadas

Você quer colaborar com L21?

Acreditamos no livre fluxo de informações

Republicar nossos artigos gratuitamente, impressos ou digitalmente, sob a licença Creative Commons.

Marcado em:

COMPARTILHE
ESTE ARTIGO

Mais artigos relacionados