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A IV Cúpula UE-CELAC: aliança pragmática ou acordo de valores?

A próxima Cúpula UE-CELAC testará se ambas as regiões podem transformar um pragmatismo interessado em uma aliança que realmente responda às prioridades compartilhadas.

A próxima Cúpula UE-CELAC, que será realizada em Santa Marta, Colômbia, em novembro, chega em um momento de crescentes tendências iliberais, tensões geopolíticas e protecionismo econômico. Nesse cenário, a relação birregional oferece uma “janela de oportunidade” para preservar uma ordem multilateral e promover uma cooperação mais horizontal. No entanto, persiste uma discrepância entre o discurso e a prática. Iniciativas como a Global Gateway, pensadas para colmatar o fosso de investimento na América Latina tendo em conta a descarbonização, refletem na realidade as prioridades europeias, segundo um relatório da Oxfam. Por isso, em Santa Marta, os líderes de ambas as regiões deverão demonstrar que é possível ir além do pragmatismo.

A Cúpula de Bruxelas e a renovação da relação birregional

A Cúpula de Bruxelas representou o reencontro entre a América Latina e a Europa. Seu objetivo era renovar a associação estratégica após 8 anos sem encontros de alto nível. Os mandatários deixaram em segundo plano o discurso sobre valores compartilhados para apostar em um enfoque pragmático centrado em interesses comuns, como a transição energética e a digitalização. No entanto, a Cúpula também revelou os limites da parceria UE-CELAC.

Por um lado, em Bruxelas conseguiu-se restabelecer os canais institucionais que permitiram reativar o diálogo político. Para isso, a UE se apresentou como um parceiro mais confiável e atento às necessidades latino-americanas. O lançamento da iniciativa Global Gateway, com a qual a Europa prometeu investir 45 bilhões de euros em infraestruturas na América Latina até 2027, é um exemplo disso. O projeto visa responder à falta de investimentos no Sul Global e promover o desenvolvimento sustentável.

Por outro lado, surgiram fragilidades que comprometem o avanço da relação estratégica. A fragmentação política na América Latina dificulta construir uma voz comum. A CELAC, principal interlocutora da UE, é um órgão intergovernamental com limitada autonomia institucional, dependente da vontade de seus Estados-membros. Quando esta última falta, a organização entra em uma fase de paralisia, como ocorreu entre 2017 e 2021 devido às divisões sobre a crise venezuelana.

A falta de coesão ficou evidente sobretudo diante da situação na Ucrânia. Diante das diferenças entre os governos latino-americanos, a Declaração final incluiu só uma “condenação tímida”, em linha com a prioridade europeia de manter o diálogo com o maior número possível de governos. Diante dessa situação, a UE optou por uma estratégia flexível em relação à América Latina, que combina relações inter-regionais, como o caso do acordo com o Mercosul, e bilaterais, como a modernização do Acordo com o México e o Chile.

A caminho da Cúpula de 2025

Ao longo dos dois anos que separam as duas Cúpulas, várias iniciativas foram lançadas para concretizar os compromissos assumidos. Entre elas, destacam-se importantes acordos comerciais e o lançamento do Global Gateway. No entanto, os primeiros passos revelam que persiste uma discrepância entre a retórica e os fatos.

Em dezembro passado, após 25 anos de negociações, foi assinado o acordo UE-Mercosul. Embora se trate de um acordo principalmente comercial, seu alcance também é geopolítico: visa evitar uma posição de subordinação diante da crescente assertividade dos Estados Unidos, China e Rússia, e promover uma cooperação mais equitativa. Com esse objetivo, além de liberalizar o comércio em vários setores-chave, garante-se o acesso a matérias-primas estratégicas, mas com a possibilidade de “restringir a exportação de minerais críticos para a transição energética com o objetivo de aumentar a criação de valor local”.

Semanas depois, também foram concluídas as negociações para modernizar o acordo com o México. O novo texto prevê uma redução das tarifas em áreas como o setor agrícola, de serviços e telecomunicações, e introduz disposições para a luta contra a corrupção e a promoção do desenvolvimento sustentável. Em fevereiro, entrou em vigor o novo acordo com o Chile, que inclui uma ampliação do diálogo político, reduções tarifárias e uma maior inclusão do país andino na cadeia de fornecimento de matérias-primas com maior valor agregado.

O Global Gateway, por sua vez, recebeu críticas. Os dados sobre sua implementação revelam uma concentração de projetos nas áreas verde e digital, com preferência pelo Brasil. Só 16% deles se concentram na saúde ou na educação, setores-chave para o desenvolvimento. Além disso, como aponta o pesquisador Theodoro Luciano, não se trata de fundos adicionais, mas sim de uma reorganização de fundos anteriores. Outros analistas destacam a falta de transparência, a dificuldade de acesso às informações, especialmente para pequenas e médias empresas, e a escassa participação de atores latino-americanos. Um relatório recente da Counter Balance, Eurodad e Oxfam, após analisar mais de 40 projetos, afirma que a iniciativa “promove os interesses econômicos e geopolíticos da Europa”.

A Cúpula de Santa Marta e os desafios futuros

Dois anos após a última Cúpula, o contexto geopolítico é ainda mais complexo, reforçando a necessidade de uma parceria entre a América Latina e a Europa.

O retorno de Donald Trump representa um fator crucial devido às mudanças nas prioridades da Casa Branca. Na recente Conferência de Segurança de Munique, o vice-presidente dos EUA, J.D. Vance, deixou claro que a Europa não é mais uma prioridade para os Estados Unidos. A ruptura da relação transatlântica leva a UE a repensar suas alianças externas. A América Latina emerge como um parceiro preferencial devido aos interesses compartilhados.

A Europa também enfrenta um problema de legitimidade. Sua posição sobre a situação em Gaza foi percebida pelos Estados latino-americanos como hipócrita, dada a sua forte condenação da Rússia. Esse duplo padrão reforça a imagem de uma UE que age em seu próprio interesse.

Para a América Latina, embora a região tampouco figura no centro da agenda, o reaparecimento de Trump acentua ainda mais a fragmentação política, criando maior atrito entre governos que simpatizam com seu modelo de governança e outros que o condenam. Os recentes ciclos eleitorais aprofundam essas divisões e dificultam a coordenação regional.

Por essas razões, em Santa Marta, os líderes de ambas as regiões precisarão enfatizar interesses comuns, como a transição energética. Alguns analistas falam em “interregionalismo verde”, que busca incluir compromissos com o desenvolvimento sustentável em acordos inter-regionais. A presidência colombiana da CELAC poderia facilitar esse caminho, embora seja importante lembrar que o presidente Gustavo Petro enfrenta atualmente uma crise interna. Ademais, será essencial ampliar o escopo do diálogo, incluindo temas relevantes para a América Latina, como migração e criminalidade.

Conclusão

Diante desse panorama, a próxima Cúpula apresenta a ocasião para reforçar o vínculo birregional. A histórica aliança de valores poder servir de base para construir uma nova agenda de cooperação que reflete as mudanças no sistema internacional. Por essa razão, é necessário enfatizar os interesses comuns para melhorar a inserção internacional de ambas as regiões. A Europa deve demonstrar que iniciativas como o Global Gateway não respondem só aos seus próprios interesses, mas que se trata de uma aposta real para o desenvolvimento latino-americano. Do outro lado do Atlântico, será necessário avançar em mecanismos de integração e coordenação regional, para aproveitar ao máximo o vínculo com a Europa. Só assim será possível alcançar uma relação que transcenda o mero pragmatismo.

Tradução automática revisada por Isabel Lima

Autor

jeronimogiorgi@hotmail.com |  Otros artículos del autor

Jornalista, mestre em Jornalismo pela Universidade de Barcelona e em Estudos Latino-Americanos pela Universidade Complutense de Madrid.

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