Co-autor Francisco E. Castañeda
Após a última reunião da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática que aconteceu em Glasgow, Escócia, no final de outubro do ano passado, um dos pontos que mais gerou esperança entre os países em desenvolvimento foi o compromisso de cumprir o Acordo de Paris de 2015: fornecer subsídios para a mudança climática. O financiamento externo é um aspecto chave para garantir a transição energética nos países em desenvolvimento. Por isso, os líderes do mundo desenvolvido se comprometeram em Glasgow a destravar os fundos outrora prometidos.
Mas o entusiasmo não parou por aí, ele se estendeu ao setor privado, de onde se prevê que venham os maiores aportes para a transição. Mark Carney, pioneiro em reconhecer o problema climático ao presidir o Banco da Inglaterra; co-fundador, com Michael Bloomberg, da Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD), e que atualmente lidera um consórcio de 450 empresas financeiras (Glasgow Financial Alliance for Net Zero), destacou o alinhamento do setor financeiro para cumprir com os objetivos climáticos. Mas, sobretudo, no relativo à busca do objetivo de emissões líquidas zero até 2050.
Em resumo, uns e outros prometiam financiamento de fundos a longo prazo para alcançar o bem comum. Entretanto, a aposta dos mercados financeiros para a mudança climática pode durar menos que o esperado. Recentemente, Larry Fink, CEO da BlackRock e um dos homens mais poderosos do mundo financeiro, declarou que a guerra na Ucrânia estaria marcando o fim da globalização. A irrupção da pandemia de COVID-19 desencadeou o debate sobre reshoring, a tendência à deslocalização das cadeias globais de valor, algo que já tem estimulado o crescente poder tecnológico da China.
A invasão da Ucrânia gerou transtornos entre os líderes ocidentais, e de um golpe, desapareceu a cândida visão que muitos tinham sobre o regime de Vladimir Putin. Diante da imprevisível resposta militar, muitos decidiram impor sanções econômicas à Rússia. Entretanto, além dos efeitos sobre o futuro do conflito, as medidas adotadas podem marcar o fim da globalização financeira e comercial.
Entretanto, as consequências financeiras podem ser maiores, e sem dúvida serão. Paradoxalmente, o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos pode ser muito afetado se a China decidir não continuar comprando em massa os títulos da Reserva Federal. Pequim também pode pensar em acelerar o processo de internacionalização do yuan, obrigando os seus sócios a abandonar o dólar em suas transações, tal como exige agora a Rússia sancionada aos seus compradores de hidrocarbonetos.
A invasão russa forçou a União Europeia a repensar sua estratégia energética, marcando inequivocamente uma aceleração na transição verde. Para cobrir estes custos, são necessárias fontes imensas de novos financiamentos, mas isto traz iniciativas diferentes neste campo no que concerne à nossa região. Para a maioria dos países latino-americanos, o fim da atual estrutura de globalização financeira e comercial (tal como conhecemos até agora) acabará retardando o processo de transição. Além disso, o aumento da inflação a nível internacional aumenta o custo do financiamento e desestimulará o financiamento a longo prazo.
A guerra pode não apenas implicar uma inversão da atual globalização financeira e comercial, mas também afetará as estruturas multilaterais que têm distribuído poder desde o fim da Guerra Fria. Um menor acesso ao financiamento externo afetará a transição energética, enquanto o aumento nos preços outorga maiores incentivos à exploração do petróleo.
Entretanto, isto não só implica em uma menor disponibilidade de fundos para a transição, como também deixará em evidência um reencaminhamento para fundos que buscam rentabilidade a curto prazo. Em vez de avançar com a transição, um barril acima de 100 dólares empurrará para novas rodadas de licitação de petróleo. Por outro lado, o incremento nas contas de consumo energético por parte das famílias obrigará os países da região a aumentar os subsídios de energia, mas reagindo com maiores níveis de dívida pública e fragilizando as já deterioradas finanças públicas após a pandemia.
Como outras regiões em desenvolvimento, a “esperança verde” da América Latina associava-se à chegada de fluxos de capital, e vários líderes voltaram de Glasgow convencidos do poder do mercado para acelerar a transição. No entanto, este otimismo se diluiu diante de novas restrições globais que preveem uma economia mundial mais lenta e com maiores custos para os Governos. Haverá, portanto, menos excedente para investir nesta transição energética inevitável.
Francisco E. Castañeda é economista (Universidade do Chile), com PhD na Universidade de Loughborough (Reino Unido) e MSc na Universidade de Birmingham (Reino Unido). Seus interesses de pesquisa estão na área de macrofinanciamento e política industrial. Ele também é membro do Comitê Científico de Economia Pública da Universidade CIRIEC-Liege.
Autor
Pesquisador Associado do Centro de Estudos do Estado e da Sociedade -CEDES (Buenos Aires). Autor de "Latin America Global Insertion, Energy Transition, and Sustainable Development", Cambridge University Press, 2020.