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A direita venceu

A eleição municipal realizada no último domingo consolidou o avanço dos partidos de direita no Brasil. Esse avanço se deu principalmente sobre os partidos de centro, mas também retirou votos de partidos de esquerda.

Não é trivial a classificação dos partidos políticos em termos ideológicos, sempre há certa controvérsia, contudo, é possível apontar que, dentre os principais partidos políticos brasileiros, PCdoB, PSOL, PT, PSB e PDT estão posicionados do centro para a esquerda, PSDB e PMDB são os partidos de centro, enquanto que PSD, PTB, DEM, Republicanos, Progressistas, PSC e PSL são partidos do centro para a direita.

O que aconteceu nas eleições locais de novembro de  2020 foi uma perda de mais de 11 milhões de votos dos partidos de centro”

Dessa perspectiva, o que aconteceu nas eleições locais de novembro de  2020 foi uma perda de mais de 11 milhões de votos dos partidos de centro: o PMDB perdeu mais de 4 milhões e o PSDB quase 7 milhões. A esquerda perdeu menos, cerca de 4,5 milhões de votos, concentrados principalmente no PSB que perdeu mais de 3 milhões. PT e PSOL ganharam um punhado de votos a mais em comparação com 2016, mas o PT voltou a perder prefeituras.

Se o centro e a esquerda amargam esse grande recuo, os partidos de direita podem comemorar à larga porque conquistaram um avanço muito expressivo. Os sete principais partidos de direita passaram de 28,5 milhões de votos em 2016 para mais de 39 milhões agora, um avanço de mais de 10,5 milhões de votos. Essa quantidade se expressa no número de prefeituras conquistadas e de população governada. A direita se consolida como o polo ideológico que governará a maior parcela dos brasileiros a partir de 2021.

Diante desse cenário, duas questões se impõem. Uma é saber qual impacto os resultados das eleições de 2020 poderão ter nas eleições de 2022. Outra é saber que influência os resultados podem ter no governo de Jair Bolsonaro. Vamos tentar responder.

Em 2012, o Partido dos Trabalhadores (PT) expandiu de forma muito acentuada seu eleitorado, conquistou cidades importantes, entre elas, São Paulo, e se tornou o partido a governar o maior contingente populacional no Brasil. O sucesso de 2012 não foi suficiente para garantir tranquilidade ao partido nos anos seguintes, pelo contrário, a partir de 2013 o país foi sacudido por maciças manifestações populares que tinham o partido em mira. A presidenta Dilma Rousseff foi reeleita com pequena margem em 2014 e não conseguiu sustentar seu governo e foi impedida de governar até sofrer o impeachment em 2016.

Nesse cenário de crise do PT, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), principal partido opositor, foi o grande ganhador das eleições municipais de 2016. Recuperou a cidade de São Paulo e conquistou outras municipalidades importantes. Porém, fracassou em 2018. Teve um desempenho pífio e inesperado diante do histórico eleitoral do partido em eleições presidenciais e do sucesso da eleição municipal anterior. Ou seja, o sucesso na eleição municipal não é garantia de sucesso na eleição presidencial seguinte. As duas eleições são muito diferentes e o resultado de uma permite antecipar muito pouco, quase nada, sobre os resultados da outra. Com isso é possível dizer que a vitória da direita agora não significa certeza de que a direita irá ganhar em 2022.

Muitos analistas políticos, acadêmicos e jornalistas, se apressaram em dizer que o presidente é o grande derrotado nas eleições”

Com relação ao governo Bolsonaro, muitos analistas políticos, acadêmicos e jornalistas, se apressaram em dizer que o presidente é o grande derrotado nas eleições. Nada mais falso. De começo, é mais difícil estimar o desempenho eleitoral do presidente atual. Em 1996, dois anos após a vitória de Fernando Henrique Cardoso, o PSDB avançou muito, em 2004, depois de Lula, o PT também avançou bastante, o mesmo acontecendo em 2012, depois de Dilma. Esses ex-presidentes tinham partidos. Ficava claro apontar como o governo se saiu nas eleições municipais. Bolsonaro não tem partido, saiu do PSL, não criou o partido Aliança pelo Brasil e seus apoiadores estão espalhados em diversas legendas. Não é possível utilizar o indicador de prefeituras e votos conquistados para aferir seu sucesso ou fracasso.

O presidente pode ter apostado em maus candidatos ou pode até ter prejudicado alguns deles com o seu apoio. É verdade que a maior parte dos políticos locais que receberam apoio dele naufragaram, como Russomano, Sartori, Delegada Patrícia e Wal do açaí, por exemplo. Mesmo os que triunfaram, como Crivella, Capitão Wagner e Carlos Bolsonaro, ficaram muito aquém do que se poderia esperar dado o explícito apoio presidencial. No entanto, os partidos de direita, que venceram a eleição municipal, e os partidos de centro, que encolheram, mas continuam grandes, são todos eles fiéis apoiadores das políticas do governo federal no Congresso Nacional. Desse modo podemos dizer que o bolsonarismo não foi derrotado, mas que os resultados do pleito eleitoral de 2020 foram muito satisfatórios para o governo Bolsonaro.

É certo que alguns desses partidos de centro e de direita buscam uma alternativa política ao bolsonarismo. O presidente é visto como um elefante em uma loja de cristal, causa certa repulsa mesmo entre políticos conservadores que prefeririam alguém com as mesmas posições políticas, mas mais refinado ou dissimulado.

Os partidos de centro e de direita, equivocadamente chamados de centrão, buscam um nome capaz de superar o bolsonarismo. Esse nome poderia ser o de João Dória, Luciano Huck, Sérgio Moro ou Luiz Henrique Mandetta, políticos da direita brasileira com as mesmas propostas, mas mais civilizados. Caso esse nome surja e consiga arrebanhar uma parcela do eleitorado capaz de levá-lo ao segundo turno, Bolsonaro fica com seu segundo mandato seriamente ameaçado. Caso esse candidato da direita não bolsonarista fracasse e o oponente do presidente seja alguém de algum partido de esquerda, esses partidos de centro e de direita voltarão a alegremente abraçar o bolsonarismo, não tenham dúvidas quanto a isso.

Foto del Palacio del Planalto en Foter.com / CC BY-NC-SA

Autor

Cientista político. Mestre e Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP). Professor e Diretor da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

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