A democracia, concebida como um fim em si mesma, tem enfrentado desafios crescentes para manter sua legitimidade e o apoio público em todo o mundo. À medida que as expectativas dos cidadãos aumentam e as demandas por resultados concretos em áreas como segurança, economia, educação e saúde se tornam mais urgentes, o apoio à democracia diminui na ausência de resultados tangíveis. No entanto, em vez de agir, as opiniões são frequentemente subestimadas ou ridicularizadas como meras percepções, muito distantes da realidade. Na medida em que um coletivo social ou um setor da população acredita firmemente em algo, com base em sua própria experiência ou na de outros, a percepção será a realidade.
Na América Latina, observam-se mudanças nas percepções; as cifras são reveladoras. No Peru, enquanto 45% da população está de acordo que a democracia é o melhor sistema para governar (apesar de suas falhas), 31% discordam. Essas estatísticas colocam o Peru em primeiro lugar na região e em segundo lugar no ranking de países com menos confiança na democracia, de acordo com uma pesquisa recente da GIA em 43 nações. Por outro lado, mesmo acima da média mundial (59%), o México é o país latino-americano com o maior grau de respaldo à democracia, apesar de seus problemas (67%).
Isso ocorre em um contexto em que muitas pessoas não compreendem totalmente o significado de democracia e confundem conceitos políticos organizadores, como direita ou esquerda. A maioria da população tem uma visão pragmática e busca resultados concretos que atendam às suas necessidades imediatas. Em um contexto em que as preocupações cotidianas, como emprego, segurança e acesso a serviços básicos, estão no centro da vida das pessoas, a política e a democracia são frequentemente percebidas como abstrações distantes. Portanto, é fundamental que os líderes políticos e as instituições democráticas estabeleçam vínculos claros entre as políticas propostas e as melhorias tangíveis na qualidade de vida dos cidadãos, a fim de recuperar a confiança e o apoio ao sistema democrático.
Duas das condições básicas para uma democracia saudável estão em risco. A primeira é a percepção de que o governo é de fato dirigido pela vontade do povo. É essa percepção que daria ao governo legitimidade de resultado ou de exercício. Novamente, o México (51%) lidera os resultados da região, com relativa distância sobre os argentinos (38%), que seriam mais críticos em relação ao fato de o governo ser governado com base na vontade popular. A segunda condição está relacionada às eleições e sua percepção de transparência, adequação e justiça; em suma, o requisito de legitimidade de origem. No Peru, apenas 24% consideram que as eleições são justas e livres, enquanto 43% discordam dessa afirmação. Esses resultados diferem de outros países da região, onde as opiniões estão divididas. A Argentina tem os melhores resultados: 57% dos entrevistados têm confiança nos processos eleitorais de seu país.
A realidade é que a democracia precisa convencer. Não é mais suficiente afirmar sua superioridade como sistema de governo; ela deve demonstrar sua capacidade de atender às necessidades materiais e às aspirações da sociedade. Os cidadãos buscam não apenas liberdades políticas, mas também um Estado que funcione de forma eficaz para resolver os problemas cotidianos e proporcionar uma estrutura clara de regras e regulamentos que garantam igualdade e justiça para todos.
Nesse processo, é preciso entender que as ações e mensagens não são transversais a toda a população. Por exemplo, as mulheres são mais críticas em relação à democracia do que os homens. E, embora o comportamento por faixa etária seja bastante semelhante, encontramos diferenças importantes por nível de renda. As pessoas com renda mais baixa (quintil mais baixo) demonstram menos apoio à democracia (51%), marcando uma posição distinta em relação às pessoas com renda mais alta (quintil mais alto), em que 70% concordam com a afirmação de que a democracia é o melhor sistema de governo, apesar de suas deficiências. A mesma tendência é observada quando as pesquisas medem a opinião dos cidadãos sobre as eleições e a vontade do povo. As opiniões positivas ou negativas dependem do nível de escolaridade. Essa constatação ressalta a necessidade de uma abordagem inclusiva que leve em conta as diversas realidades e perspectivas da população. A democracia não pode ser eficaz se deixar para trás determinados grupos ou comunidades marginalizadas.
Nesse sentido, é fundamental repensar a relação entre a democracia e as necessidades materiais da população como um todo, mas também a partir dos diferentes coletivos sociais. A democracia não pode se limitar a ser um ideal abstrato; ela deve ser traduzida em resultados tangíveis que melhorem a vida das pessoas. Isso implica um compromisso contínuo com a transparência, a luta contra a corrupção e a participação dos cidadãos na tomada de decisões. As instituições democráticas devem estar a serviço do povo e serem percebidas como tais.
Entretanto, atingir esse objetivo não é uma tarefa fácil. E, apesar das diferenças entre os países da região, há um denominador comum. A complexidade dos desafios atuais, como a corrupção, a desigualdade econômica e a insegurança, requer um enfoque integral que aborde aspectos políticos, sociais e econômicos, mas que atinja a base da pirâmide de forma concreta. O resultado final vai além do discurso político e das posições ideológicas.
Em um clima em que as frustrações com o sistema democrático estão se tornando cada vez mais palpáveis, opções radicais estão surgindo como alternativas a um sistema que alguns consideram fracassado. A tolerância também está diminuindo e o pragmatismo aumentando. Por isso, é fundamental lembrar que a solução não está em abandonar a democracia, mas em fortalecê-la e renová-la constantemente para atender com determinação às necessidades e às aspirações em constante mudança da sociedade. Abrir espaços para participação, conversação e escuta pode ser o primeiro passo para superar os desafios e avançar em direção a uma democracia mais sólida e representativa na região. Essa é uma tarefa não apenas dos partidos políticos e dos governos, mas também de todos os grupos sociais.
Autor
Diretora Executiva da Datum, consultora de opinião pública do Peru, e professora da Universidade do Pacífico. Atualmente é vice-presidente de WAPOR América Latina (www.waporlatinoamerica.org)