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Petro, vitórias prematuras e nuvens escuras no horizonte

O novo governo da Colômbia, do presidente Gustavo Petro, de tendência centro-esquerda, tenta desenvolver uma agenda muito ampla, mas enfrenta múltiplos problemas. Em suas primeiras semanas, conseguiu construir uma coalizão ampla no Congresso, consolidando uma maioria que neste momento lhe garante a aprovação dos projetos de lei apresentados. Entretanto, não se sabe quão sólida é esta coalizão e quão capaz ela é de sobreviver ao debate sobre propostas difíceis.

A primeira prova de fogo que enfrenta é a reforma tributária que visa arrecadar aproximadamente 4,5 trilhões de dólares e para isso, foram estabelecidos quatro objetivos. Em primeiro lugar, procura eliminar ou reduzir uma longa lista de privilégios tributários que tornam a taxa efetiva de tributação muito menor do que a nominal. Por outro lado, procura aumentar a progressividade dos impostos de maneira significativa, incluindo impostos sobre lucros ocasionais e dividendos corporativos (pelos quais foi acusado de introduzir dupla tributação) e tornando os royalties das operações de mineração (especialmente o petróleo) não dedutíveis dos lucros para fins de liquidação do imposto corporativo.

Além disso, procura-se estabelecer sobretaxas fiscais temporárias ao setor financeiro e aos altos preços internacionais dos produtos minerais (petróleo e carvão). E por último, fortalecer o DIAN (departamento de impostos) para reduzir a evasão de impostos.

A coalizão governamental conseguiu facilmente sua aprovação no primeiro debate, mas possivelmente para conseguir a aprovação definitiva em novembro, terá que negociar alguns pontos com vários grupos políticos e com empresários que foram muito críticos da reforma. Possivelmente o governo conseguirá levar a reforma adiante, mas as relações com o setor produtivo e financeiro certamente serão afetadas. Se o novo estatuto tributário for aprovado sem ter que fazer demasiadas concessões, será uma grande mudança em relação ao que tradicionalmente se havia alcançado na Colômbia. 

Um segundo propósito prioritário do governo de Petro é a implementação do acordo de paz. Este projeto, que recebeu uma prioridade muito baixa por parte do governo anterior, é outro assunto de difícil manejo. Requer fundamentalmente uma reforma agrária integral que provavelmente será custosa (por esta e outras razões, a reforma tributária é tão necessária). Houve várias tentativas fracassadas de implementar tais reformas na Colômbia (o que, segundo alguns, contribuiu para criar um clima propício ao desenvolvimento de movimentos guerrilheiros). 

Tradicionalmente, a indústria pecuária tem sido radicalmente oposta a este tipo de reformas. Entretanto, na semana passada, a FEDEGAN (Federación Nacional de Ganaderos) assinou um acordo com o Presidente Petro e a Ministra da Agricultura, Cecilia López Montaño, comprometendo-se a vender três milhões de hectares de terras produtivas ao governo para que este implemente os programas de reforma agrária integral. O plano de governo inclui o fornecimento de terras às populações indígenas e afrodescendentes e aos camponeses pobres, dentro de uma marco que inclui assistência técnica, creditícia e de fornecimento de bens públicos.

Apesar destes (e outros) significativos êxitos iniciais do governo, também há nuvens escuras no horizonte. Falta claridade sobre o conteúdo de outra série de reformas propostas. Por exemplo, uma das promessas era a reforma do sistema de saúde, mas ainda não se conhece um projeto de lei de reforma. A ministra, Carolina Corcho, falou de reformar as EPS (Entidades Prestadoras de Saúde), entidades, em sua maioria privadas, que constituem o elemento básico do sistema, recebendo os recursos do governo para fornecer os serviços de saúde à população. Uma série de suposições foi tecida em torno desta reforma, que o governo ainda não esclareceu e que geraram temor em certos setores. É importante mencionar que, embora o sistema de saúde tenha muitos problemas, em comparação com outros serviços de países da região, sempre foi classificado como um dos melhores.

Incerteza similar existe com relação a uma prometida reforma trabalhista cujos elementos básicos também não foram esclarecidos. O mesmo se aplica à reforma previdenciária que o presidente (e outros candidatos) mencionaram durante a campanha. Segundo o presidente, o objetivo é garantir a todo colombiano maior de 65 anos uma pensão mínima de meio salário mínimo (pouco mais de US $110 por mês à taxa de câmbio atual). Isto claramente criou muitas expectativas que, se não forem cumpridas, podem se tornar uma grande responsabilidade política para o governo durante seus últimos anos.

Em termos de política energética, as declarações do presidente e de alguns ministros foram contraditórias. O objetivo é “descarbonizar a economia“, mudando para energia limpa, mas não está claro como isso deve ser feito. Tem-se falado em acabar ou limitar a exploração de petróleo e gás, mas existe o perigo de, a longo prazo, o país acabar importando esses recursos ao não conseguir desenvolver com suficiente rapidez fontes limpas de energia. Além disso, as exportações de petróleo, de longe a principal fonte de divisas, teriam que ser sacrificadas. O Ministro da Fazenda José Antonio Ocampo negou que haja planos para limitar a exploração de petróleo.

Finalmente, o contexto econômico nacional e mundial limitam de maneira importante a capacidade de manobra do governo. Os altos níveis de inflação (que na Colômbia está em níveis acima de 11% ao ano) forçaram o banco central a aumentar as taxas de juros, o que certamente terá impactos sobre o crescimento econômico.

Finalmente, o contexto econômico nacional e mundial limitam de maneira importante a capacidade de manobra do governo. Os altos níveis de inflação (que na Colômbia está acima de 11% ao ano) forçaram o banco central a aumentar as taxas de juros, o que certamente terá impactos sobre o crescimento econômico.

Embora as taxas de crescimento do PIB tenham sido relativamente altas em 2022, prevê-se uma queda significativa no crescimento para o próximo ano e alguns estão falando sobre a possibilidade de uma recessão.

Dentro deste preocupante marco econômico, surgem muitas dúvidas sobre a capacidade do novo governo terá de implementar as dispendiosas reformas que propôs. A reforma tributária é um ponto importante a favor, mas não é suficiente

*Tradução do espanhol por Giulia Gaspar

Autor

Economista. Consultor de organismos nacionais e internacionais. Especializado no mercado de trabalho, gênero e discriminação. Professor de várias universidades no Canadá e na Colômbia. Doutor pela Universidade de Toronto.

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