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Um possível plano B para o Chile

Agora que a Convenção Constitucional (CC) começa a apresentar os primeiros resultados concretos da sua proposta, se manifestou na opinião pública a real possibilidade de rejeição no plebiscito de saída. Certamente as razões que poderiam ser invocadas para justificar a rejeição são múltiplas. Alguns invocarão a ilegitimidade de origem (a violência) e o mal desenho de todo o processo; outros argumentarão o carácter refundador que a CC atribuiu à proposta, a qual não resgataria nada da nossa tradição política institucional, e outros ainda que o resultado final seria a representação das ideias maximalistas de um grupo. Também poderia ter o caso de posições que apontem para as consequências prejudiciais para o país de um ou vários artigos da nova carta fundamental. Assim sendo, sensibilidades de direita, centro e esquerda poderiam convergir por distintos caminhos para a ideia da rejeição.

O ponto central é que ainda não há clareza sobre uma proposta que aborde a possibilidade de triunfo após-rejeição, e agora é o momento de discutir algumas alternativas possíveis, considerando que a esta altura, para a maioria dos cidadãos (plebiscito/2020) e para uma grande parte das forças políticas partidárias, a atual Constituição é considerada sem esperança.

Por este motivo, é necessário responder o que pode ser feito no caso de o caminho seguido até agora pela CC não resultar como visualizam os partidários mais otimistas. Não é o objetivo desta coluna reprovar ou apontar culpados; supõe-se apenas que o caminho está sendo traçado e que a possibilidade de fracasso tem ganhado força. Dessa forma, o urgente é colocar sobre a mesa – para discussão – o que tem sido denominado na opinião pública como um “plano B”. 

Esta seria uma alternativa que poderia ser politicamente viável. Refiro-me especificamente à ressurreição do projeto de reforma constitucional que foi apresentado durante o governo de Michelle Bachelet. Não é uma ideia original, uma vez que tinha sido lançada em 2020, mas dadas as possibilidades de mudança e a encenação intemperada da CC, pode transformar-se em uma opção atrativa para muitos setores políticos. 

Projeto de reforma constitucional

Esta ideia não nasce por considerar que este projeto é uma peça constitucional perfeita, longe disso. Também não é a defesa fervorosa de um devoto do governo de Bachelet e do seu legado. São quatro pontos que no cenário atual fazem pensar que poderia ser uma opção concreta. 

O primeiro é que a proposta conta com um processo de participação cidadã. Se estipula que todo processo constitucional deve ter a disposição uma etapa de consulta efetiva ou simbólica para fornecer um apoio de legitimidade. Esta iniciativa teve início em 2015 e teve uma série de casos de participação que foram processados e encerrados. Criticar o seu nível de participação ou forma parece-me ser inútil, considerando que não existe um mecanismo ideal para tal. Assim, este projeto tem um trabalho em andamento, num contexto menos tenso e através de canais institucionais. 

Segundo, na lógica de reduzir a incerteza, o importante é que contamos com um texto que está muito bem definido. Neste sentido, se supera de imediato a incerta e perigosa “folha em branco”, muito polêmica no começo do processo constituinte que hoje vivemos. Independentemente de gostarmos ou não do conteúdo, os cidadãos e os diferentes atores políticos podem agora discutir um texto concreto para propor suas melhorias e ajustes. 

Além disso, se revisarmos o documento enviado ao Congresso, este deixa a discussão à margem do que é possível. Com isto quero dizer que, por um lado, se reconhece a tradição institucional chilena de que permaneça a maioria de suas instituições, o que o afasta completamente do ar de refundação que prevalece na CC. E, em alguns casos, se abordam temas incontornáveis no contexto atual, por exemplo, o reconhecimento dos povos indígenas e dos direitos ambientais.

Terceiro, deve-se ter em conta que a passagem desta proposta pelo Congresso tem a vantagem de reduzir a incerteza e de não submeter os cidadãos a outro processo eleitoral exaustivo de eleição de membros do Congresso. Ao chegarmos a um consenso sobre esta Constituição no Parlamento, poderemos fazer uso de uma normativa procedimental já existente e suportada por todos os atores políticos. 

Não voltaremos a perder tempo na definição de novas regras. Além disso, a distribuição das forças políticas no Congresso, na sequência do processo eleitoral de novembro, é bastante equilibrada e fruto de uma eleição mais calma e informada, ao contrário do que se verificou no calor da crise de outubro de 2019. Além disso, os partidos tradicionais e emergentes poderão atuar de uma forma muito mais coordenada em espaços que são conhecidos para a negociação, tornando possível um acordo transversal. 

Em suma, o Congresso, por experiência, disponibilidade de recursos e local de encontro para sensibilidades partidárias, é o melhor espaço para acordar uma saída para uma eventual rejeição. 

Quarto, a sua viabilidade política também está mediada pelo fato de provir do governo de Michelle Bachelet. Seria menos complexo para o atual governo promover no Congresso uma proposta que, de alguma forma, vem de um governo da “nova maioria”, no qual participaram comunistas, socialistas e mesmo democratas-cristãos. Além disso, o atual presidente, Gabriel Boric, se viu muito cômodo com o apoio de Bachelet no segundo turno e de (quase) todas as tendas partidárias que participaram desse governo.  

Ao mesmo tempo, seria uma jogada que permitiria a Boric assinar o novo texto constitucional e ter uma saída política para o seu governo, que está muito empenhado na mudança constitucional. Em suma, alguns setores importantes da esquerda ganhariam e, pelo menos, outros setores mais críticos não se sentiriam tão incômodos apoiando este projeto. 

Finalmente, após ser despachado pelo Congresso, se deverá realizar um plebiscito, de maneira que conte com a aprovação da maioria dos cidadãos. Assim, será um processo que dará continuidade institucional ao ser levantado em democracia e canalizado através das instituições políticas tradicionais. 

Muitos questionaram o Congresso, mas nesta altura considero que o Poder Legislativo, sendo uma peça chave na história da nossa república, tem a experiência e a legitimidade suficientes para canalizar este novo ciclo político no Chile. 

Em suma, a opção de rejeição torna-se mais viável na medida em que ofereça um roteiro claro para superar a incerteza e proporcionar estabilidade, um caminho mais atrativo do que ficar sentado à espera de uma série de reformas, segundo a opinião de alguns, que melhorem no futuro o texto aprovado no plebiscito de saída. 

*Tradução do espanhol por Giulia Gaspar.

Autor

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Cientista político e Diretor do Departamento de Sociologia, Ciência Política e Administração Pública da Universidade Católica de Temuco (Chile). Doutor em História e Master em Ciência Política pela Pontifícia Universidade Católica do Chile.

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