O que é realmente importante na política nem sempre é o que é dito, mas o que é silenciado. São os silêncios que dão peso às palavras. Dito de outra forma: é o que não é dito sobre a Venezuela, bem como aqueles que optam por não dizer, que condena a Venezuela.
“Não há fraudes de direita ou de esquerda. Existem fraudes”, diz Sergio Ramírez, com razão. Diz isso em um texto intitulado “Eu já vi esse filme”. O título não implica só o autor nicaraguense, vítima de outra ditadura igual ou pior que a venezuelana, mas pelo menos o resto dos latino-americanos. Porque já vimos esse filme muitas vezes e em muitas partes. Não só o filme da fraude e dos ultrajes cometidos pelos ditadores que reaparecem constantemente nessas latitudes, mas também o filme dos que se calam.
É o caso dos que, embora tenham falado, também se calaram timidamente diante das brutalidades cometidas por Nicolás Maduro e sua gangue, antes, durante e depois das eleições. Falo, por exemplo, de México, onde o presidente López Obrador destacou que é necessário esclarecer o resultado das eleições – como se desconhecesse a trapaça do ditador venezuelano – e tentou a todo custo evitar uma condenação firme do caso. O mesmo se aplica a Claudia Sheinbaum, sucessora de López Obrador, que, imitando o estilo deste, também se recusou a condenar as ações do tirano. Ela defende não intervir – aqui se cala – mas López Obrador não tinha interesse em deixar de criticar e questionar o governo peruano sempre que podia – aqui ele fala – após a destituição do presidente Pedro Castillo.
Uruguai, Costa Rica, Estados Unidos. Todos se manifestaram. Por enquanto. Se há algo que esses dois grupos chamados esquerda e direita compartilham é o silêncio. Se amanhã – porque sempre voltam – um ditador agora de direita cometer um ato como o de Maduro, a direita certamente se manterá em silêncio. Não há silêncios de direita ou de esquerda. Há silêncios.
Mas outros falaram: o presidente chileno, Gabriel Boric (que no passado havia elogiado o chavismo), condenou as atitudes antidemocráticas de Maduro. Além de seus acertos e erros – além de uma questão ideológica – se manifestou e condenou, e isso deve ser reconhecido. É verdade que outros também se manifestaram: Evo Morales, por exemplo, apoiou o tirano venezuelano. Díaz Canel, o homólogo cubano de Maduro – ou seja, o homólogo em termos de tirano – também o apoiou, como era de se esperar. Eles falaram. Mas, como observado no início, o que importa na política nem sempre é o que é dito.
A oposição venezuelana teve de ficar calada. No entanto, como estão acostumados, seu silêncio tem sido difícil. Portanto, quando falam, precisam ser ouvidos. O ditador Nicolás Maduro persegue, prende, assedia, mas a Venezuela grita. E grita tão alto, porque tentaram lhe impor silêncio. Um silêncio do qual as instituições chavistas também são cúmplices, como o Centro Nacional Eleitoral, que permaneceu em silêncio quando o ditador mandou, e só falará quando o ditador mandar. Silêncio no qual grande parte da comunidade internacional também foi cúmplice, como quando, além das menores reclamações, a líder da oposição María Corina Machado foi desqualificada como candidata, e a perseguição a qualquer aroma de oposição se repetiu mais uma vez. Porque a própria natureza do chavismo é a imposição.
Do lado de fora, estamos testemunhando o declínio de uma nação por causa de patifes que continuam com o ataque democrático a qualquer custo. Do lado de fora, vimos o corpo doente, que deu mil e um sinais de sua doença e agora está agonizando, e só agora está sendo realmente tratado. É claro que é fácil falar quando não se é perseguido. No entanto, aconteça o que acontecer com o ditador venezuelano, isso foi consequência do silêncio. Imposto, decidido ou ignorado. Silêncio que condenou aqueles que estavam gritando. Não há silêncios nacionais ou internacionais. Há silêncios.
Só que alguém não se calará: a história.
Autor
Doctoranda en Ciencia Política en el Instituto de Estudos Sociais e Políticos de la Univ. do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ). Magíster en Ciencia Política por la Univ. Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).