Em fevereiro próximo, o Equador ensaiará um novo exercício de reforma política para modificar os equilíbrios entre democracia participativa e democracia representativa que estão estabelecidos na Constituição de 2008. Ali foi indicada uma quinta função do Estado, a de transparência e controle social, mediante a substituição da legislatura enquanto função de designação de titulares dos órgãos de controle. O Conselho de Participação Cidadã e Controle Social (CPCCS), que assumiu essas funções, mostrou-se ineficiente e vulnerável a todo tipo de pressão. A consulta popular convocada pelo Governo do Equador para 5 de fevereiro aponta para a modificação desta situação. Entretanto, o caminho adotado não parece ser o mais idôneo.
A Constituição de 2008 estabelece três modalidades de mudança política constitucional: reforma, que é tratada pela Assembleia e requer, para sua aprovação, dois terços de seus integrantes; emenda, que é tratada mediante plebiscito ou consulta popular; e a Assembleia Constituinte. As duas primeiras não podem alterar a estrutura do Estado ou afetar os direitos, enquanto a terceira pode introduzir modificações desta profundidade.
Uma reforma de base teria a ver com a instalação de uma Assembleia Constituinte, mas o regime descarta essa possibilidade e opta por um caminho que combina as modalidades de reforma e emenda constitucional. As perguntas se agrupam em três grandes eixos temáticos: segurança, institucionalidade e meio ambiente. As duas primeiras estão dirigidas ao fortalecimento do Estado na luta contra o crime organizado através da introdução da extradição nos casos de delitos transnacionais e do fortalecimento do Ministério Público. Para isso, fomenta sua autonomia em relação ao Conselho Judiciário.
As perguntas três e quatro apontam para a redução do tamanho da Assembleia e a exigência de maiores requisitos para o registro dos movimentos locais, a fim de diminuir a fragmentação política e o localismo. As perguntas cinco e seis visam a modificação dos processos seletivos na integração do CPCCS, bem como para os órgãos de controle (Controladoria, Procuradoria, Defensoria Pública, Conselho Eleitoral, Conselho Judiciário, Superintendências e outros). Finalmente, as perguntas sete e oito são orientadas para melhorar a governança ambiental mediante o controle das fontes hídricas e da compensação para quem protege os bens ambientais.
A consulta parece advertir que o problema central da institucionalidade reside nos déficits de capacidade seletiva do sistema político. Atualmente, os atores políticos não são funcionais ao aumento do poder de decisão para reduzir as assimetrias sociais, gerar bem-estar e crescimento econômico. As decisões que a Assembleia adota respondem a interesses particulares de grupos de poder e, em muitos casos, a estruturas mafiosas ou criminosas. O desenho institucional gera fragmentação e não é propício à produção consensual de políticas.
O mesmo problema, mas em outro grau institucional, se apresenta ao ter que definir as lógicas de controle político. O desenho garantista põe ênfase no direito de acesso ao processo decisório, gera a impressão de que o sistema está aberto para fortalecer a democracia participativa e receber a participação de cidadãos interessados em integrar os órgãos de controle, mas ao fazê-lo acaba negligenciando a responsabilidade na tomada de decisões, o cidadão que os integra é responsável só por si mesmo e não pela sociedade ou pelas instituições que a conformam.
A legitimidade escassa da origem de funcionários dessas instâncias os tornam sujeitos influenciáveis por parte de poderes de fato que não decorrem da representação política, o que acaba politizando essas instituições e bloqueando seu funcionamento ou, na falta disso, judicializando a política ao utilizar indiscriminadamente os recursos garantistas de proteção dos direitos. A linha antirepresentação encontrada na Constituição de Montecristi revela a gravidade de seus efeitos.
Embora reconheça a pertinência dos temas e das perguntas, as mudanças e modificações propostas pela consulta não são claras e contundentes. Isto pode ser visto tanto na tímida reforma do sistema de organizações políticas quanto na ambígua e indecisa transferência das competências do CPCCS para o legislativo.
Ademais, a dicotomia entre partidos nacionais e movimentos locais se mantém, já que a reforma visa mais o quantitativo do que o qualitativo. Tampouco basta reduzir o tamanho da legislatura ou exigir limiares de filiação aos movimentos; em todo caso, seria uma questão de eliminar esta dicotomia e fortalecer os partidos como monopólios de representação e incentivar sua presença nos âmbitos locais para reduzir o localismo e o clientelismo. Entretanto, a consulta não define claramente estes aspectos substantivos e cruciais do funcionamento seletivo do sistema político.
O recomendável seria reforçar a legitimidade de origem nos processos de nomeação de autoridades de controle, nos quais o legislador pode recuperar o protagonismo, e trabalhar na reconfiguração da representação, fechando, no entanto, o ciclo de antipolítica que caracterizou o desenho institucional de Montecristi.
Tudo isso suporia determinar mais claramente o papel da sociedade civil (Academia e associações profissionais), que poderia atuar como instância ou filtro de mediação técnica e profissional, para que, junto com mecanismos de contestação cidadã aberta, as capacidades seletivas do sistema melhorem. Entretanto, estas linhas de reforma não parecem adequadamente formuladas na consulta.
É provável que a reforma institucional deva esperar melhores condições com o objetivo de possibilitar um exame mais profundo de toda a estrutura institucional, mas isso exigiria uma Assembleia Constituinte, o que, nas condições atuais, pareceria inviável.
Autor
Sociólogo. Lecionou em diferentes universidades do Equador e é autor de vários livros. Doutor em Sociologia pela Università degli Studi di Trento (Itália). Especializado em análise política e institucional, sociologia da cultura e urbanismo.