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A única via política possível para o Brasil

As mobilizações do dia sete de setembro em várias cidades do país pretenderam demonstrar o apoio político que um amplo setor da sociedade ainda mantém ao atual presidente Jair Bolsonaro. Demostraram, inclusive, a sua disposição para conduzir a narrativa bolsonarista nos limites dos marcos democráticos, levando o próprio Bolsonaro a radicalizar suas posturas. 

Nos seus dois discursos, um em Brasília pela manhã e outro em São Paulo pela tarde, Bolsonaro pareceu preso no seu próprio labirinto criticando o Poder Judiciário e parodiando um eventual golpe à institucionalidade do país. O objetivo tinha sido demonstrar força política e legitimidade perante a sociedade, no entanto, terminou evidenciando fragilidade política e muito pouca habilidade para lidar com seus próprios discursos e ações.   

Uma grave crise econômica  

Brasil se encontra em um dos piores momentos econômicos dos últimos anos com índices de desemprego históricos, inflação em constante crescimento, aumento de preços dos alimentos e endividamento das famílias. Gravemente atingido pela pandemia, o país vive um clima generalizado de ceticismo econômico e estresse político que em nada favorece o investimento e o trabalho. O desânimo da população é perceptível e existe uma falta de confiança no futuro imediato.

Neste contexto, as mobilizações do domingo 12 de setembro em algumas cidades do país foram sintomáticas da indignação com uma situação que se interpreta insustentável, econômica e politicamente. Convocadas por diversos setores da sociedade, as mobilizações alertam sobre os perigos iminentes do governo de Bolsonaro, da sua inoperância perante os problemas econômicos reais e do seu desvio no comportamento político que ameaça a vida democrática.    

Enquanto isso, continua-se alimentando a tese sobre a divisão política da sociedade em dois blocos. Se por um lado os seguidores de Bolsonaro reeditam quando podem sua postura anti-PT e anti-Lula, os partidários do ex-presidente Lula da Silva trabalham nas redes sociais no desenho de um cenário semelhante, que os coloca como antagônicos privilegiados do atual governo.

Lideres e militantes do PT, e dos seus partidos aliados, não estiveram presentes nas mobilizações do domingo 12. Uns disseram que não foram convidados, ainda que já tenham manifestado seu incomodo em juntar-se com determinadas forças políticas do país para exigir o já clássico ‘Fora Bolsonaro’. Se bem em outras mobilizações se constatou o interesse pelo impeachment do presidente, lideres e militantes do PT se apresentam ambíguos e desconfiados com um processo que, em definitivo, faria cair politicamente a Bolsonaro e, com isso, deixar vazio um dos blocos da polarização para a disputa eleitoral no ano de 2022. 

Já é possível ler nas redes sociais a simpatizantes do ex-presidente Lula procurando radicalizar o ‘perigo Bolsonaro’, sobrevalorizar o significado político das mobilizações do dia sete de setembro e do seu conteúdo ideológico com o objetivo de não deixar cair seu poder e influência. Para estes, Bolsonaro não pode ser relativizado em tanto figura política que poderia paulatinamente perder espaços com vistas à futura contenda eleitoral. Se Bolsonaro se constituiu discursivamente como antagônico do PT e de Lula, torna-se necessária a permanência da sua legitimidade para a manutenção da polarização política. Neste sentido, as mobilizações recentes e futuras em torno ao PT e Lula também vão jogar um jogo aparte: retroalimentar as velhas disputas políticas com o objetivo de dar sequencia ao desenho de um cenário político polarizado entre Lula da Silva e Bolsonaro.         

As pesquisas indicam uma preferência por Lula

As pesquisas dos últimos meses sobre intenção de voto para as eleições de 2022 indicam a preferencia por Lula da Silva perante Bolsonaro e o deterioro progressivo da figura do atual presidente. Foi em parte por estas questões que ultimamente Bolsonaro não cessou em apresentar-se publicamente para dar coesão e força aos seus eleitores.

Mas, paralelamente à queda da sua popularidade, outros pré-candidatos à presidência da República como por exemplo Ciro Gomes vem ganhando terreno. Isto não significa que as adesões a Ciro Gomes estejam diretamente vinculadas com a queda da imagem da figura de Bolsonaro, senão que seria nele que parece concentrar-se o voto de pessoas que nas pesquisas também afirmam não votar em Lula nem em Bolsonaro.

Os círculos bolsonarista e lulopetista, desde seus antagonismos, trabalham em simultâneo para que não surja, nem desde a esquerda, o centro ou a direita política, o que se tem denominado ‘terceira via’ ou uma alternativa política à polarização instaurada. Para o bolsonarismo, uma ‘terceira via’ traduziria um lulopetismo travestido, uma esquerda disfarçada conivente com a corrupção, etc.   

Para o lulopetismo e seu círculo de influencia política, além da sua estrutura partidária, uma ‘terceira via’ é entendida como a continuação de Bolsonaro sem Bolsonaro, da continuação de um processo político que teria abandonado as pautas populares e conduzido a direitização do país. No entanto, o que se define como ‘terceira via’, na realidade, não surge como contraponto de duas vias políticas anteriores, senão como única alternativa política possível a um ciclo iniciado nos anos 2000, e que com Bolsonaro ganha sua expressão mais recente: o lulobolsonarismo.       

Os que muitos definem como ‘terceira via’ não é outra coisa do que a única via política possível que poderia por fim a um ciclo político com certos devaneios populistas e personalistas, e que tem desenhado uma sociedade polarizada em constante conflito. Para grande parte da sociedade brasileira não existiria ‘terceira via’ porque não se trata de assumir uma opção política situada nos interstícios de duas vias já preexistentes. Para muitos, o ciclo político atualmente materializado em Bolsonaro, e iniciado com Lula, estaria chegando ao seu fim.    

Só existiria uma única via política possível para sua superação e chamar-lhe de ‘terceira via’ não seria de todo apropriada. Nas eleições de 2022 a verdadeira disputa será entre os que querem dar continuidade a este ciclo político e entre aqueles que querem seu fim. E para estes últimos, existe uma única via política possível para o Brasil. 

Autor

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Cientista político. Professor do Programa de Pós-Graduação em C. Sociais da UNISINOS (Brasil). Doutor em Sociologia Política pela UFSC (Brasil). Pós-doutorado no Centro de Estudos Latino-Americanos da Univ. de Miami. Professor visitante na Univ. de Leipzig (Alemanha).

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