“Temos um Ministério da Segurança Pública! Uma ideia que se discute desde o governo do presidente Ricardo Lagos, que passou por distintas administrações e que agora vemos materializada graças à unidade de distintos setores políticos”, celebrou o presidente Gabriel Boric em 27 de janeiro ao promulgar a lei. Hoje, um novo ministro foi nomeado para a pasta, tornando o Chile o terceiro maior da América Latina em termos de número de ministérios, com um total de 25, atrás somente do Brasil (38) e da Venezuela (34).
A criação, modificação ou eliminação de ministérios responde claramente a uma ideia, ou a componentes ideológicos. Em qualquer uma dessas mudanças, há um marco conceitual que identifica e define um problema e, por outro lado, um (re)desenho institucional e burocrático para abordá-lo. Reconfigurar um ministério não só materializa um conjunto de princípios e objetivos de um governo ou coalizão, mas também reflete um consenso mais amplo na classe política em um contexto democrático. Esse processo responde a uma demanda social que, em um determinado momento, adquire relevância e busca se consolidar como uma política de Estado com projeção para além de uma administração específica.
Um caso ilustrativo do peso das ideias é o de Hugo Chávez, que em 2006 renomeou todos os ministérios da Venezuela, acrescentando a eles o adjetivo “do Poder Popular”, em linha com seu projeto ideológico de construir um “Estado Comunal” e promover o socialismo do século XXI. Também destacam os casos de Dilma Rousseff no Brasil (2015) e Gustavo Petro na Colômbia (2023), que promoveram a criação de ministérios da Mulher ou de Igualdade de Gênero como parte de sua estratégia para posicionar essas temáticas na agenda pública. No Brasil, esse ministério foi fundido durante o governo de Jair Bolsonaro, mas depois restabelecido por Lula da Silva em 2023.
Por outro lado, a fusão ou eliminação de ministérios também responde a componentes ideológicos, principalmente orientados para a eficiência e a redução do setor público. Um exemplo de absorção se observa na administração do presidente boliviano Gonzalo Sánchez de Lozada, que, em 1993, no marco de um programa de redução de gasto público, eliminou quatro ministérios (Educação, Cultura, Mineração e Energia). Mais recentemente, no Brasil, Jair Bolsonaro reduziu o número de ministérios de 29 para 15 em 2019, fundindo pastas importantes como Finanças, Planejamento e Indústria em um único Ministério da Economia, em linha com seu discurso de austeridade e abordagem liberal. Na Argentina, o presidente Javier Milei fechou 13 ministérios em 2023, demitindo milhares de funcionários públicos sob o argumento de reduzir o tamanho do Estado e conter os gastos, de acordo com sua ideologia libertária.
Esses exemplos mostram que a criação, transformação ou eliminação de ministérios tem implicações significativas. Primeiro, enviam uma mensagem aos cidadãos sobre a priorização de determinados temas na agenda pública, seja para fins eleitorais ou como expressão de uma nova estrutura ideacional sobre um problema social. Em segundo lugar, essas mudanças podem refletir a implementação ou o desmantelamento de ideias defendidas por organizações políticas, partidárias ou sindicais.
O caso do Ministério de Segurança Pública do Chile ilustra bem como essas decisões dependem de circunstâncias políticas e ideológicas e exigem uma janela de oportunidade para se concretizarem. Sua discussão começou em 2005, como consequência das reformas constitucionais daquele ano. Mais tarde, a Presidente Michelle Bachelet incluiu sua criação em seu programa de governo e apresentou um projeto de lei em 2006. Entretanto, durante sua passagem pelo Congresso, o projeto de lei foi alterado, resultando na transformação do Ministério do Interior com a incorporação da dimensão de segurança, em vez da criação de uma pasta separada.
O presidente Sebastián Piñera aceitou a ideia e apresentou um projeto de lei no Senado em setembro de 2021. No entanto, embora a segurança fosse um dos eixos de seu programa, a criação de um ministério específico não estava entre suas principais medidas. Tampouco foi um tema central na comissão convocada em março de 2021 para tratar da segurança pública, integrada por parlamentares, prefeitos, organizações da sociedade civil e acadêmicos, que deu origem ao Acordo Nacional de Segurança Pública. Embora Piñera não tenha conseguido aprová-lo durante seu governo, o processo continuou sob a administração de Boric.
No programa de Boric, a criação do ministério foi mencionada na estrutura da reforma policial, propondo uma “nova estrutura institucional” com um portfólio mais técnico sob o nome de “Ministério da Segurança, Proteção Civil e Convivência Cidadã”. Em outras palavras, a ideia de separar a segurança do Ministério do Interior já havia sido consensuado transversalmente em todos os setores políticos.
Em suma, a criação do Ministério da Segurança Pública não é uma ideia nova, mas uma proposta que já contava com um amplo consenso na classe política chilena. Os diferentes diagnósticos e escopos para lidar com a segurança pública podem ser debatidos, mas o que é certo é que há muito tempo existe um consenso sobre a necessidade de um órgão burocrático específico para lidar com esse problema. Entretanto, sua aprovação requer uma janela de oportunidade que qualquer político aproveitará, mesmo que os detalhes do projeto não coincidam totalmente com suas ideias iniciais.
Nesses processos, além da racionalidade técnica, o peso simbólico e a mensagem a ser transmitida ao público têm precedência. A segurança pública, sem buscá-la, tornou-se um eixo central da agenda do governo Boric, uma problemática que, sem dúvida, será chave nas eleições presidenciais do Chile este ano. As ideias são importantes, sim, mas elas precisam de seu momento para se materializar.
Tradução automática revisada por Isabel Lima