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Cuba: as prisioneiras da ditadura

Recentemente, dez prisioneiras políticas cubanas, encarceradas durante as manifestações de julho de 2021 em Cuba, assinaram com seu sangue uma carta dirigida ao presidente da república, Miguel Díaz Canel-Bermúdez. No documento, pediam que fosse respeitada a vontade do Sumo Pontífice (expressa através do Cardeal Beniamino Stella durante uma visita que ele fez à ilha entre 23 de janeiro e 10 de fevereiro) de libertar os manifestantes de julho de 2021.

A publicação deste texto e sua repercussão no espaço digital cubano levaram estas mulheres a um julgamento disciplinar dentro da prisão, um processo que, se repetido, poderia agravar sanções que já incluem até 14 anos de privação de liberdade, como no caso de uma das signatárias, Lizandra Góngora, mãe de cinco menores de idade. Além disso, no centro penitenciário Mujeres de Occidente, onde escreveram e assinaram seu pedido de ajuda e liberdade, o uso de papel e a redação de cartas foi proibido a todas as detentas do presídio. Isto é usado pelas autoridades penais para colocar as prisioneiras umas contra as outras, rotulando as manifestantes como “responsáveis” pela punição generalizada.

Este fato sintetiza a experiência da prisão para as mulheres cubanas, que não só sofrem condições subumanas de insalubridade, superlotação, fome, negligência, maus-tratos físicos e desrespeito a seus direitos (assim como todos as privadas de liberdade na América Latina), mas também são vítimas de severas punições por exigirem ditos direitos.

A violência contra as mulheres na política não é um fato isolado em Cuba. Não se pode sequer dizer que se trata (somente) de uma prática amplamente tolerada pelo Estado (como demonstrado pelo monitoramento de iniciativas feministas como o Observatório de Gênero de Alas Tensas y Yo Sí Te Creo), pois é precisamente o Estado cubano o principal perpetrador da violência contra as mulheres.

Todos os domingos, pelo menos uma dezena de mulheres integrantes das Damas de Blanco são impedidas de assistir à missa ou a algum espaço de protesto ou socialização política, e são detidas por horas em unidades policiais ou forçadas a pagar multas de até um salário médio cubano. A elas se juntaram (em igrejas e calabouços) as mulheres que integram o recém criado movimento Cuba de Luto, que, vestidas de preto, tentam exigir em público a liberdade de seus entes queridos, em sua maioria detidos na esteira do 11J. 

Também recentemente, foram detidas algumas mulheres cujos protestos em espaços públicos procuram o fechamento das lojas de moedas livremente conversíveis (MLC), uma moeda segregacionista na qual o Estado não paga seus trabalhadores, e cujo acesso é limitado a uma pequena parcela privilegiada da população.

Organizações independentes de direitos humanos, que tiveram a ajuda de distintos membros da sociedade civil, puderam contar que, após a explosão social de julho de 2021 e devido a protestos públicos, pelo menos 284 mulheres foram colocadas atrás das grades em Cuba: 223 em relação ao 11J e 61 por protestos públicos (ou em relação direta ou indireta com as manifestações dos últimos dois anos).

Entretanto, antes desses protestos, pelo menos quatro mulheres foram privadas de sua liberdade por razões políticas. Uma delas, Aymara Nieto, foi mantida por dois anos em um centro penitenciário a mais de 600 quilômetros de distância de seu marido e duas filhas. Ela foi presa porque pertence ao grupo opositor Damas de Blanco (desde 2003, este tem exigido pacificamente nas ruas a liberdade de seus maridos, filhos e pais, que também são prisioneiros políticos do regime cubano) e ao grupo opositor Unión Patriótica de Cuba (Unpacu).

Atualmente há 69 mulheres detidas por protestos públicos. O caso mais recente de privação de liberdade de uma mulher ocorreu no último 10 de janeiro, quando o aparato repressivo da Segurança do Estado tirou de sua casa uma jovem influencer de 21 anos e a deixou arbitrariamente, até o momento e sem medida cautelar, no quartel general da Segurança de Estado em Havana. A jovem foi submetida a interrogatórios como forma de tortura. Seu nome é Sulmira Martínez Pérez, ela é conhecida como Salem e está sendo investigada por publicar em suas contas do Facebook sua intenção de ir às ruas.

Em um contexto no qual as mulheres do mundo estão repensando como fazer para continuar a luta pela reivindicação de nossos próprios direitos e para aquelas que resistem em condições mais marcantes de vulnerabilidade, as mulheres cubanas que enfrentam o totalitarismo cubano se perguntam quanto tempo levará para chamar à responsabilidade um Estado que nada mais faz do que ratificar seu controle sobre nós. Algumas são presas nas piores condições; outras são privadas de serviços de Internet ou impedidas até mesmo de sair de suas casas; outras são impedidas de retornar ao país e outras são obrigadas a deixá-lo.

Por isso, apelamos à solidariedade internacional e pedimos aos grupos de mulheres, mães e ativistas latino-americanas de direitos humanos, governos democráticos, organizações não governamentais, fóruns e alianças regionais/internacionais intergovernamentais que também levantem sua voz pelas mulheres de Cuba, mas sobretudo pelas prisioneiras políticas, que agora também estão privadas do uso do papel.

As mulheres cubanas que, em Cuba e fora de Cuba, reclamam a ausência de direitos humanos, civis e políticos e de liberdades de todo tipo, assim como o fim da governança absoluta do Partido Comunista de Cuba, precisam de chamados de atenção que questionem a falta de condenação pública e multilateral de encarceramentos massivos, prolongados e permanentes de mulheres que saem às ruas em busca de pão e liberdade.

Autor

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Investigadora y defensora de derechos humanos. Coordinadora General de Justicia 11J, grupo de trabajo sobre detenciones por motivos políticos en Cuba. Maestranda en Estudios Interdisciplinarios sobre Cuba, América Latina y el Caribe.

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