Guillermo Lasso completou seus primeiros seis meses de governo no Equador, em um mandato de quatro anos. O balanço apresenta múltiplas nuances em um contexto de crise econômica herdada, mas que se exacerba devido à pandemia. Nos 100 primeiros dias ele cumpriu sua principal promessa de campanha: vacinar nove milhões de pessoas com a finalidade de reativar a economia, promover confiança e legitimidade, sobretudo nos setores que não votaram nele. Ele começou bem, no entanto, há três fatores que tornam sua administração mais complexa: carece de qualquer maioria na Assembleia (relativa, absoluta e qualificada), sua equipe está em uma curva de aprendizado, pois vem do setor privado, e ele está sobrecarregado pela realidade: desemprego e insegurança.
A crise econômica impede que Lasso amplie sua margem de manobra política com os setores sociais que insistem em um conjunto de medidas que são difíceis de resolver, especialmente quando o governo enfrenta o desafio de reduzir, em 2022, um déficit fiscal de 11 bilhões de dólares e se esgotam os recursos com os financiadores multilaterais. O Parlamento de los Pueblos é o principal adversário do governo e aglutinar setores com capacidade de mobilização, protesto e greve, como a Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), a Frente Unida dos Trabalhadores (FUT), o Sindicato Nacional dos Educadores (Une), o Partido Socialista, a Unidade Popular e o movimento Pachakutik.
O diálogo entre o Governo e o Conaie configura um cenário de soma zero nas duas ocasiões em que foram realizados encontros para buscar saídas conjuntas, já que as demandas das lideranças indígenas mais radicais não estão dentro do roteiro do presidente, ou seja, que o aumento dos preços dos combustíveis seja interrompido e o preço congele no mesmo nível de antes da presidência da Lasso, o fim das relações com os multilaterais (FMI), a não-extração de minerais, a luta contra a evasão fiscal, entre as mais importantes. Embora haja coincidências sobre a situação de crise por parte dos grandes atores, não há acordo. Conaie deu um ultimato ao Governo até o final do mês, senão voltarão às ruas.
Do lado do governo, a ênfase tem sido em melhorar a agenda que o setor indígena reivindica, já que existem vários problemas que, paradoxalmente, não constam nas demandas da Coanie. As comunidades da Sierra Centro são as que mais padecem de desnutrição infantil crônica (38%), acesso a serviços básicos como água, evasão escolar em diferentes níveis de formação, falta de conectividade e de crédito para o desenvolvimento de atividades de agricultura familiar e campesina. Desta perspectiva, parece que o Governo e a liderança indígena enxergam os problemas e as soluções com olhos diferentes.
Além da dificuldade de encontrar uma solução consensual entre o setor social e o Governo, há o problema da insegurança que, embora não seja uma expressão nova neste período, está piorando devido aos massacres registrados nos centros de reabilitação social, onde a violência e o descontrole entre as gangues levaram a 316 mortes até agora. A administração penitenciária sobrecarregou o Estado, pois não há respostas conclusivas, mas sim um conjunto de ensaios. O governo defende a hipótese de que o crime organizado e os cartéis do México provocam o caos, enquanto que, por outro lado, dizem que os massacres são evidência de uma disputa entre gangues para controlar as prisões.
A crise carcerária abriu um espaço de governabilidade, pois o Executivo ganhou o apoio dos representantes das demais Funções do Estado e do sistema judiciário para trabalhar em soluções conjuntas, no entanto, se vive uma calma tensa, pois o Estado está indefeso enquanto os diferentes setores da sociedade discutem se o crime deve ser resolvido com punho de ferro ou com base em processos de negociação com gangues criminosas. O Partido Social-Cristão de direita (PSC) levantou a proposta do porte de armas, enquanto os setores mais moderados têm se destacado por sua ausência, devido à complexidade da insegurança.
Neste contexto, a maioria dos integrantes da Comissão de Garantias Constitucionais da Assembleia aprovou o relatório de investigação sobre os Pandora Papers, que insiste na necessidade do Presidente comparecer perante o legislativo para explicar se ele violou ou não o Código de Ética, ou seja, se no momento do registro de sua candidatura ele tinha ou não empresas offshore. Lasso deixou tudo nas mãos de seus advogados, em um cenário onde o correísmo e o bloco político da Conaie, Pachakutik, se aguçaram contra ele. Apesar da fraqueza do Executivo, a tese de uma possível destituição foi diluída.
A partir da sociedade civil emerge a proposta de impulsionar um diálogo nacional entre os principais atores políticos e setores da sociedade com a finalidade de aproximar as posições das partes em conflito, mas também de ir além da conjuntura atual, pois não se trata de soluções conjunturais ou medidas paliativas quando o conflito pode surgir com maior força logo ao virar da esquina. Este chamado é feito a um Governo que peca pela autossuficiência quando a complexidade a ultrapassa, e a uma oposição que assume uma postura intransigente sem contar com propostas concretas para sair da crise.
É um desafio para o Governo chegar a dezembro com dinheiro para pagar os salários do setor público e ter resistido às distintas ameaças de greves, mobilizações e protestos. O resultado da aprovação da reforma tributária enviada à Assembleia pelo Executivo será um termômetro do que está por vir. Se ela passar pelo Ministério do Direito, a consequência será um cenário que deslegitimará a proposta, enquanto que se os votos para sua aprovação forem alcançados, haverá um pequeno respiro para iniciar o ano seguinte. São apenas seis meses desde o começo do mandato de Lasso e a crise política é intensa.
*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima
Autor
Cientista político e comunicador. Coordenador geral de pesquisa do Instituto de Altos Estudios Nacionales - IAEN (Quito). Doutorado em Ciências Sociais pela FLACSO-Equador. Últimos livros (2020): "En el ojo del huracán. Lei de Comunicação no Equador".