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Estados Unidos fornece as armas, México os mortos

A situação de violência no México é grave, e parte desta situação é responsabilidade do tráfico ilegal de armas proveniente, em sua totalidade, dos Estados Unidos. Há anos, em parte como efeito da luta contra o narcotráfico, o México vem adicionando milhares de mortes a uma estatística sombria que assombra, preocupa e gera pavor em sua sociedade. Como dizem no norte asteca, “os gringos fornecem as armas, nós fornecemos os mortos”.

A demanda mexicana

Em 4 de agosto, o governo federal mexicano entrou com uma ação civil por danos na Corte Federal de Massachusetts, Estados Unidos, contra onze empresas fabricantes de armas pela venda irresponsável e negligente que estaria ocorrendo no território mexicano, favorecendo assim o tráfico ilegal de armas, o que causou danos diretos ao país.

Após a apresentação do processo, em 21 de agosto, Marcelo Ebrard, Secretário de Relações Exteriores do México, comunicou que a corte estadunidense deu permissão para o processo prosseguir. “A Corte Federal de Massachusetts aceitou o litígio (…) É um primeiro grande passo, agora vem a notificação e o processo legal. Avançamos”, publicou o chanceler em suas redes sociais. A ação foi movida em Boston porque é a cidade sede das empresas réus.

Entretanto, apesar desta aceitação judicial, deve-se ter em mente que o processo pode arrastar-se por anos, especialmente dado o poder político destes fabricantes, que tem entre seus principais apoiadores a muito poderosa Associação do Rifle, à qual pertenciam os falecidos John Wayne e Charlton Heston, entre outros famosos. Seu lema: “as armas não matam; os homens matam” é uma falácia de cabo a rabo que encontra muitos adeptos em um povo historicamente acostumado a manusear armas de fogo.

Segundo o governo mexicano, o objetivo desta demanda é duplo. Por um lado, busca alcançar um aumento dos controles dentro do próprio Estados Unidos e, por outro, obter uma compensação financeira, cujo valor ainda não é conhecido. 

As empresas acusadas são Smith & Wesson; Barrett Firearms Manufacturing; Beretta USA; Beretta Holding; Century International Arms; Colt’s Manufacturing Company; Glock, Inc; Glock Ges.m.b.H.; Sturm; e Ruger & Co.

Witmer Public Safety Group e Interstate Arms também são processados como distribuidores e provedores das armas. Deve-se assinalar que a Barrett fabrica o fuzil de franco-atirador calibre 50, que é o preferido dos narcotraficantes mexicanos.

Números que estremecem

A apresentação judicial do país asteca cita alguns números que estremecem: o tráfico ilegal ultrapassou meio milhão de armas de fogo por ano que contribuíram, só em 2020, com mais de 36 mil vítimas, o que representando uma taxa de 29 homicídios a cada 100 mil pessoas.

Segundo uma revisão de dados publicados pela mídia mexicana, a realidade não é apenas grave, ela está aumentando. De 23.100 mortes em 2017, subiu para 36.750 em 2020.

Embora nem todas as fontes coincidam nos números, existe uma concordância de que desde 2007 mais de 350 mil mexicanos foram assassinados, muitos deles sem qualquer relação com o conflito armado por causa do narcotráfico. Do total de mortos do ano passado, cerca de 5 mil eram jovens, enquanto cerca de 300 eram crianças.

Demanda adiantada

Os advogados do governo mexicano estão trabalhando no processo desde o início de 2020, mas um evento apressou a apresentação à Corte. Se trata da oferta de indenização apresentada pela Remington Arms aos familiares das vítimas do massacre em uma escola de Connecticut. Nesse caso, ocorrido em 2012, 26 crianças e adultos foram assassinados com armas de sua fabricação.

Embora as leis federais aprovadas no início deste século protejam os fabricantes de processos civis, Remington, consciente de que a impunidade tem limites, estabeleceu negociações privadas para ressarcir as famílias dos assassinados com 33 milhões de dólares. Por isso, o governo mexicano estimou que este era o momento propicio para apresentar sua própria demanda.

De fato, as empresas fabricam armas desenhadas especialmente para os narcotraficantes com o objetivo de atrair o não desprezível mercado de cartel. Incluem diferentes arranjos estéticos e funcionais pensados especificamente para os chefes e pistoleiros do narcotráfico.  Por exemplo, a pistola Colt calibre 38, que leva a imagem de Emiliano Zapata, um ícone mexicano, inclui o lema mais famoso do revolucionário: “É melhor morrer de pé do que viver uma vida inteira ajoelhado”.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

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Analista, comunicador e consultor independente de agências e organizações internacionais. Diretor nacional da Presagio Consulting Honduras.

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