A política anti-imigração de Donald Trump marcou uma mudança drástica na gestão fronteiriça. No final do seu primeiro ano na Casa Branca, o apoio inicial da opinião pública começa agora a mostrar sinais de desgaste.
Uma parte da população — que se sente ameaçada, com ou sem razão — começa a traçar um limite ético: apoia um maior controle migratório, mas rejeita a perseguição aos imigrantes quando isso implica violar garantias mínimas ou degradar sua condição humana.
Rejeição a métodos extremos
Uma pesquisa da Harvard-Harris, publicada no mês passado, mostra que 44% dos estadunidenses aprovam, em geral, a gestão de Trump. Isso representa uma queda de oito pontos percentuais em relação à mesma medição de fevereiro passado, mês seguinte à posse de seu segundo mandato, e de dois pontos em relação a setembro.
A aprovação de Trump agora está abaixo de 50% em todos os temas-chave, embora obtenha suas melhores avaliações no combate ao crime e à imigração, 49% e 47%, respectivamente.
Embora o apoio às suas ações no controle da imigração se mantenha acima de sua aprovação geral, começa a mostrar um declínio.
Após um pico inicial acima de 55%, o apoio se estabilizou em torno de 50% e depois recuou. Esse quadro sugere uma opinião pública que, em linhas gerais, valoriza o retorno do controle após um período percebido como caótico ou descontrolado sob o governo democrata, mas que, ao mesmo tempo, rejeita os traços mais duros da abordagem republicana.
Nesse sentido, a gestão migratória de Trump pode estar começando a ser vista como próxima de um estado policial em matéria de prisões e deportações. A sociedade está estabelecendo limites em relação aos procedimentos mais extremos. O fato de a tensão central não estar no objetivo, mas em mecanismos concretos questionados pela falta de garantias básicas, revela o mal-estar de fundo com o estado das coisas que Trump herdou e que uma parte do eleitorado considerava insustentável.
Um controle razoável
O termômetro social pode estar indicando um forte apoio ao sucesso do controle nas passagens de fronteira com o México, onde o governo estadunidense conseguiu avanços significativos, com os níveis mais baixos em 50 anos.
E essa percepção dos cidadãos a favor de um controle migratório razoável não nasce só do medo, da insegurança ou da manipulação. Surge de um processo longo, profundo e transformador que a política foi incapaz de prever e conduzir.
É justo reconhecer que o presidente democrata Joe Biden tentou, sem êxito, avançar em uma lei de amplo alcance sobre os imigrantes, que sofreu a paralisia da polarização, inclusive em seu próprio partido.
O chicote verbal do presidente não surge do nada. Responde a um clima que começou a tomar forma na década de 1990, quando muitos acreditavam que o fim da Guerra Fria e a expansão do livre comércio abriam as portas para uma prosperidade quase garantida.
Bode expiatório
A mudança na estrutura econômica enferrujou o cinturão industrial tradicional e expôs milhões de trabalhadores a uma concorrência feroz, acelerada pela China e por uma revolução tecnológica que alterou tanto a produção quanto o imaginário social do trabalho.
Os Estados Unidos, mesmo sendo o berço do desenvolvimento tecnológico, viram o polo industrial do Meio-Oeste ser corroído. Os impactos econômicos, sociais e culturais acabaram repercutindo na política. Esse declínio não foi percebido a tempo pelas elites políticas, que durante anos subestimaram seu peso simbólico.
Nesse contexto, os imigrantes pobres e indocumentados — atraídos pela promessa de oportunidades e pela imagem de um país próspero e livre — tornaram-se o alvo mais fácil para explicar a deterioração econômica e um mal-estar social mais amplo. Eles não foram a causa desses problemas, mas ficaram no centro de um conflito que mistura frustração econômica, ansiedade cultural e a falta de um rumo claro na principal potência mundial.
Trump soube capitalizar a incerteza e a inquietação deixadas pelas mudanças econômicas e culturais. Não precisou provar causalidades nem apresentar dados. Bastou ativar um quadro emocional. Sua retórica anti-imigrante transforma o desânimo de comunidades estagnadas em uma certeza simples e poderosa: o indocumentado como explicação e ameaça.
Nesse sentido, o presidente não descobriu o mal-estar, mas o amplificou com precisão. Não persuadiu com argumentos, mas ordenou uma experiência já moldada por temores prévios. Sua força estava em transformar uma inquietação difusa em um relato nítido e mobilizador.
O criminoso e o jardineiro
Também é preciso dizer que, se as pesquisas leem bem o clima social, a cidadania começa a questionar o enfoque mais extremo de seu presidente. Como sintetizou um editorial do Washington Post ao descrever as críticas emergentes, “os estadunidenses veem a diferença entre prender um estuprador e deportar o jardineiro do bairro que paga impostos”.
Em todo caso, é razoável sustentar a necessidade de controles de imigração. Tanto para o funcionamento do Estado de Direito, da coexistência democrática, da transparência econômica e até mesmo por razões éticas. Um país governado pela lei pode enfrentar efeitos corrosivos se optar por ignorar os 14 milhões de imigrantes indocumentados nos EUA em 2023, um número recorde que precisava ser abordado.
A questão de fundo não é controlar ou não, mas como fazê-lo sem tornar um problema real em uma cruzada que fragmenta a sociedade. E essa é a poderosa mensagem que a opinião pública está enviando ao governo republicano.
O meio-termo entre exercer o controle fronteiriço com firmeza, mas não perseguir uma professora em Chicago até as dependências de sua escola. Por isso, é provável que os cidadãos rejeitem o anúncio de Trump de “interromper permanentemente a imigração de todos os países do Terceiro Mundo”. A declaração do presidente foi uma resposta ao recente ataque contra dois membros da Guarda Nacional — um morto e o outro ferido — por um ex-soldado afegão e ex-colaborador da CIA, que agora vive exilado nos EUA.
O público parece estar começando a dizer que proteger a fronteira não exige desconsiderar a dignidade daqueles que já são parte integrante do tecido econômico e social do país.
São jardineiros e encanadores, trabalhadores agrícolas e da construção civil. São quem mantêm hotéis, cozinhas e serviços, que arrumam as camas e limpam os quartos. A retórica política que justifica as ações anti-imigração pode ignorar isso, mas a economia e o cotidiano nos lembram disso todos os dias.
*Texto originalmente publicado em Diálogo Político
Tradução automática revisada por Isabel Lima










