Em uma entrevista polêmica ao jornal espanhol El País, em 7 de junho, o ex-presidente do Equador, Rafael Correa, insistiu que retornará ao país para promulgar uma nova Constituição, reorganizar o Estado e anular seus julgamentos. Ele afirmou que tem o capital eleitoral para regressar e se tornar presidente. Poucos dias depois, na terça-feira, 13 de junho, a presidenciável pelo correísmo, Luisa González, registrou sua candidatura política em meio a reivindicações de um “turno único”, em referência a que vencerá a eleição sem passar pelo segundo turno.
Todos os institutos de pesquisa concordam que o correísmo conta com um apoio de cerca de 25%, o que alguns chamam de “voto duro do correísmo”. Paradoxalmente, os mesmos institutos de pesquisa concordam que as margens de indecisão, a escassas duas semanas para as eleições no Equador, após a dissolução do Congresso pelo presidente Lasso, são consistentemente de 70%. Como pode haver um voto disciplinado com uma margem tão pequena de eleitores decididos?
Nesse jogo eleitoral, há várias manobras de persuasão que, postas em preto e branco, não são o que dizem ser. De acordo com estudos, muitos eleitores gostam de ganhar e, muitas vezes, apostam no vencedor das pesquisas, gerando assim um efeito de falso consenso. Mas o que acontece quando essas pesquisas não refletem a realidade?
Para Christopher J. Anderson, da London School of Economics, e Andrew J. Lotempio, da Binghamton University, em seu estudo sobre a relação entre vencedores e confiança política, “Winning, Losing and Political Trust in America”, uma votação não é apenas um ato de confiança, mas sim a intenção de confiar que esse alguém vencerá a disputa.
Foi demonstrado que votar no vencedor tem uma influência positiva em outras atitudes políticas, como sentimentos de receptividade ao governo, satisfação com a democracia e disposição das pessoas para se envolverem em ativismo político. Os eleitores favorecem qualquer uma das opções possíveis, com a intenção de se vincular material ou afetivamente à proposta política que esperam ver vencer.
Anderson e Lotempio argumentam que a experiência de ganhar ou perder influencia a forma como os eleitores percebem o sistema político. Ganhar ou perder, e estar na maioria ou na minoria, são conceitos que as pessoas usam para entender o ambiente político e que afetam suas atitudes subsequentes. Inclusive, os eleitores até trocam de candidato quando este não mostra possibilidade de ganhar e esse fenômeno foi chamado de “voto estratégico”.
A diretora do Centro de Estudos de Votação, Eleições e Democracia da Universidade do Novo México, Lonna Rae Atkeson, disse em seu estudo “Sure, I Voted for the Winner! Overreport of the Primary Vote for the Party Nominee in the National Election Studies”, que as pessoas têm maior probabilidade de votar em sua segunda preferência quando percebem que sua primeira opção tem pouca chance de vencer. Esse efeito está particularmente associado à categoria “voto desperdiçado”, ou ao desejo do eleitor de não desperdiçar seu voto.
De acordo com Rae Atkeson, os eleitores têm três opções frente a uma eleição: um favorito, uma segunda opção ou anulação/abstenção. O eleitor sempre espera que seu favorito seja o vencedor. Na certeza de que o favorito não vencerá, o eleitor muda sua decisão para aquele que ele acredita ser o vencedor, que passa a ser sua segunda opção. Se as duas primeiras possibilidades não ocorrerem, o eleitor se abstém de votar ou anula seu voto.
Para as especialistas Vicki G. Morwitz e Carol Pluzinski, da Universidade de Nova York, a exposição dos eleitores às pesquisas modifica as preferências dos candidatos. Alguns estudos inclusive denominam esse efeito de influência da opinião majoritária como o “efeito bandwagon” ou “efeito de carroça”.
Um sistema individual de ideias encontra um estado de consistência cognitiva quando o eleitor médio e o eleitor das pesquisas estão de acordo. Essa coincidência é chamada de erro de falso consenso. As pesquisas fornecem aos eleitores informações sobre como o eleitorado se sente o eleitorado em relação a quem deveria ser o presidente e, portanto, funcionam como uma restrição da realidade às expectativas dos eleitores sobre o resultado da eleição. Então, quando um eleitor é exposto a essas informações e se convence de que seu candidato não vencerá, ele pode mudar de ideia e apostar no “cavalo vencedor” da disputa.
Entretanto, muitos eleitores superestimam a probabilidade de vitória de seu candidato preferido. Por exemplo, de acordo com Morwitz e Pluzinski, durante a semana que antecedeu a eleição presidencial estadunidense em 1992, 68,9% dos partidários de George Bush acreditavam falsamente que outros eleitores compartilhavam seu apoio ao candidato, o que gerava um padrão de falso consenso que se refletiu nas pesquisas. Mas Bill Clinton venceu a eleição.
Quando os eleitores estão em um estado de dissonância ou indecisão antes de serem expostos às pesquisas e quando as pesquisas confirmam as expectativas sobre o resultado da eleição, muitos eleitores mudam suas preferências para serem consistentes tanto com suas expectativas quanto com as informações das pesquisas. É nesse ponto que se pode produzir a manipulação.
Quando as pesquisas são fornecidas aos eleitores cujas atitudes em relação aos candidatos são mutáveis, podem alterar suas atitudes e modificar o comportamento da votação. Dependendo da preferência e das expectativas, Morwitz e Pluzinski argumentam que as pesquisas podem servir para reforçar as expectativas e atitudes existentes, alterar as expectativas dos eleitores sobre quem vencerá a eleição ou causar mudanças nas atitudes em relação aos candidatos.
O Correísmo tem 25% dos votos duros contra 70% de eleitores indecisos? Não, não tem. Se se compara 25% de preferência com uma margem de decisão de 30%, o proporcional seria de 7,5% de “voto fiel”. Pelo contrário, os 20% ou 25% atribuídos a ele poderiam ser, na verdade, seu teto eleitoral, se compararmos esse número com os resultados das mais recentes eleições municipais no Equador.
Os números são mais categóricos do que as narrativas na política. Insistir no falso consenso de um voto duro é a estratégia daqueles que querem se mostrar vencedores. Funcionará essa manobra narrativa?
Autor
Cientista político e advogado. Professor da Universidade das Américas (Quito). Mestre em Ciência Política e Governo por FLACSO-Equador.