A política é a gestão das expectativas, mas, sobretudo, a administração das emoções coletivas. As eleições legislativas na Argentina tiveram um resultado que, à primeira vista, parece uma contradição flagrante: La Libertad Avanza (LLA) obteve uma vitória contundente com 40,7% dos votos em nível nacional, impondo-se em 15 das 24 províncias, incluindo os cinco distritos eleitorais de maior peso (Buenos Aires, CABA, Córdoba, Santa Fe e Mendoza). No entanto, uma análise de escuta social de 15.000.500 interações na semana anterior à eleição revela uma atmosfera social dominada pela frustração. Após filtrar as menções com clara carga emocional, 71,4% delas eram de “raiva”.
Como explicar esse paradoxo? A resposta não está na negação de um dos dois dados, mas em sua integração. O partido governista não venceu por mudar o humor social, mas por demonstrar ser o único ator capaz de representar e capitalizar as diferentes facetas dessa raiva.
A arquitetura da fratura: os dois eleitorados digitais
A análise do conjunto de dados não mostrou um debate, mas dois universos paralelos que explicam a composição dos 40,7% obtidos:
O primeiro é o Arquipélago da Convicção (19,4% de “Alegria”). Esse segmento, embora minoritário na conversa total, é o núcleo duro do governo. Suas palavras-chave (obrigado, força, vamos, liberdade) denotam um voto identitário e épico. É uma base eleitoral que não está avaliando a gestão conjuntural, mas defendendo o projeto cultural. Esses 19% são a “base” leal que a LLA consolidou como sua.
O segundo é o Continente da “Raiva” (71,4% dominante). Aqui reside a chave da eleição. A “Raiva” não é um bloco monolítico. A análise semântica desse cluster revela uma frustração sistêmica. As palavras-chave (país, gente, merda) se misturam não só com críticas a @jmilei, mas também com uma profunda rejeição aos atores tradicionais: macrismo e kirchnerismo aparecem com destaque.
Essa “Raiva” é, portanto, o “voto de protesto” de 2023 que, dois anos depois, continua ativo. É a fadiga cívica diante das consequências da gestão, mas também a memória do motivo pelo qual se votou por uma mudança disruptiva.
A batalha pela “raiva”: como se construíram os 40,7%
A recente eleição foi uma disputa pela propriedade desses 71% de “raiva”. Os resultados provisórios nos mostram como ela se dividiu. A posição (Fuerza Patria, ~34%) conseguiu capturar uma parte significativa dessa raiva, a mais crítica com a gestão atual, mas foi incapaz de aglutinar tudo. Falhou em se apresentar como uma alternativa viável para o eleitor irritado com o sistema como um todo. Enquanto a vitória da LLA se explica por uma soma de forças. Seus 40,7% são a soma dos 19% que representam o voto da “alegria” (sua base leal e identitária) e os 21% do voto da “raiva” (os “pragmáticos revoltados”).
O governo venceu porque conseguiu convencer uma parte majoritária desse eleitorado frustrado de que, apesar das dificuldades da gestão, a alternativa (o peronismo e seus aliados) continuava sendo a causa original dessa raiva. LLA revalidou seu mandato ao continuar sendo percebido como o instrumento de punição contra a “casta”, embora agora ele próprio faça parte do poder.
Um mandato condicionado
Esta ampla vitória não é, de forma alguma, um “cheque em branco”. Não é uma aprovação da gestão, mas uma renovação do mandato de ruptura. O governo não venceu o mau humor social; simplesmente demonstrou que a oposição tradicional também não consegue capitalizar isso.
O governo ganhou a guerra das narrativas ao conseguir que a “raiva” pela gestão (o “voto consequência”) fosse menor do que a “raiva” contra o establishment (o “voto de protesto”). Mas 71% da frustração continua latente. O governo venceu a eleição, mas o plebiscito sobre o humor social continua em aberto e será o verdadeiro desafio para 2027.
Tradução automática revisada por Isabel Lima










