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Uma oportunidade estratégica: a reta final do acordo do Mercosul com a União Europeia

O Acordo entre o Mercosul e a UE entra em sua reta final. Entre 16 e 19 de dezembro, os Estados europeus votarão em Bruxelas com as novas salvaguardas reforçadas e, em seguida, prevê-se a aprovação no Conselho da União Europeia por maioria qualificada, apesar da oposição de França e Polônia. Se isso se concretizar, a assinatura oficial será realizada em 20 de dezembro na Cúpula do Mercosul em Foz do Iguaçu; e, finalmente, no primeiro trimestre de 2026, o Parlamento Europeu deverá ratificá-lo. Por sua vez, os países do Mercosul — exceto Bolívia e Venezuela, que não fazem parte da negociação — deverão enviá-lo aos seus respectivos parlamentos e, à medida que cada Estado o ratificar, o acordo poderá ser ativado. Mas quais serão os benefícios do acordo para os países sul-americanos?

O primeiro benefício para o Mercosul é claro: maior acesso e competitividade nas exportações. O acordo reduzirá significativamente as tarifas europeias para produtos agroindustriais, alimentos processados, carnes, frutas, óleos, café, etanol e biocombustíveis. Muitas dessas tarifas chegarão a zero, o que permitirá uma expansão substancial das exportações de países que já possuem vantagens comparativas consolidadas. Os consumidores europeus exigem produtos de qualidade, rastreáveis e sustentáveis, e é aí que os produtores sul-americanos podem se posicionar com força.

Nesse contexto, o reforço dos controles sanitários e fitossanitários não deve ser interpretado como um obstáculo intransponível. A agricultura sul-americana tem demonstrado uma notável capacidade de adaptação tecnológica, e esses requisitos podem funcionar como um estímulo para melhorar os padrões e os sistemas de rastreabilidade. Brasil, Argentina e Uruguai, entre outros, já incorporaram agricultura de precisão, manejo integrado de pragas e tecnologias de baixa emissão. Cumprir as exigências europeias não só abrirá portas comerciais, mas também fortalecerá a reputação da região em matéria de sustentabilidade e qualidade alimentar. A diversificação dos destinos de exportação é fundamental em um contexto global marcado por tensões geopolíticas e interrupções logísticas.

O segundo aspecto benéfico é o impulso que o acordo pode dar à competitividade industrial dos países do Mercosul. Embora alguns setores industriais temam que a abertura para a Europa gere pressões competitivas, o acordo estabelece cronogramas extensos de redução de tarifas que evitam grandes impactos. Este período de transição constitui uma oportunidade para modernizar processos produtivos, incorporar novas tecnologias e atrair investimentos europeus interessados em aproveitar as vantagens energéticas, logísticas e de recursos naturais da região.

As indústrias automotiva, química, farmacêutica, metalúrgica e de bens de capital podem ser revitalizadas pela chegada de investimentos voltados para a integração de cadeias de valor transnacionais. A Europa precisa de fornecedores confiáveis e mercados com estabilidade macroeconômica e regulatória. Se o Mercosul conseguir consolidar um clima de negócios mais previsível, o acordo pode se tornar um motor de investimento estrangeiro direto que promova empregos qualificados e transferência de tecnologia.

O terceiro benefício — e talvez um dos menos visíveis no debate público — é a modernização institucional que o acordo exige. A harmonização com os padrões europeus implica melhorias em áreas como normas técnicas, propriedade intelectual, comércio digital, logística, transparência regulatória e compras públicas. Essas mudanças não são meros requisitos formais: elas podem gerar uma melhoria real no funcionamento do Mercosul, reduzindo a fragmentação normativa interna e diminuindo os custos de fazer negócios. A estabilidade e a previsibilidade proporcionadas pelo alinhamento regulatório são um ativo central para qualquer estratégia de desenvolvimento de longo prazo.

Um quarto ponto relevante é o reposicionamento geopolítico do Mercosul. Nas últimas décadas, o bloco sul-americano ficou para trás, limitando seu poder de influência. O acordo com a União Europeia permite quebrar esse impasse e enviar ao resto do mundo um sinal de abertura e vontade de integração. Para os países do bloco, é uma forma de se inserir em um sistema comercial que está se reconfigurando em alta velocidade e onde ficar à margem implica perder oportunidades irreversíveis.

Nesse contexto, a cláusula de entrada em vigor bilateral introduz um dinamismo inovador dentro do Mercosul. Não será mais necessário que todos os países avancem no mesmo ritmo. Cada Estado poderá ativar a parte comercial assim que seu parlamento ratificá-la. Isso evita que as dificuldades políticas internas de um país paralisem o conjunto e, ao mesmo tempo, incentiva cada governo a acelerar seus processos internos para não ficar para trás em relação aos seus próprios parceiros.

Um quinto benefício aparece na agenda ambiental. Embora alguns críticos apontem que as exigências europeias são demasiado rigorosas, estas podem constituir uma vantagem estratégica. Os mercados internacionais caminham rapidamente para regulamentações ambientais mais rigorosas, e os países que se adaptarem primeiro estarão em melhor posição. O Mercosul poderia demonstrar liderança regional mostrando que a sua produção consegue cumprir padrões exigentes. Isto também abriria portas ao financiamento verde e a projetos de inovação ligados à bioeconomia, às energias renováveis ​​e à gestão sustentável dos recursos naturais.

O acordo pode ainda contribuir para melhorar a coesão política interna do Mercosul. Os últimos anos têm sido marcados por tensões entre os governos relativamente à abertura externa, à flexibilidade do bloco e à coordenação das políticas internas. O fato de todos os presidentes terem confirmado a sua presença na assinatura, a 20 de dezembro, é um sinal de que ainda é possível construir um consenso mínimo. A integração externa, se gerida adequadamente, pode tornar-se um ponto de unidade em vez de um conflito.

Por fim, o acordo oferece uma oportunidade única para revitalizar a integração intrarregional, que perdeu ímpeto nas últimas décadas. O acesso preferencial à UE pode incentivar a coordenação produtiva entre os próprios países do Mercosul, especialmente em setores onde existe complementaridade natural. A indústria automotiva entre Argentina e Brasil, a cadeia de suprimentos de carne e produtos agrícolas entre Uruguai e Paraguai, e a logística fluvial compartilhada são exemplos de como a integração regional pode ser fortalecida se a demanda europeia atuar como um fator externo de incentivo.

Em suma, embora ainda faltem etapas formais decisivas — a votação europeia, a assinatura em Foz do Iguaçu e a ratificação parlamentar em 2026 — os benefícios potenciais para o Mercosul são significativos demais para serem ignorados. O acordo não está isento de desafios, mas oferece uma plataforma para a modernização econômica, institucional e geopolítica que pode definir o lugar da região nas próximas décadas. Em um cenário global reconfigurado, o Mercosul precisa de decisões estratégicas que o projetem para o futuro. Este acordo, se for finalmente concluído, é uma delas.

Tradução automática revisada por Isabel Lima

Autor

Doctoranda en Ciencia Política en el Instituto de Estudos Sociais e Políticos de la Univ. do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ). Magíster en Ciencia Política por la Univ. Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

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