Uma região, todas as vozes

L21

|

|

Leer en

O mundo deve tomar nota da política do Brasil em relação aos refugiados

O modelo é promissor para a situação dos refugiados nas Américas e em todo o mundo, onde os doadores cansados e os anfitriões sitiados procuram marginalizar os refugiados.

Os Estados Unidos estão se preparando para que o novo governo Trump mude drasticamente suas políticas em relação a migrantes e refugiados. Se até mesmo uma fração do que foi proposto – incluindo cortes drásticos no acesso a asilo, deportações em massa e possível internação de vários grupos de migrantes – for levado a cabo, um grande número de refugiados e migrantes nos Estados Unidos estará em risco. Essas políticas, sem dúvida, terão efeitos em cascata em toda a região. Agora, mais do que nunca, os Estados precisam consolidar leis e políticas eficazes que protejam os direitos dos refugiados. A resposta do Brasil aos refugiados venezuelanos é um exemplo que deve ser mantido e copiado.

O Brasil abriga um grande número de refugiados e migrantes da Venezuela e pode ter mais chegadas como resultado da recente crise eleitoral na Venezuela. O modelo brasileiro de resposta à migração venezuelana oferece lições importantes para outros países do hemisfério. Ao contrário de muitos outros países que estabelecem políticas restritivas destinadas a manter os migrantes fora do país, o Brasil tem mantido uma política de portas abertas desde 2017, facilitando a recepção de migrantes em cidades fronteiriças e permitindo sua regularização e, no caso de alguns, a realocação para outras partes do país.

Em vez de forçar as pessoas deslocadas a permanecerem nas áreas fronteiriças por onde ingressam (que geralmente são subdesenvolvidas e carecem de recursos e infraestrutura para responder), o Brasil criou uma estratégia em seu programa Operação Acolhida para realocar migrantes e refugiados venezuelanos em partes do país onde possam trabalhar e reconstruir suas vidas. Isso significa que é mais provável que esses refugiados encontrem trabalho, se sustentem e contribuam para suas economias locais. De fato, a política de portas abertas do Brasil permitiu que 98% dos cidadãos venezuelanos tivessem status migratório regular ou garantias de proteção internacional. Acima de tudo, a abordagem do Brasil garantiu uma migração mais ordenada, com menos riscos para migrantes e refugiados.

O Brasil deveria continuar, ampliar e melhorar esse programa, e o resto do mundo deveria tomar nota. Os países que abrigam refugiados podem aprender com essa abordagem e realizar uma opção “ganha-ganha” que beneficia tanto os refugiados quanto as comunidades anfitriãs por meio da inclusão econômica das pessoas deslocadas.

Dos cerca de 7,7 milhões de venezuelanos que fugiram nos últimos anos, quase meio milhão buscou refúgio no Brasil. Eles fugiram da instabilidade política e econômica generalizada, da corrupção, da perseguição e do colapso institucional. Dissidentes políticos foram presos e sofreram violações generalizadas de seus direitos, e muitas famílias não têm acesso a alimentos, medicamentos ou educação adequados. Dos que vão para o Brasil, a maioria entra pelo norte do estado de Roraima, uma região isolada aninhada na Amazônia. Como acontece com a maioria das áreas de acolhimento de refugiados, as comunidades menos capazes de responder e ajudar os migrantes são, em geral, as que recebem o maior número de pessoas. De fato, Roraima está entre as regiões mais pobres do Brasil.

Embora muitos países que acolhem refugiados construam campos fechados que restringem a liberdade de movimento e o direito ao trabalho dos refugiados, o Brasil tomou a decisão incomum e bem-vinda de realocar alguns refugiados e migrantes venezuelanos para outras cidades no Brasil, onde eles podem ter uma rede de contatos e onde há mais empregos. Essa parte da Operação Acolhida, conhecida como “programa de internalização”, aliviou parte da pressão sobre Roraima e reduziu as tensões com a comunidade local.

O programa provou ser bem-sucedido. No total, cerca de um quarto da população venezuelana no Brasil foi reassentada, muitos em parceria com atores do setor privado em mais de 930 cidades em todo o país. Cerca de dois terços dos venezuelanos sob a Operação Acolhida conseguiram se reunir com amigos ou parentes que podem oferecer acomodação e apoio em outras partes do país. Cerca de 12% dos migrantes são realocados por meio da modalidade institucional, em que são transferidos de abrigos em Roraima para outros abrigos nas cidades de destino, coordenados por órgãos públicos ou ONGs parceiras. Outros 15,2% dos beneficiários do programa são reassentados por oportunidades de emprego. Nesses casos, as empresas parceiras oferecem empregos e apoio para o transporte até o local de contratação.

A Operação Acolhida garante que as empresas sejam examinadas para evitar a exploração laboral, juntamente com o apoio social por até três meses, tanto das empresas quanto das agências parceiras da ONU e das organizações da sociedade civil. Os participantes também recebem documentação (incluindo uma carteira de trabalho nacional e registro no Cadastro de Pessoas Físicas) e vacinas.

É verdade que nem todos os refugiados e migrantes querem ser reassentados. Alguns optam por ficar em Roraima, talvez com a esperança de voltar para casa ou ficar nas proximidades para verificar a propriedade ou os entes queridos que ainda estão na Venezuela. Entretanto, a presença deles também significou crescimento para essa economia local.

No entanto, há espaço para melhorias na Operação Acolhida. Os refugiados venezuelanos que chegam ao Brasil enfrentam uma série de riscos e podem se encontrar em situações vulneráveis. O programa precisa de mais salvaguardas para garantir seus direitos e reduzir o potencial de exploração. Por exemplo, é necessário aumentar o monitoramento do tratamento em todos os estágios, especialmente porque o pessoal militar que realiza a Operação Acolhida pode ter treinamento limitado em direitos humanos e humanitários. As autoridades também devem implementar uma maior segurança nos abrigos e um sistema de controle de acesso aos abrigos. As autoridades também devem implementar maior segurança nos abrigos e uma avaliação abrangente dos parceiros envolvidos na estratégia de reassentamento, incluindo monitoramento e avaliações pós-relocação dos beneficiários para outras cidades do país.

No entanto, em geral, outros países que hospedam refugiados devem tomar nota. O Brasil tem um modelo que pode reduzir a pressão sobre as comunidades anfitriãs e beneficiar o restante do país com as habilidades, o conhecimento e as contribuições dos refugiados e migrantes. Em vez de ver os refugiados e os migrantes como um fardo ou uma ameaça, o Brasil está reconhecendo que a defesa dos direitos dos refugiados de acordo com as obrigações nacionais e internacionais pode, na verdade, beneficiar o país como um todo, bem como os migrantes e os refugiados.

O modelo é promissor para a situação dos refugiados nas Américas e em todo o mundo, onde os doadores cansados e os anfitriões sitiados procuram marginalizar os refugiados, negando-lhes direitos e até mesmo mandando-os de volta para lugares perigosos. Um modelo no qual os refugiados possam ter acesso a oportunidades de emprego e a toda a gama de direitos deve ser o futuro da resposta aos refugiados.

Tradução automática revisada por Giulia Gaspar

Autor

Otros artículos del autor

Doutor em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É fundador e presidente da ONG Venezuela Global, com sede no Rio de Janeiro, Brasil.

Otros artículos del autor

Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Oxford. Pesquisadora Sênior na Refugees International, onde lidera o trabalho de acesso ao mercado de trabalho da organização.

spot_img

Postagens relacionadas

Você quer colaborar com L21?

Acreditamos no livre fluxo de informações

Republicar nossos artigos gratuitamente, impressos ou digitalmente, sob a licença Creative Commons.

Marcado em:

COMPARTILHE
ESTE ARTIGO

Mais artigos relacionados