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A continuidade na política monetária e as dificuldades de crescimento na América Latina

Na América Latina, executar uma política monetária restritiva como meio eficaz e pertinente para controlar e reduzir a inflação é uma decisão à qual não se opõem os conselhos de governadores ou diretorias dos bancos centrais. A mesma opinião é compartilhada pelos chefes dos organismos financeiros multilaterais, pelos membros dos conselhos das agências de classificação de crédito e por grande parte do setor bancário transnacional com sede nos Estados Unidos. Nos principais círculos acadêmicos do mainstream, argumenta-se que o recurso à política monetária restritiva é o único caminho para controlar a alta inflação.

Todos esses setores argumentam que é imprescindível observar resultados em termos de menor resiliência nos mercados laborais para considerar a possibilidade de mudar as decisões e prosseguir com uma redução sistemática das taxas de juros de referência. Jerome Powell, Presidente do Conselho Diretivo da Reserva Federal dos Estados Unidos, destacou em seu discurso na reunião dos banqueiros centrais de Jackson Hole, em agosto deste ano, que o forte crescimento e o ressurgimento da força do mercado laboral podem exigir uma resposta mais contundente em termos de aumento nas taxas de juros de referência.

No decorrer do segundo semestre de 2021, as maiores economias da América Latina deram início a uma política de incremento nas taxas de juros de referência, inclusive antes que a Reserva Federal dos Estados Unidos fizesse o mesmo. No Brasil, em maio de 2021, a taxa de juros de referência foi elevada de 2,75% para 3,5%. Depois disso, os aumentos continuaram até atingir 13,75% em agosto de 2022. Durante todo o período, argumentou-se que essa era a medida necessária para combater a inflação. Na Argentina, o desarranjo monetário financeiro é total há algum tempo, com a adicional instabilidade cambiária e a incapacidade de cumprir os compromissos da dívida externa contraídos durante o governo Macri com o FMI. No México, na Colômbia e no Chile, os aumentos começaram a a aparecer no segundo semestre de 2021, com a Colômbia e o Chile acumulando um aumento de mais de 10 pontos na taxa de juros de referência em pouco mais de um ano.

Até o momento, embora desde o segundo semestre de 2022 tenha havido uma redução no aumento do índice de preços ao consumidor, que se aprofundou no primeiro semestre deste ano, apenas o Banco Central do Chile fez uma redução significativa, de 175 pontos-base de julho a setembro de 2023, na taxa de juros de referência. No Brasil, na Colômbia e no México, as taxas de juros de referência permanecem em dois dígitos, seguindo as diretrizes dos bancos centrais dos Estados Unidos, da Inglaterra e da zona do euro, entre outros países desenvolvidos.

No Brasil, o governo federal vem criticando há meses a política monetária do banco central, sem conseguir uma mudança significativa. Em maio deste ano, quando o comitê encarregado de definir a política monetária em nome do Banco Central do Brasil (COPOM) manteve inalterada a taxa de juros de referência, às críticas do governo foram somadas às de organizações sindicais (Força Sindical e CUT) e empresariais (CNI). O COPOM concordou com uma redução de 50 pontos-base em sua reunião de agosto; no entanto, ao justificar sua decisão, apontou que ainda há núcleos de inflação ainda elevados e uma resiliência nos mercados de trabalho de vários países, de modo que não há garantia para avançar nesta direção. Ele reconheceu que, no país, o conjunto de indicadores econômicos é consistente com uma desaceleração, o que não foge às suas estimativas.

Na Colômbia, a diretoria do banco central decide manter a taxa de juros de referência no mesmo nível, sem levar em consideração os argumentos do governo federal, da associação de empresas e da própria associação de bancos para que procedam de outra forma. De acordo com esses atores, a redução da taxa de juros de referência é uma medida necessária para permitir o crescimento da economia, enquanto os custos financeiros atuais pressionam as famílias e tornam inviáveis os investimentos para um grande número de empresas.

Na reunião dos banqueiros centrais de Jackson Hole, Powell também observou que os dados dos meses de junho e julho de redução da inflação subjacente são bem-vindos, mas dois meses de bons dados são apenas o começo. A ênfase continua sendo, sem explicação, em atingir 2%, o que, de acordo com essa leitura, deve incluir o aumento nos preços do que é medido pela inflação subjacente. Powell apresenta o ponto central que orienta as decisões de política monetária quando afirma que é necessário um período de crescimento abaixo da tendência, bem como algum enfraquecimento das condições do mercado de trabalho, para que a inflação volte a baixar para 2% de forma sustentável. A diretora executiva do Banco Central Europeu tem a mesma opinião e, de acordo com essa visão, em sua reunião de quinta-feira, 14 de setembro, o conselho do banco central decidiu pelo décimo aumento consecutivo na taxa de juros de referência. O ato poderia empurrar várias economias da região ainda mais para a recessão ou aprofundá-la naquelas que estão indo nessa direção, como a Alemanha, que registrou dois trimestres consecutivos de crescimento negativo este ano.

Tudo indica que as condições mais fracas do mercado laboral são acompanhadas por um crescimento mais lento ou recessão. Além disso, o aumento das taxas de juros traz problemas para as famílias e os atores sociais que dependem do crédito bancário. Mas também é um desenvolvimento positivo para todos aqueles que conseguem fazer aplicações financeiras sem que isso represente um ônus para suas despesas. Para um reduzido grupo de grandes credores financeiros, o critério do nível da taxa de juros real não é a referência pertinente. Para eles, é a taxa de juros pura e simples, pois mantêm seus recursos nos circuitos financeiros sem precisar considerar os retornos ao mundo da produção. Para este pequeno segmento da população, o presente é um tempo de bonança. Para os governos da América Latina que tentam promover mudanças para reduzir a desigualdade social, por outro lado, é um momento de consideráveis dificuldades, um período de privações.

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Professor e Pesquisador Sênior no Departamento de Economia da Univ. Autônoma Metropolitana (UAM), Unidade Iztapalapa. Coordenador do Prog. de Pesquisa Universitária sobre Integração nas Américas. Doutorado em Estudos Latino-Americanos pela UNAM.

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