Em uma reviravolta interessante no cenário eleitoral diante as próximas eleições municipais no Chile, as candidatas mulheres independentes parecem estar ganhando terreno frente aos perfis tradicionais, mesmo que não residam nas comunas que buscam representar. Um estudo recente da Datavoz (GPS Ciudadano) revela que os eleitores tendem a se inclinar para candidatas que escapam da máquina partidária e que não se preocupam tanto com sua raíz territorial.
Essa descoberta desafia a noção de que a proximidade geográfica é essencial na eleição de autoridades locais. Tradicionalmente, acredita-se que os eleitores preferem candidatos locais, com vínculos territoriais e conhecimento próximo das questões locais. Entretanto, os resultados da análise do Datavoz sugerem que os eleitores estão reavaliando suas prioridades, dando mais importância à independência e às características pessoais das candidatas do que ao seu local de residência.
As candidatas souberam aproveitar desse contexto. Sua imagem, associada a valores como honestidade, trabalho árduo e menor vinculação com os vícios da política tradicional, está repercutindo com força em um eleitorado cada vez mais desencantado com os partidos políticos. Nesse contexto, a independência partidária surgiu como um atributo que dá confiança em um sistema político percebido por muitos cidadãos como opaco e alheio de seus interesses reais.
O estudo destaca um dado revelador: as candidatas que não vivem na comuna para a qual se candidatam não só não são punidas, como também são preferidas. Isso sugere uma mudança significativa na forma como os eleitores entendem a representação local. A conectividade digital, a visibilidade midiática e uma maior consciência sobre os problemas nacionais e locais levaram os cidadãos a valorizar outros aspectos, como a capacidade de gestão, o histórico e as propostas, além do fato da eleita ser vizinha da comuna.
Outro ponto relevante que emerge do estudo é a preferência por candidatas sem filiação política e com menos de 45 anos de idade, além do fato de que os eleitores parecem estar inclinados àqueles que não têm experiência anterior em cargos como prefeitos ou vereadores. Esse aspecto reforça a demanda por renovação e liderança jovem fora das estruturas políticas tradicionais. Embora existam setores menos interessados na política que valorizam a experiência local, em termos gerais, o apoio às mulheres independentes reflete a busca por uma mudança profunda na liderança municipal.
Esse fenômeno convida a uma reflexão mais profunda sobre o estado da democracia local no Chile. As eleições municipais, que historicamente são vistas como menos politizadas do que as nacionais, estão começando a refletir tendências que podem antecipar uma mudança mais ampla na política chilena. A preferência por candidatas independentes e não locais pode ser um sinal de que os eleitores buscam novas lideranças que rompam com estruturas antigas, priorizando a inovação e o frescor em detrimento do legado e da tradição.
É interessante notar que esse fenômeno não é exclusivo do Chile. Em vários países da América Latina observa-se tendências similares. Os eleitores da região estão optando cada vez mais por candidatos jovens e independentes, desencantados com os partidos tradicionais e com a dinâmica política estabelecida. Como no Chile, o uso de plataformas digitais e a maior conscientização sobre os problemas locais e nacionais permitiram que candidatos sem presença física constante nos territórios se conectassem com os eleitores através de propostas novas e comprometidas.
Em toda a região, está surgindo uma demanda por lideranças que rompam com as velhas estruturas e proponham soluções novas e próximas aos cidadãos. Essa tendência pode consolidar-se na América Latina, onde os eleitores buscam uma renovação política que ressoe não só a nível local, mas também regional, marcando uma mudança mais profunda na política latino-americana.
Resta saber se esse respaldo às mulheres independentes que não residem nas comunas onde concorrem no Chile se consolidará como uma tendência de longo prazo ou se é simplesmente uma resposta ao clima político atual. De qualquer forma, a mensagem do eleitorado é clara: estão abertos a novas opções, na esperança de que essas eleições tragam as mudanças profundas que as comunidades esperam.
Autor
Mestre em Estatística pela PUC Chile. Sócia fundadora da DATAVOZ, uma agência de pesquisa de mercado e opinião pública no Chile. Membro do Conselho de Administração de WAPOR Latin America.
Mestre em políticas públicas pela Universidade Diego Portales e diretor da DATAVOZ, agência de opinião pública e pesquisa de mercado do Chile.