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“Operação especial na Ucrânia”, desinformação e censura na América Latina

Os canais do YouTube e os perfis do Facebook dos meios de comunicação financiados pela Rússia, como SputnikNews e Russia Today (RT), foram bloqueados na Europa e nos Estados Unidos por disseminar informação considerada falsa sobre a atual guerra contra a Ucrânia. Isto também aconteceu na América Latina com todos os canais Sputnik Mundo e RT en Español, incluindo Ahí les va, o mais popular na região, liderado pela jornalista/youtuber Inna Afinogenova. A razão apresentada por essas plataformas para encerrar as contas foi o aumento do conteúdo manipulado, como montagens, imagens e vídeos falsos que favorecem a Rússia e difamam a Ucrânia e seus aliados. 

Desde a época da Guerra Fria, a Rússia tem sido acusada em repetidas ocasiões de executar operações de informação com o objetivo de manipular a opinião pública. Com a revolução da informação, a natureza e a difusão do poder dos Estados têm mudado, convertendo o ciberespaço em um novo domínio operacional não convencional para as guerras, pois sua acessibilidade facilita a existência de uma multiplicidade de atores e ações.

Neste novo terreno de combate, é comum encontrar interferências eleitorais, desinformação e notícias falsas, ciberataques, ataques com drones e influência financeira como modalidades de ataque, todas elas cunhadas sob o nome de ameaça ou guerra híbrida, da informação ou doutrina de Gerasimov

Com respeito à modalidade de deformação e notícias falsas, as narrativas existentes na região à modalidade de notícias falsas têm sua principal origem nas traduções de conteúdos originais em ucraniano, russo e inglês. O fact-check espanhol Newtral e latinoamericano AFP Factual  verificou até o momento um total de mais de 80 fraudes – conteúdo falso disseminado de forma coordenada e massiva com o objetivo de convertê-lo em verdade – em redes sociais como Twitter, Facebook, YouTube e TikTok sobre o conflito.

Tais verificações vão de retransmissões falsas da CNN ao vivo até fotografias de protestos descontextualizadas ou inexistentes que buscam particularmente desacreditar as ações políticas e militares ucranianas.   

As redes sociais e a mídia russa em espanhol

A conta do TikTok do meio de comunicação Sputnik Mundo tem cerca de 62,6k seguidores. Desde o início da “operação especial da Rússia na Ucrânia”, a conta foi bloqueada durante seis dias e foram eliminados 24 vídeos por violar as normas da comunidade, de acordo com o apresentador do meio de comunicação.

Uma das causas foi a publicação de um vídeo em 27 de fevereiro sugerindo que o presidente ucraniano Volodymir Zelensky havia escapado da capital de Kiev para Lviv. Isto foi originalmente mencionado pelo presidente da Duma Estatal russa (Câmara Baixa da Assembleia), Vyacheslav Volodin, e difundido por outros meios de comunicação respaldados pelo Estado russo como Tass (Russian News Agency). Entretanto, este conteúdo era falso e o Sputnik nunca retificou esta informação, segundo uma investigação do centro de pensamento Institute for Strategic Dialogue (ISD)

De acordo com a organização estadunidense DFRLab, na rede social Twitter, além das contas oficiais do RT en Español e Sputnik Mundo, as contas das embaixadas russas na Argentina, Cuba, Equador, Espanha, Guatemala, México, Panamá, Peru, Venezuela e Uruguai foram as que mais têm compartilhado as publicações criadas originalmente por esses veículos. Este tipo de conteúdo tende a justificar a operação na Ucrânia e afirma a necessidade de desnazificar e desmilitarizar este país para proteger o povo russo, assim como para desmascarar as verdadeiras intenções da OTAN e dos Estados Unidos.  

Diferente do que aconteceu na conta do Twitter em inglês, onde houve uma tendência regional com a hashtag #IStandWithPutin ou #IStandWithRussia no início da guerra (esta tendência foi liderada por contas automatizadas ou bots), nos países de língua espanhola não foi identificada nenhuma tendência semelhante. No Twitter em espanhol, as hashtags #YoEstoyConPutin ou similares são, em sua maioria, tweets usados em 2015 para apoiar a Rússia e suas ações militares na guerra da Síria, e muito pouco relacionados com o atual conflito bélico. E as contas que produziram este conteúdo parecem ser reais e afirmam localizar-se em países como a Venezuela, Nicarágua e, em menor medida, Bolívia. 

A rede social Telegrama, por outro lado, tem sido uma grande aliada para a reprodução da mídia russa na região, já que é uma das poucas plataformas que não os censuraram.

Censura seletiva?

A censura que esses meios de comunicação estão recebendo está sendo questionada, pois as agências de comunicação russas não são as únicas que disseminaram conteúdo desinformativo na região e não o retificaram. O canal mexicano Televisa, por exemplo, publicou – de maneira descuidada – imagens e vídeos de ataques militares afirmando que correspondiam à guerra na Ucrânia, quando, na realidade, eram do conflito árabe-israelense. Isto foi denunciado por Roberto de la Madrid que teve seu canal no YouTube fechado por alguns dias devido à denúncia.

Isto traz à tona que estas plataformas globais estão se convertendo em juízes da verdade. Em alguns casos acertam, e em outros não, uma vez que seus critérios e algoritmos são seletivos, já que em última instância buscam mais a monetização do que a verdade.

Autor

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Professor adjunto da Universidad de la Salle (Bogotá). Mestre em Estudos Internacionais pela Universidad de los Andes. Membro do Programa de Treinamento 360/Digital Sherlocks Training Programme (DFRLab) para combater a desinformação.

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