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Setor público: motosserra ou tesoura?

Os interesses políticos e do setor privado têm usado e abusado do emprego público fora dos propósitos específicos para os quais foram designados.

Um ponto de debate atualmente é sobre os interesses estratégicos e os bens e serviços que devem ser garantidos pelo Estado. Na Argentina, um novo líder/partido chegou à presidência, fora da divisão tradicional entre peronismo e antiperonismo, e em seu governo, a desregulamentação do Estado é uma prioridade, e um ministério foi até mesmo dedicado a isso. Enquanto isso, nos Estados Unidos, o novo governo Trump criou o DOGE (Departamento de Eficiência Governamental), liderado por Elon Musk, e o cargo de “Czar das criptomoedas e da inteligência artificial” é ocupado por David Sacks, outro bilionário e o grande líder da IA. As críticas à tecnocratização do governo, à criação de disrupção na sociedade e à diminuição dos empregos públicos, indo até mesmo contra a lei, vêm de longa data. Mas a verdade é que a IA veio para ficar e é um recurso que pode ser usado para desregulamentar e inovar, tanto no setor estatal quanto no privado.

A razão de ser do funcionário público

Há diferentes classes de funcionários no setor público. Na Espanha, por exemplo, há funcionários públicos de carreira (com estabilidade) e mão de obra contratada (temporária ou eventual para funções menos críticas). Um sistema de concursos públicos busca garantir a idoneidade dos candidatos. A preparação para essas “ competições” gerou um mercado paralelo de academias privadas e nem sempre garante a profissionalização contínua. Em uma grande variedade de áreas, a essencialidade ou necessidade pode ser contestada, como no caso de um assistente técnico de biblioteca.

No Reino Unido, o serviço público combina estabilidade para cargos essenciais com acordos de trabalho mais flexíveis, semelhantes aos do setor privado, em áreas não críticas. A meritocracia e a avaliação de desempenho são enfatizadas. Já no México, os empregos do setor público, como os de professores, podem ser herdados e, no Vietnã, os empregos públicos são até vendidos ou alugados. Na Argentina, pelo menos até que ocorra uma mudança geracional, os direitos adquiridos vinculam o Estado a obrigações que acarretam um alto custo.

A razão de ser da proteção ao funcionário público é garantir os benefícios essenciais do Estado que, por sua natureza, devem ser mantidos independentemente de mudanças políticas, econômicas ou pessoais, altos e baixos comerciais ou circunstâncias excepcionais. As funções consideradas essenciais e que o Estado deve cobrir geralmente incluem três grandes áreas. Uma é a prestação de serviços básicos e universais que cada sociedade definirá, como assistência médica, segurança e defesa e educação. Outra é a justiça: garantir a aplicação das leis e a proteção dos direitos, principalmente por meio do judiciário. E a terceira é aquela que garante o funcionamento da administração pública, mesmo durante crises ou mudanças de governo.

O setor público como ferramenta política

Os interesses políticos e do setor privado têm usado e abusado do emprego público fora dos propósitos específicos para os quais foram designados. O emprego público transitório (cargos de confiança) é usado como uma ferramenta de governança, paralelamente às estruturas fixas e como uma forma de fidelizar lealdades partidárias.

Nos Estados Unidos, por exemplo, há uma clara diferenciação entre funcionários de carreira, com estabilidade em áreas-chave, e funcionários políticos de confiança do governo do momento. Entretanto, a estabilidade laboral, como no setor privado, é menor do que em outros países. Muitas funções são terceirizadas ou delegadas ao setor privado. Além disso, os funcionários públicos são frequentemente submetidos a avaliações periódicas de desempenho, o que melhora sua eficiência.

Na Argentina, o emprego público é visto como uma fonte de emprego garantida além da idoneidade pessoal. É uma ressaca corporativista que também é usada como moeda de troca para pacificar grupos – como sindicatos ou grupos políticos – com o poder de desestabilizar a sociedade. Isso contrasta fortemente com o dinamismo que, embora em teoria, o setor privado deveria ter. Isso se deve, em parte, às proteções sindicais, ao uso de cargos públicos para benefícios políticos, setoriais e pessoais e às proteções legais.

Em muitas províncias argentinas, o emprego público é a principal fonte de emprego formal. O número de funcionários públicos provinciais por mil habitantes cresceu 70% nos últimos 20 anos. Os números refletem uma administração inflada em regiões que, paradoxalmente, contribuem menos para o valor agregado bruto nacional, de acordo com dados da CEPAL e da Mecon (2023).

Nesse contexto, devemos discutir se a manutenção de cargos públicos, além dos críticos e a priori desnecessários, é a melhor maneira de injetar dinheiro e dinamismo nas economias provinciais menos produtivas. Além disso, a redistribuição por meio do emprego público levanta dúvidas sobre sua sustentabilidade e eficácia para a economia. Essa dependência do Estado como empregador reforça o clientelismo político.

Eficiência e transparência versus governabilidade.

A reforma do setor público na Argentina exige não apenas ajustes regulatórios, mas também uma mudança cultural. Não é uma tarefa fácil oferecer alternativas de emprego em um país com mais de 50% de pobreza; primeiro, o setor privado deve ser revigorado. Há também a necessidade de um plano de conversão e de acompanhamento na transição.

No setor público, há muito espaço para eficiência e transparência. Auditorias independentes, digitalização usando tecnologias de criptografia e blockchain, a unificação de tarefas duplicadas e a automação de processos são a chave para desembaraçar o emaranhado de burocracia excessiva e fragmentação administrativa. Dessa forma, as estruturas administrativas em nível nacional, provincial e municipal poderiam ser otimizadas.

Portanto, é necessário definir as funções essenciais e o escopo do Estado e priorizar as áreas em que o emprego público é indispensável. Em minha opinião, uma dessas áreas é aquela que deve garantir o funcionamento dos poderes básicos do Estado e a prestação de serviços essenciais com qualidade e transparência. E a outra é o desenvolvimento dos interesses considerados estratégicos, como os estabelecidos no Preâmbulo de nossa Constituição: “fortalecer a justiça, promover o bem-estar geral e assegurar os benefícios da liberdade”.

Tradução automática revisada por Giulia Gaspar. 

Autor

Bacharel em Ciência Política pela Univ. de Buenos Aires (UBA), com especialização em Relações Internacionais. Diploma da Escola de Governo do INCAP. Analista do Instituto de Segurança Internacional e Assuntos Estratégicos (ISIAE/CARI).

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