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Uma campanha eleitoral atípica em El Salvador

Anúncios televisivos e em redes sociais de candidatos chorando ou dando indiretas a seus oponentes, placas publicitárias iluminadas a ponto de cegar os motoristas, postes de iluminação elétrica forrados com cartazes das bandeiras partidárias e rostos de candidatos, eram algumas das estratégias que costumavam utilizar para fazer campanha eleitoral em El Salvador até 2019. Mas, naquele ano, a estrutura ideológica do país mudou com a vitória de Nayib Bukele com mais de 50% dos votos, causando a ruptura do bipartidarismo tradicional, Dois anos depois, em 2021, o partido político promovido por Bukele, Nuevas Ideas (N), conseguiu conquistar a Assembleia Legislativa, obtendo a maioria dos assentos e tornando-se o partido oficial.

Em 2024, as eleições presidenciais (a cada cinco anos) e legislativas (a cada três anos) se juntam. As coisas mudaram e, às vésperas das eleições, vive-se um “silêncio eleitoral”. No rádio e na televisão, há um ou outro anúncio descrevendo o processo de votação, além de placas gigantes nas estradas com os rostos de candidatos a deputado do N e pouquíssimos da oposição pedindo o voto presidencial.

Esses últimos baseiam sua falta de presença na mídia no fato de não terem recebido dívida política por parte do Governo, um apoio econômico que é relativo à quantidade de votos recebidos na eleição anterior. Apesar dessa falta de “bombardeio” de campanha, segundo o último censo do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), espera-se uma participação de mais de seis milhões de salvadorenhos, a maior em comparação ao Padrão Eleitoral de outros anos. 

Uma campanha de marketing político

Enquanto isso, El Salvador parece ser a terra onde corre leite e mel, e pode-se dizer que houve uma campanha sutil do partido governista com seus diferentes atores políticos. Para ser mais preciso, três meses antes das eleições, ocorreram inúmeros eventos que, embora não estejam escritos em pedra, podem ser relacionados a fins eleitorais, como a inauguração de uma tecnológica e renovada Biblioteca Nacional com fundos procedentes da China; o evento de Miss Universo, que foi criticado pelas candidatas que posaram com bonés “Bukele 2024”, apesar da lei proibir isso, e a cereja do bolo foi a visita de pré-temporada do time Inter Miami, com figuras como Leonel Messi e Luis Suárez, na qual foi realizada uma partida entre uma equipe híbrida de lendas do futebol vendendo nostalgia futebolística contra uma seleção nacional que está em um nível muito abaixo do time convidado.

Apesar de não ser o presidente de plantão após a designação de sua secretária particular, Claudia Rodríguez, para a presidência para gozar de uma licença e se dedicar à sua campanha eleitoral, Bukele se reuniu, com um protocolo muito presidencial, com a equipe convidada no hotel onde os jogadores se hospedaram. Por fim, para fortalecer esse desligamento com o passado, o atual governo de El Salvador decidiu destruir, em 3 de janeiro, o “Monumento à Reconciliação”, inaugurado anos atrás pelo governo de FMLN em homenagem à assinatura dos Acordos de Paz.

Com uma oposição frágil, bem como a segurança cidadã através da continuidade de um regime de exceção como bandeira, parece que Bukele tem a vitória assegurada, igual aos candidatos a deputados de seu partido, amparados pela popularidade de seu líder. Apesar de partidos como Fuerza Solidaria (FS), Frente Farabundo Martí para la Liberación Nacional (FMLN), Alianza Republicana Nacionalista (ARENA), Nuestro Tiempo (NT), Fraternidad Patriota Salvadoreña (FPS), Partido de Concertación Nacional (PCN), Gran Alianza por la Unidad Nacional (GANA), Partido Demócrata Cristiano (PDC) e VAMOS apareçam nas cédulas de votação, uma crise partidária em El Salvador é inevitável e parece que as cartas já foram jogadas.

Reformas inconstitucionais

Não obstante, houve muitos acontecimentos de 2019 até agora. As reformas promovidas pela casa presidencial e endossadas com maioria no hemiciclo salvadorenho foram as peças-chave para garantir a nova vitória, apesar da Câmara Constitucional estabelecer que a Constituição de El Salvador proíbe uma reeleição imediata.

Assim, em seu primeiro dia de trabalho em 2021, os deputados do N e seus aliados removeram os antigos magistrados da Câmara Constitucional e impuseram cinco advogados. Meses depois, essa nova equipe de trabalho emitiu uma resolução a favor da reeleição imediata, apesar dos seis artigos da Constituição que a proíbem. Bukele anunciou então, na comemoração do Dia da Independência em 2022, sua candidatura presidencial com Félix Ulloa como vice-presidente para as eleições de 2024. Quase um ano depois, a candidatura foi oficializada na conta do Twitter de seu partido.

Além das diferenças entre as campanhas eleitorais, essas eleições também incluem outras mudanças que podem promover a desigualdade entre os concorrentes, gerando um impacto no regime eleitoral. Por exemplo, a redução de deputados na Assembleia Legislativa, a redução dos municípios e o voto no exterior e on-line, que ocorre de 6 de janeiro a 4 de fevereiro e na qual qualquer salvadorenho que cumpra os requisitos, como ter um documento de identificação válido ou vencido, pode votar. Em El Salvador, há três tipos de modalidades de votação: voto por bandeira, preferencial e cruzado.

Tudo está pronto para 4 de fevereiro e, com uma propaganda cercada de palavras como “processo democrático”, para alguns isso ainda está em questão. Nessa conjuntura eleitoral, um vencedor poderia ser anunciado diretamente, mas os resultados podem nos surpreender. Assim, uma semana antes das eleições, El Salvador está “calmo”, não só pelas poucas propagandas eleitorais e uma campanha escassa, mas também por causa de uma falsa, para alguns, e verdadeira, para outros, segurança proporcionada pelo regime de exceção.

“Não regressemos ao passado, que o caminho seja irreversível…”. Assim dita Bukele em seu único vídeo de campanha eleitoral nas redes sociais.

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Cientista política e doutoranda em Estudos Latino-Americanos pela Universidade de Salamanca, Espanha.

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