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O papel suspeito de Maduro na observação eleitoral

A observação eleitoral intervencionista ou politizada é uma ferramenta usada pelos regimes autocráticos para tentar comprar legitimidade e combater os efeitos das organizações independentes.

A observação internacional de eleições é “a sistemática, completa e exata reunião de informação acerca das leis, dos processos e das instituições relacionadas à celebração de eleições e outros fatores relevantes ao entorno eleitoral geral; a análise imparcial e profissional dessa informação, e a extração de conclusões sobre o caráter dos processos eleitorais com base nos critérios mais exigentes em termos de exatidão da informação e imparcialidade da análise”. Essa é a definição incluída na Declaração de Princípios acordada por mais de vinte organizações internacionais e comemorada em um evento realizado na sede das Nações Unidas em Nova York em 2005.

É importante ter clareza dos alcances e limites da observação eleitoral, já que, há alguns anos, essa figura tem sido pervertida para legitimar eleições sob regimes autocráticos em países como Venezuela, Rússia e Cuba.

De fato, na última quinta-feira, 11 de abril, o presidente do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela e três vezes deputado do PSUV, Elvis Amoroso, anunciou a assinatura de acordos com o Conselho de Especialistas Eleitorais da América Latina (CEELA) e o Observatório Parlamentar e Eleitoral para a Integração Regional (OPEIR) para observar as eleições. Ambas as organizações têm independência no mínimo duvidosa e, no caso do OPEIR, nenhuma experiência na observação de processos eleitorais.

Carlos Aníbal López, representante do OPEIR, tem vínculos claros com o Partido Justicialista (PJ) argentino. Ao longo de sua trajetória, desempenhou distintos cargos, como assessor da Secretaria Geral da Presidência e secretário adjunto para Assuntos Especiais da Presidência da Nação de Cristina Fernández de Kirchner. Como se isso não bastasse, é congressista do PJ e membro pleno do Instituto Patria, a força ideológica do Kirchnerismo.

No caso do CEELA, o esforço tem sido mais sofisticado, já que é dirigido por Nicanor Moscoso, ex-presidente do Tribunal Eleitoral do Equador, que tem buscado uma fachada de perfil técnico. Foi fundado e financiado por fundos públicos venezuelanos há 20 anos, o que transgride o princípio da independência financeira e ameaça a integridade da organização, sendo um caso claro de conflito de interesses.

CEELA tem sido a organização que o chavismo/madurismo tem usado para tentar legitimar os processos eleitorais. Seus esforços foram tão longe que até emitiu um relatório no marco das eleições para a Assembleia Nacional Constituinte de 2017 que concluía que “o processo eleitoral […] cumpriu com as normas internacionais e a legislação nacional, e foi realizado de forma satisfatória”, embora a empresa que forneceu a tecnologia para o processo eleitoral tenha denunciado que a participação eleitoral foi manipulada em ao menos um milhão de votos. Esse talvez seja o processo no qual o CEELA tenha sido mais exposto na Venezuela, mas isso não o impediu de seguir credenciando-se como uma organização independente de observação eleitoral, mesmo em outros países da região e do mundo.

De fato, Moscoso pôs sua organização à disposição para “observar” as eleições na Rússia realizadas entre 15 e 17 de março. Sobre essas eleições, disse que o CEELA pôde “estabelecer todas as virtudes do sistema democrático russo”, embora Golos, o monitor eleitoral independente da Rússia, tenha afirmado que ocorreu a maior fraude em escala da história da Rússia, somando irregularmente 22 milhões de votos para Putin.

Que este espaço também sirva para lembrar que Grigory Melkonyants, copresidente de Golos, foi detido arbitrariamente em 17 de agosto de 2023. O governo de Putin declarou a organização “indesejável” e a rotulou como “agente estrangeiro”. Esse é o preço pago por quem faz observação eleitoral genuína sob regimes autocráticos.

Os esforços de OPEIR e CEELA para legitimar a eleição e combater os relatórios da sociedade civil independente da Venezuela foram precedidos pelos governos de Xiomara Castro e Gustavo Petro, que anunciaram o envio de missões eleitorais para acompanhar o processo eleitoral de 28 de julho. Em ambos os casos, trata-se mais de um acompanhamento partidário do que de um exercício de observação eleitoral, uma vez que os governos, ao terem interesses ideológicos e partidários, são impedidos de realizar a observação eleitoral.

Em suas declarações de 11 de abril, Nicanor Moscoso e Carlos Aníbal López não mencionaram as desqualificações ilegais contra os candidatos da oposição, especialmente aquela contra a vencedora das primárias opositoras, María Corina Machado, as intervenções judiciais contra os partidos (incluindo o Partido Comunista da Venezuela), as prisões arbitrárias de membros da Vente Venezuela, ou as de Javier Tarazona ou Rocío San Miguel. Também não se referiram aos obstáculos para registrar ou atualizar os dados de mais de 10 milhões de venezuelanos, tanto na Venezuela quanto no exterior, questões básicas em qualquer exercício técnico e profissional de observação eleitoral.

Esses temas não podem ficar fora da análise. De acordo com a Declaração de Princípios para a Observação Internacional de Eleições, “a observação internacional de eleições examina as condições relacionadas ao direito de votar e de ser eleito, incluindo, entre outras, a discriminação ou outros obstáculos à participação em processos eleitorais por motivos de opiniões políticas ou de outra natureza, gênero, raça, cor, etnia, idioma, religião, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou outras condições, inclusive deficiências físicas”.

A observação eleitoral técnica, rigorosa e profissional permitiu a melhora de vários processos eleitorais. Quando conduzidos adequadamente, os relatórios dos observadores fornecem recomendações que servem como guia aos órgãos eleitorais, bem como aos legisladores, para introduzir reformas para uma participação mais ampla e plural e processos eleitorais com maior integridade.

A observação eleitoral intervencionista ou politizada, por sua vez, é uma ferramenta usada por regimes autocráticos para tentar comprar legitimidade e combater os efeitos de organizações independentes que baseiam suas conclusões em uma metodologia rigorosa, profissional e apartidária.

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Diretor executivo da Transparência Eleitoral. Graduado em Relações Internacionais pela Universidade Central da Venezuela (UCV). Candidato a Mestre em Estudos Eleitorais pela Universidade Nacional de San Martín (UNSAM / Argentina).

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