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A desconcertante letargia da agenda migratória na Colômbia

Coautora Stephanie López

O governo de Gustavo Petro está no poder há mais de um ano e, é preciso dizer de forma inequívoca, sua liderança em matéria migratória tem sido uma letargia contínua, escassamente afetada por alguns tuítes desconcertantes. Dada essa ausência de gestão por parte das autoridades nacionais da Colômbia é preocupante, em especial, a questão da chamada migração de trânsito. O ostracismo no qual a política migratória do país foi relegada não é apenas lamentável, mas também tem o pior impacto possível sobre os migrantes e refugiados que cruzam ou residem no território colombiano. Nesse sentido, é necessário ter uma agenda pública na qual a questão migratória volte a ocupar o lugar relevante que o contexto impõe. 

Em primeiro lugar, como algumas vozes já alertaram, é lamentável que o acesso aos dados sobre o comportamento da migração venezuelana na Colômbia seja hoje tão escasso, quase inexistente. Por um lado, a Migración Colombia deixou de publicar os infográficos periódicos que nos permitiam conhecer o número de venezuelanos no país, quantos deles eram mulheres e homens, bem como as faixas etárias e sua distribuição territorial. Durante muito tempo, tivemos um acúmulo dessas informações, pois o último infográfico publicado foi o que apresentava dados sobre a migração venezuelana até fevereiro de 2022

Somente há alguns dias foi publicado um novo relatório, com informações de um ano atrás, o qual indica que, em outubro de 2022, havia cerca de 2,9 milhões de venezuelanos na Colômbia. Além disso, apesar de o registro do Estatuto Temporário de Proteção aos Migrantes Venezuelanos (ETPV) ter dados de caracterização socioeconômica com base em um questionário com mais de 80 perguntas, esses dados não são abertos. Mas não apenas os dados oficiais sobre a migração venezuelana deixaram de ser produzidos e publicados, como também se tornou muito difícil acessar os infográficos oficiais produzidos pela Migración Colombia nos governos anteriores. Até mesmo os links para pesquisar esses dados não funcionam mais e o ícone no site da Migración Colombia que permitia o acesso a essas informações em um único lugar desapareceu.

A opacidade dos dados também é uma questão que se repete na outra migração, que supostamente não tem a intenção de ser permanente, e da qual pouco ou nada foi divulgado pelo governo nacional. A dinâmica da migração pelo Darién tem sido conhecida exclusivamente por meio de agências internacionais, do governo panamenho ou das autoridades de controle colombianas. 

Essa migração de trânsito não está mais atravessando apenas o Tampão de Darién. De acordo com o relatório mais recente da Procuradoria Geral da Colômbia, ela também está saindo da ilha colombiana de San Andrés para a Nicarágua. Essa migração, historicamente invisível, ocorre em condições de extrema vulnerabilidade, e seus direitos humanos são violados sistematicamente. Enquanto o Panamá oferece dados sobre a população que chega a este país vinda desde a Colômbia pelo Darién, a Colômbia não tem nenhuma ação semelhante, o que é muito lamentável. De qualquer forma, de acordo com o relatório da OIM sobre migração nas Américas, sabemos que “em junho de 2023, a fronteira terrestre entre o Panamá e a Colômbia registrou um aumento anual de 90%, com 196.371 entradas irregulares” (p. 1), e que “os venezuelanos são a nacionalidade número um de migrantes irregulares em trânsito em todos os países, exceto nos Estados Unidos, onde estão em segundo lugar” (p. 15).

Além disso, nas últimas semanas, o governo dos Estados Unidos fez dois anúncios importantes, mas contraditórios, com relação à migração da Venezuela, justamente por causa do aumento desses fluxos para o país e por causa da pressão política de cidades como Nova York, que ficaram sobrecarregadas no contexto de uma campanha presidencial. O primeiro é a extensão da permissão de proteção temporária (TPS) para a população venezuelana por 18 meses. O segundo, em contraste com o primeiro, é a deportação das pessoas venezuelanas para seu país quando tentarem cruzar a fronteira estadunidense de forma irregular. Essa política de externalização das fronteiras, que se estende até a Colômbia, tem consequências diretas para a população em trânsito.

Após a divulgação dessas medidas, o presidente Gustavo Petro anunciou no Twitter a necessidade de criar corredores humanitários para o “retorno dos venezuelanos”. No entanto, é preciso dizer claramente e sem eufemismos: (i) deportações não são repatriações; (ii) o retorno deve ser sempre voluntário; e (iii) as deportações, por definição, não são voluntárias. De qualquer forma, essas deportações questionam cada vez mais o compromisso do governo com a migração “segura, ordenada e regular”, conforme declarado no Pacto sobre Migrações das Nações Unidas, enquanto os migrantes em trânsito continuam colocando suas vidas em risco tentando chegar aos Estados Unidos. Além disso, reconhece-se implicitamente que as condições na Venezuela são ideais para esse retorno, violando o princípio de não devolução. 

A diversidade dos fluxos e de suas rotas migratórias, em alguns casos com intenção de permanência, em outros de trânsito, nos convida, inevitavelmente, a abordar a mobilidade humana de forma abrangente e com um enfoque de direitos humanos, em que a proteção da pessoa e sua segurança estejam no centro da ação estatal. Pedimos ao governo colombiano que elabore e implemente medidas positivas nesse sentido. O recente anúncio da abertura de “investigações preliminares” contra alguns funcionários do setor de Relações Exteriores (Ministério das Relações Exteriores e Migração Colômbia), feito pela Procuradoria, “pela suposta omissão da aplicação integral da Política Integral de Migração (PIM) com relação à população que cruza o Tampão de Darién”, apenas ratifica a inação que estamos descrevendo aqui.

Stephanie López é Pesquisadora de pós-doutorado da The Local Engagement Refugee Research Network (LERRN), Carleton University, Ottawa (Canadá).

Autor

Abogada. Profesora de la Facultad de Derecho de la Universidad de los Andes (Bogotá) y Doctora por la misma universidad. Directora del Centro de Estudios en Migración (CEM) y co-fundadora de la Clínica Jurídica para Migrantes de la Univ. de los Andes.

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