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A fragmentação política na Colômbia: uma Torre de Babel

Apesar dos temores de uma eleição gravemente afetada pela onda de violência na Colômbia, a verdade é que, salvo o trágico incêndio nos escritórios do Registraduría Nacional del Estado Civil em Gamarra (César), que custou a vida de uma funcionária, Duperly Arevalo, e alguns tumultos em alguns municípios, as eleições regionais de 29 de outubro foram, em geral, pacíficas e não houve denúncias sérias de fraude eleitoral. No entanto, a profunda desorganização de nosso sistema partidário é uma grande fonte de preocupação.

Basta observar que nas recentes eleições não havia só 36 partidos ou movimentos políticos com personalidade jurídica, mas mais de 1.500, ou seja, mais de 1.500 “grupos significativos de cidadãos” (GSC) inscritos no Conselho Nacional Eleitoral (CNE) respaldaram candidatos a governadores, prefeituras, assembleias departamentais e conselhos municipais.

Segundo a muito respeitada Missão de Observação Eleitoral (MOE), o número de GSCs vem aumentando eleição após eleição. Só entre 2011 e 2019, houve um aumento de 488% (de 213 para 1.253 GSCs), que se conformaram, sobretudo, para a eleição de prefeitos municipais. E nas últimas eleições, o número de GSCs subiu para a nada desprezível soma de 1.500 criados para a ocasião, porque, diferente dos partidos, esses grupos não têm vocação de permanência. São flor de um dia.

Se os requisitos mínimos para conformar um partido ou movimento político são risíveis hoje em dia (50.000 assinaturas ou 50.000 votos, um parlamentar eleito), o que se exige para lançar um GSC são ainda mais irrisórios. Segundo as normas atuais, a equipe inicial do suposto grupo – leia-se: grupo – deve ser composta por ao menos três pessoas (!), que devem entregar um formulário às autoridades eleitorais indicando o cargo (governador, prefeito) ou corporação pública (assembleia departamental ou conselho municipal) a que aspiram e os nomes dos candidatos que apoiarão, que devem aparecer no formulário de coleta de assinaturas. As assinaturas coletadas devem ser ao menos 20% do resultado da divisão do número de cidadãos aptos a votar pelo número de assentos a serem preenchidos, até um máximo de 50.000 assinaturas.

Se a existência de 36 partidos oferecendo endossos a torto e a direito já é alarmante, as centenas de GSCs já são a gota d’água. De acordo com o CNE, “os grupos significativos de cidadãos não representam uma organização permanente, mas sim a simples conjuntura de postular listas e candidatos em uma determinada disputa eleitoral” (CNE, 2019). Ou seja, uma das principais funções que os partidos políticos deveriam cumprir, a seleção rigorosa de candidatos a cargos eletivos (por sua experiência, conhecimento, moralidade), evaporou-se completamente.

A figura dos GSC, que foi criada em má hora pela Constituição de 1991, é, segundo o própria CNE, uma alternativa aos partidos políticos, pois, como o órgão afirmou em um comunicado, “a própria Constituição permite a possibilidade de os cidadãos que não encontram afinidade com os partidos existentes exercerem seu direito eleitoral passivo, ao postular seus nomes como candidatos por meio dessa figura”. Em resumo, em vez de fortalecer os partidos políticos – que hoje vivem um “mau momento” – como pilares da democracia representativa, a Colômbia tomou o caminho de acelerar sua destruição.

E quem está de olho na prefeitura?

Nesse contexto de implosão ilimitada de partidos, movimentos étnicos e políticos e GSC, a Colômbia está vivendo não só um “mercado de avais” sem controle, mas uma feira obscura de financiamento político oculto. De fato, vários dias após as eleições de 29 de outubro, só um pequeno número de partidos, movimentos políticos e GSC entregou suas contas de campanha ao CNE. É provável, inclusive, que nem sequer reportem os gastos. E, por outro lado, se o fizerem, o débil CNE não tem capacidade de velar nem pela transparência dos recursos, pelos limites autorizados ou pelo seu uso. Quem pode examinar as contas de 1.500 GSC? Quem pode determinar se, por trás das CSGs, há apenas clãs familiares regionais obscuros dedicados à pilhagem de recursos públicos?

Em suma, a vida político-partidária está se confundindo em um ritmo acelerado. Sua origem está no péssimo desenho institucional neste terreno da Constituição de 1991 e na Lei 130 de 1994, “que dita o Estatuto básico dos partidos e movimentos políticos, define normas sobre seu financiamento e o das campanhas eleitorais, e ditam outras disposições”, no qual duas novas e estranhas figuras se criaram: movimentos sociais com aspirações políticas e os GSC.

Sem dúvida, a Constituição de 1991 tinha um objetivo louvável: superar o bipartidarismo perfeito – ou seja, um sistema em que dois partidos obtêm mais de 90% dos votos e dos cargos de eleição popular por preencher – e abrir o sistema para novas forças políticas, em particular, as dos grupos guerrilheiros que aceitaram, entre 1990 e 1991, realizar a transição “das armas para a política”: Movimiento 19 de Abril (M-19), o Ejército Popular de Liberación (EPL), o Movimiento Armado Quintín Lama (MAQL) e o Partido Revolucionario de los Trabajadores (PRT).

No entanto, esse objetivo foi manchado pelo péssimo desenho institucional que conduziu não só ao enfraquecimento dos partidos existentes – hoje os partidos Liberal e Conservador são uma mera sombra do passado – mas à fragmentação de todo o campo de representação política em mil pedaços. Hoje, o funcionamento dos órgãos colegiados em todos os níveis é muito deficiente e as leis, portarias ou acordos que aprovam acabam sendo meras “colchas de retalhos”, ou seja, normas de baixa qualidade.

A ampliação do número de atores políticos e dos requisitos mínimos para formá-los não serviu para fortalecer a adesão à democracia, pois, segundo as pesquisas, o número de cidadãos que afirmam pertencer a um partido político diminui diariamente. Mas também estamos observando dois outros fenômenos muito preocupantes: por um lado, a multiplicação de partidos personalistas e, por outro, a expansão de clãs familiares regionais. Ou seja, a crescente ausência de projetos políticos e programas coletivos.

Há três hipóteses principais para tentar explicar esse aumento no número de GSC pela MOE: em primeiro lugar, dispõem de um tempo maior que os partidos ou movimentos políticos para fazer campanha, pois começam sua agitação eleitoral desde a entrega dos formulários de coleta de assinaturas (oito meses antes das eleições). Em segundo lugar, devido à desconfiança e à má imagem dos partidos políticos – que, segundo a última pesquisa do Invamer, publicada em fevereiro de 2023, têm 77% de avaliação desfavorável e 11% de avaliação favorável – muitos políticos ou aspirantes a políticos preferem se apresentar como independentes. E, por fim, o alto número de partidos e movimentos políticos levou a uma profunda indefinição de programas e símbolos partidários, ou seja, de sua identidade ideológica.

O que fazer?

As recentes eleições regionais novamente soaram os alarmes sobre o profundo colapso de nosso sistema eleitoral e partidário, que eu não hesitaria em qualificar como um dos mais deficientes do mundo. O grave é que a má política é seguida por uma má administração pública.

Em especial, em um país onde não se consolidou uma verdadeira carreira administrativa e onde os grupos políticos que chegam ao poder em todos os níveis buscam ocupar os cargos públicos com seus seguidores e simpatizantes, com total autonomia de sua experiência e capacidade administrativa, além de pagar favores políticos. Segundo pesquisadores renomados, como Miguel Ángel Centeno e Agustín Ferrado, os únicos países latino-americanos com uma administração pública autônoma e um serviço civil de carreira são Chile e Costa Rica. Na Colômbia, prevalecem o nepotismo e os protegidos políticos, ou seja, a lealdade ou os laços familiares são privilegiados em detrimento da capacidade.

Por isso, é urgente um grande acordo nacional sobre a reorganização do sistema eleitoral e partidário, bem como a necessidade de uma verdadeira carreira administrativa no país em todos os níveis.

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Profesor de la Universidad Nacional de Colombia. Fue presidente de la Comisión Nacional de Reparación y Reconciliación (CNRR) e integró la Junta Directiva del Fondo de Víctimas de la Corte Penal Internacional.

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