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As Zonas Econômicas do Maduro: mais uma vã tentativa

No último 20 de julho, Nicolás Maduro anunciou a criação de cinco Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) em várias regiões costeiras da Venezuela: Paraguaná, Puerto Cabello-Morón, La Guaira, Margarita e La Tortuga Island. A notícia, de difusão obrigatória em “cadeia nacional”, como de costume pelo chavismo, foi acompanhada de sua correspondente Lei Orgânica e Superintendência. Trata-se de um instrumento normativo de 38 artigos que estabelece uma iniciativa governamental para incentivar o investimento estrangeiro e buscar um “novo equilíbrio no desenvolvimento nacional”. É basicamente uma tentativa desesperada de atrair moeda estrangeira e tentar contornar as sanções internacionais, em vista de sua recusa obstinada em ceder em sua maneira despótica de exercer autoridade, evitando qualquer acordo negociado para sua consolidação política.

As ZEEs estão localizadas em regiões geográficas específicas (geralmente com saída para o mar) nas quais é estabelecido um regime fiscal diferenciado do resto do país, com o objetivo de promover certas atividades comerciais orientadas principalmente para o comércio internacional de bens e serviços. Desde meados dos anos 70, este tipo de mecanismo tem sido implementado em vários países do mundo sob diversas modalidades e atualmente existem mais de 4.000 ZEE em 76 países. Quase metade conseguiram prosperar e se sustentar ao longo do tempo.

Boa parte do êxito dessas zonas se deve a várias condições sócio-econômicas, além de sua baixa carga tributária. As ZEEs requerem uma infra-estrutura instalada mínima de serviços públicos, bem como a segurança jurídica mínima para que qualquer investimento nacional ou estrangeiro possa ser rentável e protegido contra qualquer potencial arbitragem. Um esquema “win-win” que inclui o empresário, algo historicamente estranho à doutrina econômica do chavismo, sempre receosa ao livre mercado em qualquer de suas formas.

Em nível global, um dos casos mais recentes, embora com um futuro incerto, foram os portos livres e as ZEEs propostas pelo saliente governo de Boris Johnson como compensação ao Brexit no Reino Unido. Enquanto que em nossa região, destacam-se as ZEEs implementadas no México durante a gestão de Enrique Peña Nieto e, mais recentemente, o projeto Ciudad Bitcoin em El Salvador, após a questionável decisão do governo de fazer deste cripto-ativo uma moeda de curso legal. Quanto a este último, vários meses após o anúncio festivo do Presidente Nayib Bukele, o local ainda é “El Zonte”, uma pequena vila de pescadores no sul do país, onde ainda se espera pelos investidores que convertam o lugar na primeira ZEE centrada na criptomoeda.  

Estes casos demonstram que, além do sofisma dos políticos, o florescimento destas zonas não depende de um decreto presidencial ou da vontade de um punhado de empresários dependentes do Estado. É necessário investimento privado com certeza de lucro. 

Na Venezuela, tudo naufragou durante o socialismo

Na história econômica venezuelana contemporânea, existe um antecedente nas conhecidas “Zonas Francas” criadas desde 1991. Na época, estas foram capazes de dinamizar parcialmente a economia venezuelana e funcionaram em certos momentos como mecanismos para equilibrar a balança comercial do país. Entretanto, desde então sua operação tem sido altamente influenciada pela gestão governamental, que acabou por degenerá-las em zonas principalmente orientadas para a chamada “economia portuária”. Ou seja, espaços dedicados às importações massivas promovidas pela renda do petróleo que se destinava a substituir o tecido empresarial nacional em áreas econômicas historicamente consideradas “estratégicas” ou de “interesse nacional”.

É importante considerar que o socialismo venezuelano, ao longo de suas mais de duas décadas de hegemonia política, causou o extermínio de empresas privadas, uma catástrofe econômica sem paralelo na região. De acordo com dados da Conindustria e da Fedecámaras, a revolução bolivariana levou à expulsão de cerca de meio milhão de empresas privadas, além da expropriação e estatização de mais de 1.400 empresas na Venezuela.

Diante de tal desastre, o regime de Maduro agora apela para estas zonas econômicas especiais. Mas, como declarado em todos os seus artigos, o papel de supervisão e fiscalização do Estado condiciona qualquer aspecto operacional e de capitalização que possa ser desenvolvido nessas ZEEs. Além disso, essas entidades estão administrativamente ligadas a funcionários com restrições financeiras internacionais contra eles, e em alguns casos até mesmo com mandados de prisão. Segundo a empresa venezuelana Ecoanalítica e Transparência International, 21% da receita do Estado venezuelano provém de atividades ilegais. O mesmo Estado, diretamente responsável pela queda mais acentuada do Produto Interno Bruto na região desde 2013.

Estes antecedentes pouco animadores são os que qualquer empresário, nacional ou estrangeiro, que procure algum tipo de participação nestas ZEEs, terá que pesar. Na verdade, apesar daqueles que asseguram que na Venezuela existe um capitalismo autoritário de Estado, na verdade sua economia está nos antípodas de um regime mínimo de capitalização e abertura sustentável do mercado. Nem mesmo para sua própria burguesia de bodegones. 

Portanto, fica claro que o voluntarismo político e a retórica nacionalista não são suficientes para trazer o investimento privado à tona. Tratando-se de uma economia asfixiada pelo naufrágio de seu próprio Estado autoritário, o que é necessário é mais Estado de direito, mais transparência, mais investimento autônomo, liberdades empresariais, possibilidade de lucro, infra-estrutura de serviços públicos básicos e sobretudo respeito à propriedade privada. Somente desta forma estas ZEEs poderão ser consideradas como uma estratégia sólida e sustentada de desenvolvimento.

*Tradução do espanhol por Giulia Gaspar. 

Autor

Politólogo egresado de la Univ. Central de Venezuela y la Universidad Autónoma de Barcelona. Master en Estudios Latinoamericanos, Universidad de Salamanca. Analista de asuntos parlamentarios.

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