Inexoravelmente, o presidente salvadorenho Nayib Bukele se encaminha com absoluta calma para sua reeleição inconstitucional. Dizemos inexoravelmente porque controla todo o aparato estatal, incluindo os poderes legislativo e judiciário, e, ademais, mediante uma boa campanha em redes sociais, segue convencendo boa parte da população de que é um grande presidente.
O ambiente pré-eleitoral é tingido por queixas da oposição, às quais muito poucos prestam atenção especial. “Bukele e os seus são realmente magos utilizando as redes sociais, e o carisma do presidente faz o resto… o faz de tal maneira que sua audiência só pensa que agora pode caminhar com mais tranquilidade pelas ruas”, afirma um analista que prefere manter o anonimato. Após uma queda em sua imagem positiva, segundo as últimas pesquisas, Bukele tem uma intenção de voto de 71%. Talvez a cifra seja exagerada, mas não há dúvida de que ele tem o aval da maioria.
A ilegalidade da candidatura de Bukele
Em 15 de setembro, Dia da Independência, Bukele afirmou em seu discurso que concorreria à reeleição para “copiar as coisas boas das nações desenvolvidas”, apesar de reconhecer que a reeleição não é permitida constitucionalmente no país.
A constituição de El Salvador proíbe a reeleição presidencial em quatro artigos. O artigo 75 estabelece que “perde os direitos de cidadão quem subscreve atos, proclamações ou adesões para promover ou apoiar a reeleição ou a continuação do presidente da República, ou usam meios diretos para esse fim”.
O artigo 88, por sua vez, considera a alternância “indispensável para a manutenção da forma de governo e do sistema político estabelecido”. “A violação dessa norma obriga a insurreição”, adiciona. Por sua vez, o artigo 152 diz que não pode ser candidato à primeira magistratura “quem tiver exercido o cargo de Presidente da República por mais de seis meses, consecutivos ou não, durante o período imediatamente anterior, ou nos últimos seis meses anteriores ao início do período presidencial”.
Esses são só alguns dos artigos que afirmam explicitamente que sua candidatura é ilegal. Mas nada disso importa com uma Suprema Corte de Justiça servil ao mandatário e um Tribunal Superior Eleitoral que se exime de suas responsabilidades acatando as decisões da Corte.
Após o anúncio de Bukele, que era esperado por todo o país, a oposição saltou de seus escassos assentos no legislativo para questionar as intenções do presidente. A Alianza Republicana Nacionalista (ARENA), de direita, declarou que “enfim Bukele tirou a máscara e revelou sua verdadeira intenção: perpetuar-se no poder”. Por sua vez, a Frente Farabundo Martí para la Liberación Nacional (FMLN), de esquerda (?) indicou em um comunicado que as intenções de Bukele “vão contra a Constituição da República”, lamentando o aval dado a essa aspiração ilegal pela Câmara Constitucional da CSJ.
A realidade para os salvadorenhos comuns
Nos últimos anos, a corrupção atingiu níveis inéditos. Mas Bukele, que é muito bom no mundo das redes sociais, conseguiu monopolizar a narrativa de suas conquistas – reais e supostas – sobretudo no campo da segurança cidadã, já que as ruas das cidades estão mais calmas. Isso se dá à custa da constante violação dos direitos humanos de setores marginalizados , mas não marginais, da população.
Milhares de pessoas, segundo organizações de direitos humanos, ficam meses e anos em prisões sem julgamento. Os fatores comuns das vítimas é que são pobres, quase iletrados e de origem rural. Segundo cálculos dessas organizações, elas representam quase 40% da população carcerária, um número difícil de comprovar. O objetivo do governo é mostrar ao público os “delinquentes” presos. Ou seja, maximizar o efeito de sua política diante de cidadãos que são, pelo menos, menos assediados pelo crime.
Sendo assim, Bukele obviamente segue no comando do executivo e será reeleito, pois os níveis de adesão, que em algum momento caíram significativamente, voltaram a subir consideravelmente. Isso é influenciado por suas campanhas inteligentes nas redes sociais, seu carisma, suas declarações confiáveis, mas falsas, a segurança incipiente nas ruas, mas, sobretudo, uma oposição desacreditada e dispersa.
Bukele, por enquanto, detém todas as rédeas do poder e ninguém parece ser capaz de tirá-las dele, especialmente considerando que tem o apoio praticamente irrestrito das forças armadas e de segurança. A oposição, relegada dentro das estruturas do Estado, em especial no Parlamento, não tem estratégias para enfrentar a situação. E embora o presidente tenha menos apoio em algumas zonas rurais, os votos, mesmo que fossem majoritariamente para um candidato da oposição, não seriam suficientes para neutralizar o apoio que tem nos grandes centros urbanos.
Por outro lado, apesar dos supostos “confrontos” com Washington, a oposição está ciente de que o Norte prefere enfrentar um personagem como Bukele e sua narrativa em vez de uma oposição frontal aos interesses estadunidenses na região.
Autor
Analista, comunicador e consultor independente de agências e organizações internacionais. Diretor nacional da Presagio Consulting Honduras.