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Equador: poderia ser desdolarizado?

Em 9 de janeiro de 2000, o governo do Equador daquela época anunciou a adoção do dólar americano como moeda de curso legal, após uma profunda crise econômica, financeira e social. Entre 1998 e 2000, o PIB nominal caiu 35% e o PIB per capita caiu 33%. O sucre foi desvalorizado em 359,7% como consequência das políticas adotadas. A pobreza passou de 56% em 1995 para 69% em 2001; o desemprego aumentou de 8% para 17%. Os salários reais foram reduzidos em aproximadamente 40%. A decisão foi unilateral, desesperada e carente de um processo de coordenação política e econômica.

No início do século XXI vários economistas tenham levantado a possibilidade de que mais países da América Latina fossem dolarizados para aliviar a instabilidade cambial dos anos 80 e 90″

Embora no início do século XXI vários economistas tenham levantado a possibilidade de que mais países da América Latina fossem dolarizados para aliviar a instabilidade cambial dos anos 80 e 90, após a dolarização em El Salvador em 2001 nenhum outro país latino-americano abraçou este sistema. A verdade é que a dolarização, como qualquer outro regime cambial, possui benefícios e custos.

Por um lado, um esquema de dolarização facilita: a estabilidade macroeconômica e de credibilidade internacional, a redução dos custos de informação, uma estabilidade relativa de preços, a eliminação do risco cambial, a diminuição do risco-país e das taxas de juros, e aumento do comércio com os Estados Unidos.

Por outro lado, um sistema de dolarização também implica: a perda da emissão monetária e da política cambial, a renúncia à renda de senhoriagem, a deterioração da soberania, a ausência de um emprestador de última instância e a ausência de uma fonte de financiamento fiscal.

No período de pós-dolarização, os principais agregados macroeconômicos evoluíram favoravelmente”

No caso do Equador, no período de pós-dolarização, os principais agregados macroeconômicos evoluíram favoravelmente. A inflação tem estado em faixas menores de um dígito, o desemprego tem apresentado níveis moderados, o risco soberano tem sido inferior em comparação com a era da autonomia monetária, e o investimento tem crescido a uma maior velocidade.

Entretanto, outros indicadores não têm apresentado o desempenho esperado. O investimento estrangeiro direto tem sido mínimo. A mudança na matriz produtiva não foi capaz de ser consolidada. A economia reflete uma maior dependência do petróleo em comparação com o período pré-dolarização. Além disso, e mais importante, os desequilíbrios externos (como a valorização do dólar, a queda nos preços do petróleo ou a atual pandemia da COVID-19) aumentam a vulnerabilidade da economia equatoriana diante da incapacidade de utilizar ferramentas de política monetária.

A questão relevante é que, embora a dolarização forneça uma âncora para a inflação, ela não garante a resolução de problemas estruturais e institucionais.

Longe de uma discussão com sólidos argumentos técnicos, a desdolarização tem sido usada como uma bandeira para desqualificação política”

No início de 2021, o Equador elegerá um novo governo. Neste contexto, a possibilidade de desdolarizar a economia está mais uma vez na agenda do debate político. Entretanto, longe de uma discussão com sólidos argumentos técnicos, a desdolarização tem sido usada como uma bandeira para desqualificação política, gerando preocupação na população.

A maioria dos cidadãos mantém uma posição contrária a um sistema com moeda própria, já que várias pesquisas mostram que, em geral, os equatorianos são a favor da dolarização. Mas esta percepção, errónea ou não, é largamente influenciada por episódios passados, especialmente pelo manuseio errático da política monetária no final do século XX.

Mas será que a desdolarização da economia do Equador é uma possibilidade real? Apesar do fato de que a dolarização no Equador apresenta debilidades em sua construção e funcionamento, a curto prazo a decisão mais adequada seria mantê-la. Embora seja necessário especificar que o cenário ideal para a gestão econômica é ter autonomia monetária e a possibilidade de realizar ajustes na taxa de câmbio, a implementação deste sistema tem coincidido com um período prolongado de estabilidade macroeconômica, apesar de vários eventos adversos ao longo destas duas décadas.

Não obstante, a fim de manter a dolarização, é indispensável que a médio prazo sejam estabelecidas certas condições que permitam fortalecer este regime. Estes são: promover o desenvolvimento de setores produtivos mais sustentáveis, reduzindo a dependência do petróleo; estabelecer mecanismos legais para evitar a gestão irresponsável dos recursos fiscais e evitar a expansão da dívida pública; buscar um papel passivo do Banco Central na gestão da política monetária; aumentar a presença de instituições financeiras internacionais para evitar eventos inesperados de iliquidez; e promover um maior grau de flexibilidade no mercado de trabalho.

é necessário que o Equador estabeleça alternativas monetárias para o longo prazo

Finalmente, é necessário que o Equador estabeleça alternativas monetárias para o longo prazo. A história tem mostrado que mesmo os regimes rígidos de taxas de câmbio podem ser rompidos. Portanto, é possível que no futuro uma opção monetária seja a adoção de uma moeda regional diante de uma hipotética saída da dolarização, ainda mais conveniente à opção de retornar a um esquema de moeda própria.

Entretanto, um projeto de tal magnitude deve ser estruturado com os mais rigorosos critérios técnicos e tomando como referência o processo de integração monetária da Zona Euro e a realidade latino-americana.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

Foto de Cocoabiscuit en Foter.com / CC BY-NC-ND

Autor

Economista. Profesor e investigador de la Univ. de las Américas (Ecuador). Doctor en Economía y Negocios por la Univ. Autónoma de Madrid y Máster en Econ. Internacional por la misma universidad. Especializado en economía internacional y macroeconomía.

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