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Honduras: entre o autoritarismo eleitoral e a recomposição democrática

Em 28 de novembro, os hondurenhos serão chamados para participar do décimo processo eleitoral geral desde o retorno à ordem constitucional em 1982. Espera-se que mais de cinco milhões de votantes irão às urnas para escolher as autoridades executivas e legislativas nacionais e municipais, além dos representantes ao Parlamento Centro-Americano. Consequentemente, em janeiro de 2022, um novo governo assumirá os destinos do país.

Além de escolher os candidatos, esta eleição é de crucial importância para determinar se Honduras poderá — ou não — continuar sendo considerado um país governado por um regime democrático representativo. Desde a interrupção irregular do mandato do Presidente Manuel Zelaya em 2009, numerosos relatórios, particularmente do projeto Variedades da Democracia, V-Dem, alertaram que o país havia caído na categoria de Autoritarismo Eleitoral. Isto quer dizer que se trata de um regime híbrido com mínimo de competição e participação política, e com pouco apreço pelo Estado de Direito ou pela prestação de contas. Este é um panorama político comparável ao do Haiti, Nicarágua e Venezuela.

Além de celebrar uma festa cívica e republicana, as próximas eleições hondurenhas determinarão se a nação conseguirá recompor-se ou se continuará sendo vítima de um processo gravíssimo de erosão democrática. Após uma “década trágica”, que se constatou todo o tipo de irregularidades, crimes e abusos políticos, o povo hondurenho tem uma magnífica oportunidade para corrigir os rumos do Estado, da sociedade e de sua inserção internacional. 

O processo hondurenho foi precedido por reformas políticas e eleitorais que produziram uma nova institucionalidade. Entre as principais disposições se destaca a criação de um Conselho Nacional Eleitoral e de um Tribunal de Justiça Eleitoral. Houve também algumas inovações na tecnologia, paridade de gênero, e uma depuração do censo. 

Infelizmente, não foi possível avançar no que concerne à introdução do segundo turno, na denominada “cidadania das mesas eleitorais” ou de maiores controles sobre o financiamento de campanhas e dos partidos. Em geral, tais reformas procuraram gerar transparência e confiança, bem como reassegurar a integridade e legitimidade das instituições e os mecanismos próprios da prestação de contas eleitoral ou vertical, uma dimensão fundamental da qualidade da democracia. 

O assunto é extremamente urgente, principalmente diante as numerosas irregularidades, vazios e insuficiências nas três últimas eleições gerais hondurenhas. Isto explica a notória queda no índice de apoio cidadão à democracia, conforme demonstra, entre outros, o relatório Latinobarómetro 2021, com uma queda no apoio dos cidadãos ao regime democrático entre 2006 e 2020 de 55% para 30%. O abstencionismo excede 40% do censo e os vencedores ganharam com aproximadamente 25% dos votos válidos e uma margem estreita em relação aos outros concorrentes. 

Em consequência, no marco desta “década trágica”, Honduras é um dos países latino-americanos com menor apoio cidadão ao regime democrático. Isto é extremamente preocupante e representa uma involução com implicações espúrias para a população local, e desdobramentos regionais, hemisféricos e globais negativos.

Quem compete?

Em relação à competição pela presidência, estão concorrendo 14 aspirantes, uma quantidade sem precedentes. Segundo as pesquisas, duas dessas candidaturas apresentam possibilidades reais de alcançar a vitória. De um lado, aparece Xiomara Castro (Partido Libertad y Refundación-Libre), que encabeça uma aliança multipartidária de partidos de centro e esquerda. Atualmente, Castro teria entre 30% e 35% das intenções de voto. 

Dado que as eleições gerais são decididas por maioria simples, a candidata apresenta as melhores opções para alcançar a vitória. Nessa hipótese, seria a primeira vez na história de Honduras que uma mulher chegaria à presidência. Vale agregar que Castro propõe um plano de governo de orientação reformista, social-democrata e popular para o país.

Por outro lado, Nasry Asfura, do Partido Nacional de direita e ex-prefeito de Tegucigalpa, é o candidato governista. Segundo as pesquisas, ele teria entre 20% e 25% das intenções de votos. Embora conte com um certo apoio devido à sua razoável gestão municipal na capital e ao apoio do Presidente Juan Orlando Hernández, pesam contra as suas aspirações os numerosos erros, irregularidades e abusos, tanto próprios como do seu partido e do governo durante os últimos três mandatos. 

Na situação atual, é bastante provável que o candidato do partido no poder seja derrotado nas urnas e que Hernández — com um baixo e decrescente respaldo popular — seja substituído por um opositor. Isto permitiria uma alternância saudável no poder.

Os demais aspirantes têm muito poucas opções na competição para a presidência. No entanto, eles podem contribuir no campo do pluralismo político-partidário, na representação democrática e na conformação do futuro Congresso Nacional. Tudo isso favoreceria a recomposição das relações Executivo-Legislativo, a revalorização do sistema partidário e a formação das maiorias no próximo período. 

Outras variáveis que poderiam incidir nas preferências dos eleitores hondurenhos são os efeitos da pandemia e os fenômenos climáticos adversos, bem como a exclusão social e a cultura política. Também é relevante o posicionamento de atores sociais e econômicos, tais como a comunidade empresarial, a sociedade civil organizada, os movimentos sociais, as instituições religiosas, as forças armadas e os meios de comunicação de massa.  

A comunidade internacional, através de observadores da Organização dos Estados Americanos e da União Europeia, contribuirá para garantir a integridade e a transparência do processo eleitoral. Os governos de Washington e da Cidade do México também estão acompanhando e monitorando o processo, buscando principalmente um interlocutor válido em Tegucigalpa. Basicamente, alguém disposto a trabalhar para reduzir os fluxos migratórios, reprimir os ilícitos transnacionais, lutar contra a corrupção e a impunidade, garantir o desenvolvimento social e econômico e promover um governo eficaz, republicano e democrático no país centro-americano. 

Honduras tem a oportunidade de reverter o nocivo processo de erosão democrática observado desde 2009. A interrupção irregular do mandato de Zelaya iniciou uma “década trágica” e foi um dos primeiros sintomas da onda de autocratização que acabou envolvendo outras nações da América Latina e do Caribe. 

O próximo processo eleitoral hondurenho tem o potencial de definir muito mais do que os líderes dos poderes executivo e legislativo. Partindo da premissa de que as eleições gerais serão livres e justas, em 28 de novembro os hondurenhos decidirão se o país poderá reconduzir seu destino pelo caminho da democracia representativa e republicana, ou se afundará no autoritarismo eleitoral, caudilhismo, ingovernabilidade e barbárie. Na minha opinião, o povo hondurenho pode e merece construir uma recomposição democrática, assegurar a transferência do poder para uma nova liderança política e avançar em direção a um futuro melhor.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

Autor

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Investigador-colaborador del Centro de Estudios Multidisciplinarios de la Universidad de Brasilia (UnB). Doctor en Historia. Especializado en temas sobre calidad de la democracia, política internacional, derechos humanos, ciudadanía y violencia.

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