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Liderança e partidos, uma relação tortuosa

Carlos Pineda, até pouco tempo atrás o candidato à presidência da Guatemala com a maior intenção de voto, expressou sua surpresa com o fato de o partido pelo qual ele estava concorrendo, Prosperidad Ciudadana, ter desistido de apoiá-lo em sua apelação perante o Tribunal Constitucional.  Sem esconder sua frustração por ter sido deixado de fora das eleições do próximo 25 de junho devido a uma sentença judicial, ele afirmou que não sabia “o que o partido estava fazendo”. O presidenciável insistiu que sempre disse que não fazia parte do partido e que não entendia o comportamento de seus membros.

As relações entre liderança e partidos são uma questão antiga na política, que é exacerbada em regimes presidenciais. A eleição presidencial direta pelos cidadãos obscurece o papel intermediário desempenhado pelos partidos nos regimes parlamentares, que, no entanto, é solidamente mantido em outros avatares. Os partidos no Congresso desempenham papéis relevantes no processo legislativo, nas nomeações de cargos de alto nível e em tarefas de controle do governo. Há, portanto, um jogo em diferentes âmbitos que, no caso do candidato frustrado Pineda, provoca perplexidade, pois o roteiro não está sendo executado como gostariam que fosse.

A atual disputa política de um bom número de países latino-americanos apresenta um modelo de jogo no qual a liderança maior, assumida pela figura presidencial, se impõe irrestritamente diante dos fatores condicionantes do partido. A vontade do presidente é um entrave a qualquer suposta inconstância do grupo e não compreende que existam regras ou estratégias que possam limitá-la. Entretanto, o jogo articulado tem certa complexidade e hoje estabelece três modelos que acarretam implicações diferentes. 

O primeiro segue o padrão do México e de El Salvador, onde seus presidentes, Andrés Manuel López Obrador e Nayib Bukele, que atualmente têm os índices de aprovação mais altos da região, dirigem seus respectivos partidos, que eles mesmos criaram, de maneira vertical. Como aponta o prestigioso veículo de mídia El Faro, o partido salvadorenho Nuevas Ideas é “uma marca, uma criação, para admirar e venerar a si mesmo”. É uma manifestação de pessoas de seu meio, tendo Bukele como seu “pináculo, sustentado por lealdade absoluta e fiducial, onde a negligência é qualificada como impiedade”. Todos os dias, mais de cem vídeos são produzidos no YouTube promovendo e impulsionando a imagem do presidente e atacando e destruindo todos os obstáculos, com uma alta taxa de eficiência em termos de reproduções e visualizações. Uma avaliação que é útil para López Obrador que, além disso, como não pode ser reeleito, está se preparando nos próximos meses para controlar sua sucessão dentro de seu partido, o Morena, cuja função é semelhante à do Nuevas Ideas.

A República Dominicana, Bolívia, Honduras, Nicarágua e Venezuela seguem um caminho semelhante, embora o desempenho democrático não esteja presente nos dois últimos. O Partido Revolucionario Moderno, o Movimiento al Socialismo, o LIBRE, a Frente Sandinista de Liberación Nacional e o Partido Socialista Unido de Venezuela, respectivamente, são os instrumentos de ação política de Luís Abinader, de Luís Arce, mesmo com sérios problemas de controle interno, do casal formado por Xiomara Castro e Mel Zelaya, de Daniel Ortega e de Nicolás Maduro. Todos eles estiveram no momento da fundação do partido que hoje é o principal instrumento para o exercício de seu poder.

O segundo retrata um cenário em que o presidente consegue articular uma coalizão na base de seu escasso partido, com êxito incerto em função dos assuntos que precisam ser levados adiante. Esse é o caso da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Guatemala, Panamá, Paraguai e Uruguai. Nesses países, uma variável fundamental está relacionada à maturidade e à consolidação do sistema partidário, a fim de manter um nível mínimo de estabilidade em termos de governabilidade do sistema. O Uruguai se destaca por seu alto grau de institucionalidade, o que, no entanto, não impede a existência de certas tensões. O Paraguai também é uma exceção devido à longevidade do governante e preponderante Partido Colorado.

A Colômbia é um caso interessante em que o equilíbrio instável está se desfazendo, pois o Partido de la U, com 11 senadores e 15 representantes, decidiu sair oficialmente da coalizão legislativa do governo de Gustavo Petro e declarar-se independente. Essa decisão foi tomada logo depois que o Partido Conservador, com 15 senadores e 25 representantes, fez o mesmo e se distanciou da ampla coalizão construída por Petro durante os primeiros meses de seu mandato, o que lhe permitiu aprovar a reforma tributária e a lei de paz total, entre outras.

O terceiro modelo é definido pelos presidentes da Costa Rica, Equador e Peru, que não conseguiram nem capital político próprio nem contam com um partido com força significativa no Congresso. Enquanto estes dois últimos sofreram crises muito graves, que levaram à convocação de eleições com o cenário aberto de uma presidência interina para Guillermo Lasso e a substituição do Presidente Pedro Castillo pela Vice-Presidente Dina Boluarte, na Costa Rica, o governo de Rodrigo Chaves está definhando, sustentado apenas pela natureza até então sólida do sistema político costarriquenho.

Esses são modelos que evidenciam a heterogeneidade da política na região em torno de um jogo tortuoso cuja natureza, frente a aspectos de caráter institucional, entusiasma talentos individuais nos quais o narcisismo e a incompetência têm grande participação. A política se concentra quase que exclusivamente na atuação de pessoas concretas com um impulso desenfreado pelo poder e deixa de lado os comportamentos rotineiros que moldam as instituições. Portanto, não é de se surpreender que aqueles que detêm o poder, ou estão próximos a ele, joguem um jogo diferente dos demais. O deles.

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Profesor Emérito de la Universidad de Salamanca y de la UPB (Medellín). Últimos libros publicados (2020): “El oficio de político” (2ª ed., Tecnos, Madrid) y coordinado con Mercedes García Montero y Asbel Bohigues (2024): “Elecciones en América Latina: de pandemia y de derrotas (2020-2023)”, (Centro de Estudios Políticos y Constitucionales. Madrid)

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