A migração da América Central para os Estados Unidos aumentou, e segundo um relatório publicado no mês de março pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, é provável que em 2022 aumente ainda mais e se agravem os problemas de segurança para as pessoas que tentam cruzar a fronteira entre a potência norte-americana e o México. A imigração tornou-se um tema-chave para os Estados Unidos e várias pesquisas colocam-na entre os principais problemas dos norte-americanos.
Nas eleições de 2020, houve razões para o otimismo na América Central. Neste ano, na campanha presidencial, Joe Biden prometeu 4 bilhões de dólares para atender as causas da emigração no México e nos países do Triângulo do Norte (El Salvador, Honduras e Guatemala). As causas são múltiplas, mas em sua maioria tem a ver com o desenvolvimento econômico e social dos países centroamericanos.
As visitas do Secretário de Estado Anthony Blinken e da Vice-Presidente Kamala Harris à Costa Rica e Guatemala, respectivamente, em junho do ano passado, poderiam ser interpretadas como um sinal de interesse da administração Biden em cumprir essa meta. Também é um bom sinal a presença de Kamala Harris à transferência presidencial em Honduras, no último 27 de janeiro.
Anteriormente, nenhum governo estadunidense havia manifestado tanta atenção aos problemas de desenvolvimento econômico e social da região. No entanto, também havia razões para o ceticismo. Como bem assinalou um painel de peritos do Diálogo Interamericano, chefiado pela ex-Presidente Laura Chinchilla, a proposta do governo de Biden tinha várias limitações. Entre elas, a carência de um enfoque regional, que, como demonstrou a história, é fundamental para entender e enfrentar os problemas da América Central.
É certo que através de alianças público-privadas promovidas pelos Estados Unidos, estão sendo feitos esforços para atrair investimento para os países mais afetados. Várias empresas norte-americanas manifestaram interesse, algo facilitado por um contexto de nearshoring. É uma oportunidade, mas certamente requer uma influência do setor público, através de políticas sociais em áreas-chave como a educação e a saúde. De qualquer forma, os efeitos serão vistos a longo prazo.
Contudo, de acordo com uma nota publicada pela revista Time em janeiro passado, em meados de 2021, apenas cerca de 250 milhões de dólares da ajuda prometida tinham sido investidos. Não está claro como e em quê.
Como salientaram os especialistas do Diálogo Interamericano, 4 bilhões de dólares na realidade é pouco para as dimensões dos problemas da região. Ainda assim, parecia um bom começo. Apesar disto, parece altamente improvável o cumprimento desta meta até o final dos quatro anos da administração Biden-Harris. Especialmente se os democratas perderem o controle do Executivo em novembro de 2024.
O contexto internacional é um dos fatores que leva ao ceticismo. Embora desde o início da administração Biden, parte da sua estratégia de política externa tenha sido centrada na recuperação de alianças enfraquecidas durante o governo de Donald Trump (2017-2020) com democracias ocidentais, grande parte da atenção se dirigiu para o Sudeste Asiático, particularmente a ascensão da China como prioridade de política externa.
Mas suas suposições tiveram de mudar rapidamente. Surgiram questões imprevistas, como o enfraquecimento da sua imagem pela caótica saída das suas forças armadas do Afeganistão. Além disso, evidentemente a invasão russa à Ucrânia é uma afronta ao seu status de potência hegemônica.
No plano doméstico, a atenção das e dos eleitores está centrada na inflação, no meio das eleições intercalares de novembro. A estrutura de um sistema político bicameral, com eleições presidenciais a cada quatro anos, eleições em outros níveis a meio mandato e sistema bipartidário, já coloca negociações muito complicadas para um partido governante frágil no Congresso. Assim, uma agenda a longo prazo para a América Central encontrará dificuldades com um Executivo estadunidense que tem metas de curto prazo e interesses globais. No entanto, um segundo governo democrata seria, sem dúvida, vantajoso.
Esta lógica se mescla com os problemas políticos centro-americanos. O governo estadunidense declarou que quer evitar que a ajuda financeira caia em saco roto, devido à profunda corrupção que é amplamente conhecida. Isto é agravado pelo autoritarismo que afeta principalmente a Nicarágua e, em menor medida, El Salvador e ameaça os outros sistemas políticos.
Embora a Nicarágua não entraria nas ajudas prometidas, complica as coisas. Os governos da Nicarágua e de El Salvador responderam com medidas repressivas contra organizações da sociedade civil que deveriam canalizar parte da cooperação econômica dos atores da comunidade internacional, como os Estados Unidos, para projetos de desenvolvimento social. Esperemos que outros governos da região não sigam o exemplo.
Infelizmente, os milhões de pessoas que precisam que estas promessas de desenvolvimento econômico e social sejam cumpridas estão no meio do jogo político. Portanto, milhares seguirão tentando migrar para os Estados Unidos, mesmo que tenham que arriscar suas vidas.
Neste momento, há pouca informação sobre as políticas que estão sendo implementadas nesta área. Esperemos apenas que se mantenha o interesse apesar dos fatores debilitantes, tanto conjunturais como estruturais, na política doméstica dos Estados Unidos e dos países centro-americana, como também na política internacional.
Juan Manuel Muñoz Portillo é Professor da Escola de Ciências Políticas da Universidade da Costa Rica. Doutor em Política e Relações Internacionais pela Dublin City University (DCU), Irlanda. Foi pesquisador de pós-doutorado na DCU e na Universidade de Cambridge, Inglaterra.
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*Tradução do espanhol por Giulia Gaspar.
Autor
Professor de Direito Constitucional do Depto. de Direito Constitucional e Ciência Política da Univ. de Valencia (Espanha). Doutor em Direito. Especializado em democracia e processos constituintes com foco na América Latina.