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As crianças da América Latina não podem esperar

Proteger o presente das crianças e garantir-lhes um futuro digno é um dever ético que define nossa humanidade e o tipo de sociedade que desejamos construir.

Há 37 anos, o Papa João Paulo II pronunciou no Chile uma frase que marcaria gerações: “Os pobres não podem esperar”. Essa mensagem, dirigida a uma nação dividida, ressoa fortemente na América Latina, onde milhões de crianças e adolescentes entre 0 e 17 anos continuam a enfrentar uma realidade marcada pela pobreza, desigualdade e violência.

A região está passando por um cenário desafiador. Embora tenha havido progresso na redução da pobreza extrema nos últimos anos, a crise econômica e de saúde causada pela pandemia de Covid-19 reverteu muitas dessas conquistas. Em 2021, a pobreza afetava 46,1% das crianças e adolescentes na América Latina, de acordo com dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL, 2024). Embora em 2023 essa porcentagem tenha caído para 40,6%, ela ainda é significativamente mais alta do que em outras faixas etárias e quase triplica a incidência de pobreza em pessoas com mais de 60 anos de idade. 

Um fator agravante é a falta de acesso a redes de proteção social. De acordo com o Unicef, em 2023, menos da metade da população com menos de 15 anos de idade recebia um benefício social efetivo, um número que chega a 79,3% em pessoas com mais de 65 anos de idade. É essencial corrigir isso para garantir os direitos básicos e reduzir as lacunas de desenvolvimento. Mas esses números não refletem apenas a privação material, mas também as profundas desigualdades estruturais que condicionam o acesso das crianças à educação, à saúde e ao bem-estar.

O trabalho infantil: uma ferida aberta

O trabalho infantil persiste como um dos maiores obstáculos ao pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes na América Latina. De acordo com dados da Organização Internacional do Trabalho e do UNICEF, 8,2 milhões de crianças e adolescentes da região trabalham, sendo que mais da metade delas realiza trabalhos perigosos que afetam sua saúde física, educação e bem-estar emocional. Além de comprometer seu desenvolvimento, o trabalho infantil limita o acesso à educação, perpetuando ciclos de pobreza intergeracional.

O impacto da pandemia exacerbou esse problema. Muitas famílias, pressionadas pela recessão econômica, recorreram ao trabalho infantil como estratégia de sobrevivência. Essa situação é especialmente crítica nas áreas rurais, onde a falta de serviços básicos e de oportunidades educacionais torna as crianças ainda mais vulneráveis.

A violência contra crianças é outra crise latente na região. Em países como Honduras, Guatemala e El Salvador, as crianças enfrentam agressões físicas, sexuais e psicológicas tanto em casa quanto em suas comunidades. De acordo com o Unicef, até 2022, duas em cada três crianças com menos de 15 anos na América Latina e no Caribe terão sofrido disciplina violenta em suas casas. Essa situação, agravada pelo deslocamento forçado e pela insegurança, aumenta sua vulnerabilidade.

O fechamento de escolas durante a pandemia intensificou esses riscos. Mais de 10 milhões de crianças na América Latina foram excluídas do sistema educacional, limitando suas oportunidades de desenvolvimento e aprofundando as desigualdades.

Nesse contexto, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável surge como um roteiro para abordar essas questões. Dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), vários se concentram diretamente na melhoria das condições de vida dos menores. Por exemplo, o ODS 1 busca eliminar a pobreza em todas as suas formas, enquanto o ODS 4 promove a educação inclusiva e de qualidade e o ODS 8 visa erradicar o trabalho infantil até 2025.

O relatório do ODS 2023 destaca retrocessos em indicadores-chave, como pobreza infantil e exclusão educacional, em nível global. Na América Latina, embora tenha havido progresso em áreas como mortalidade infantil e acesso à educação primária, a pandemia e as recentes crises econômicas aumentaram as lacunas. Essas desigualdades estruturais dificultam o cumprimento das metas, especialmente nas comunidades marginalizadas.

Para que a região avance em direção aos ODSs, é essencial adotar estratégias abrangentes que priorizem a proteção social, fortaleçam os sistemas educacionais e promovam campanhas de reintegração escolar em massa. Como o relatório aponta, a colaboração entre governos, agências internacionais e sociedade civil é essencial para garantir que nenhuma criança seja deixada para trás.

Os desafios são imensos, mas também o são as oportunidades de transformá-los. Redobrar os esforços em políticas públicas voltadas para a criança, como a expansão de programas de transferência de renda, o acesso à educação gratuita e de qualidade e a proteção integral à criança, pode fazer uma diferença significativa.

A experiência de países que conseguiram reduzir com sucesso o trabalho infantil e a pobreza mostra que uma abordagem colaborativa e sustentável é fundamental. A mensagem de João Paulo II de que “os pobres não podem esperar” deve ser ampliada com urgência: as crianças da América Latina não podem esperar. Proteger seu presente e garantir-lhes um futuro digno é um dever ético que define nossa humanidade e o tipo de sociedade que desejamos construir.

Tradução automática revisada por Giulia Gaspar.

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Mestre em Estatística pela PUC Chile. Sócia fundadora da DATAVOZ, uma agência de pesquisa de mercado e opinião pública no Chile. Membro do Conselho de Administração de WAPOR Latin America.

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