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A eclosão social no Panamá não encontra uma saída política

A eclosão social que afeta a sociedade panamenha é o produto de três fatores cumulativos que interagiram para provocar uma tempestade perfeita: elevação brusca do custo de vida, evidência descarada da desigualdade social e declínio da credibilidade do governo em exercício, devido a mostras de corrupção e manuseio desajeitado da crise.

Os sindicatos e as organizações sociais têm sido o canal de um mal-estar social provocado diretamente pelo preço elevado dos combustíveis e dos produtos básicos, que constituíram o início das reivindicações fundamentais dos protestos sociais. Desde o começo do ano, os preços têm aumentado, até que, por exemplo, um galão de gasolina chegará a US$ 5,17 em junho. Pode não parecer um preço tão alto no panorama internacional, mas é um salto incomportável para boa parte da população panamenha.

O problema do forte aumento do custo de vida se agrava seriamente em meio a desigualdade social rampante. O Panamá sofre da dissociação de duas esferas de consumo. A proveniente dos altos salários auferidos pelos profissionais dos dois principais enclaves econômicos (o manejo do canal e os serviços bancários internacionais) e a formada pelos trabalhadores que mantêm os baixos custos desses serviços e do resto da população rural e, sobretudo, para o Darien, indígena. A cidade do Panamá tem os restaurantes mais caros da região, ao lado dos mais humildes carrinhos de comida de rua. E esta desigualdade se estende à maioria dos outros ramos de consumo do país. Com o agravante de que é o nível superior de consumo o mais exposto pela mídia. 

E neste contexto, aparecem escândalos de corrupção em um governo que não adotou medida alguma para paliar o brusco salto da inflação, até que o protesto irrompeu explosivamente nas ruas. Diante da avalanche social, o presidente Laurentino Cortizo decidiu impor medidas de urgência, começando por baixar o preço da gasolina dos US$ 5,17 vigentes para US$ 3,95 o galão. Mas o protesto já havia adquirido uma dimensão e uma dinâmica difíceis de conter.

De fato, o acordo alcançado entre o governo e os coordenadores sociais mais relevantes, a Alianza Nacional por los Derechos del Pueblo Organizado (ANADEPO) e a Alianza Pueblo Unido por la Vida, não conseguiu deter os protestos. Representantes da ANADEPO foram forçados a desfazer o acordo, alegando que “as pessoas nas ruas não aceitam o acordado”. As negociações com a Coordinadora Nacional de los Pueblos Indígenas de Panamá (COONAPIP) foram mais bem-sucedidas, pois aceitaram levantar o bloqueio das rodovias, enquanto uma Comissão Interinstitucional de Alto Nível para atenção prioritária das diversas demandas dos povos indígenas do país, constituída para tal, está em sessão.

Por outro lado, na cidade do Panamá e em outras capitais de província, várias organizações têm mantido suas mobilizações, incluindo o poderoso sindicato da construção civil (SUNTRACS), que tem bloqueado as principais artérias da capital do país.

O governo de Cortizo e outros setores sociais e econômicos empreenderam novas iniciativas de negociação, agora empregando a Igreja Católica como mediadora e com o apoio do Defensor del Pueblo. Mas os coordenadores sociais estão conscientes de que os segmentos mais radicais do protesto não desejam uma pronta negociação e que o início dos ataques aos comércios pode levar a um enfrentamento aberto com as forças de segurança, que já foram empregadas para despejar algumas das principais ruas.

Nestas condições, tudo indica que esta explosão social, que nasceu de forma bastante espontânea, dificilmente poderá ter canais no sistema político e que é altamente provável que seu fim produza rupturas dolorosas no tecido social panamenho.

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Enrique Gomáriz Moraga tem sido pesquisador da FLACSO no Chile e outros países da região. Foi consultor de agências internacionais (UNDP, IDRC, BID). Estudou Sociologia Política na Univ. de Leeds (Inglaterra) sob orientação de R. Miliband.

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