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A popularidade das políticas de punho de ferro

Co-autor Jonathan D. Rosen

A América Latina e o Caribe vêm lutando há anos com uma epidemia que não é a do coronavírus. As altas taxas de homicídios na maioria dos países da região levaram a Organização Mundial da Saúde a classificar este flagelo como uma epidemia. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), entre 2000 e 2010 mais de um milhão de pessoas morreram como resultado da violência criminosa. Durante esses anos, a taxa de homicídios cresceu quase 11%, registrando mais de 100.000 assassinatos por ano. Neste contexto, os governos de ambos os lados do espectro político implementaram políticas de segurança com um aumento na popularidade das políticas de punho de ferro.

O endurecimento de sentenças, o uso discricionário da força por parte da polícia, o encarceramento em massa e até mesmo a militarização da política doméstica têm sido algumas das iniciativas para enfrentar a violência e os sentimentos de insegurança. Mas, de acordo com diferentes pesquisas, as políticas de punho de ferro têm impacto limitado nas taxas de homicídios e nos níveis gerais de criminalidade.

As redes criminosas se adaptaram a estas estratégias, tornando-se mais violentas e organizadas. Alguns estudos também apontam que as políticas de punho de ferro implementadas na região nas últimas décadas têm minado a democracia de diferentes maneiras. Neste contexto, por que a mão pesada permanece tão popular apesar das amplas evidências contra ela?

Brasil e Colômbia

Como em outros países, as percepções de insegurança no Brasil e na Colômbia favoreceram a eleição de candidatos de direita que chegaram ao poder apoiados por propostas radicais contra o crime. Em 2018, os colombianos votaram em Iván Duque, que prometeu relançar muitas das estratégias implementadas pelo ex-presidente Álvaro Uribe, para que os criminosos em seu país soubessem desde o primeiro dia que “aqui se faz, aqui se paga”. Nesse mesmo ano, o Brasil elegeu Jair Bolsonaro, que além de elogiar as décadas de ditadura militar, garantiu sem hesitação que com seu plano os criminosos “morreriam na rua como baratas”.

Em nosso artigo de pesquisa recentemente publicado no Trends in Organized Crime, onde usamos dados do Projeto de Opinião Pública da América Latina (LAPOP, sua sigla em inglês ) da Universidade Vanderbilt, revelamos que a vitimização do crime e a ideologia não são fatores relevantes de apoio às políticas de punho de ferro no Brasil e na Colômbia.

As taxas de criminalidade em ambos os países não influenciam diretamente as preferências punitivas das pessoas. O apoio ao punho de ferro parece estar relacionado a fatores emocionais como o medo do crime. Os eleitores conservadores, por outro lado, não são necessariamente mais punitivos, porque o apoio ao punho de ferro se estende a todo o espectro ideológico. Da mesma forma, as pessoas que apoiam as Forças Armadas, uma instituição que goza de altos índices de confiança em ambos os países, são mais propensas a favorecer medidas extremas sobre o assunto.

Apesar das escolhas dos eleitores no Brasil e na Colômbia, os determinantes socioeconômicos subjacentes à crescente popularidade dessas medidas não são os mesmos em ambos os países. No Brasil, o regime político não parece ser uma prioridade se o governo quiser enfrentar o crime, pois tanto os partidários da democracia como os partidários do regime militar concordam que as penas para o crime devem ser aumentadas.

Curiosamente, o caso brasileiro também revela que a demanda por um punho de ferro cresce entre aqueles com níveis mais altos de educação e renda familiar mensal. Isto sugere que as preferências punitivas estão ligadas à classe social.

Na Colômbia, pelo contrário, as pessoas que acreditam que a democracia é o melhor sistema de governo são mais a favor do punho de ferro. Isto explica porque os colombianos não estão dispostos a sacrificar a democracia para combater o crime, apesar de suas preferências punitivas.

Além disso, os resultados da pesquisa também indicam que as pessoas idosas e as que residem em áreas rurais são mais propensas a apoiar medidas extremas. Enquanto o envelhecimento parece estar ligado a menores riscos de vitimização e ao fato das pessoas mais velhas terem testemunhado a violência da “guerra às drogas” durante os anos 1980 e 1990, é provável que o punitivismo nas áreas rurais esteja associado a altos níveis de tráfico de drogas e organizações guerrilheiras.

Colombianos e brasileiros compartilham grande preocupação com o crime e a insegurança, e os cidadãos de ambos os países estão dispostos a tomar medidas drásticas. A ascensão de Bolsonaro e Duque, similar a outros países da região durante a última década, pode ser entendida como uma resposta à opinião pública e à crescente popularidade do punitivismo. Isto em um contexto onde o sistema partidário tradicional e as ideologias políticas estão perdendo relevância diante das percepções de insegurança.

Por outro lado, os altos níveis de confiança nas Forças Armadas aceleraram a militarização da segurança doméstica, apesar das violações dos direitos humanos e das consequências negativas para a democracia. Apenas algumas décadas após o processo de democratização que caracterizou a América Latina, os cenários na Colômbia e no Brasil ilustram muitos dos dilemas que a região enfrenta hoje.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

Photo by canhotagem on Foter.com / CC BY-NC

Autor

Profesor Asistente del Departamento de Asuntos Internacionales de la O.P. Jindal Global University (India). Doctor en Estudios Internacionales por la Universidad de Miami. Especializado en crimen organizado y política de drogas en América Latina.

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