Coautora Carolina Guerrero
Neste domingo, a ex-primeira-dama da Guatemala, Sandra Torres, pode aprofundar o êxito eleitoral das ex-primeiras-damas na América Latina se ela se tornar a segunda presidente ativa, após a ex-primeira-dama Xiomara Castro assumir a presidência de Honduras em 2022.
Torres representa o partido conservador Unidade Nacional de Esperança (UNE) e concorre em desvantagem contra o deputado Bernardo Arévalo, ex-chanceler e ex-embaixador na Espanha, que fundou o partido progressista Movimiento Semilla após os protestos sociais que abalaram o país em 2015.
A proposta de Torres é conservadora. Em temas sociais, se opõe ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e promove visões próximas aos evangélicos. Torres também prometeu melhorar a segurança pública apoiando-se em ideias similares às do presidente salvadorenho Nayib Bukele, combater a corrupção, promover o turismo, eliminar o IVA, dar bônus mensais às mães de família e fornecer ajuda econômica e alimentos aos mais pobres.
O segundo turno eleitoral ocorrerá em meio a uma crise institucional provocada pela decisão da Procuradoria Geral de suspender a condição jurídica do partido Semilla de Arévalo. A Procuradoria acusou o partido de fraude por usar mais de 5.000 assinaturas falsas para registrar o coletivo, mas a decisão foi revertida pela Corte Constitucional. “É uma situação preocupante em termos do processo eleitoral e do funcionamento das instituições de um estado democrático”, disse recentemente o Secretário-geral da OEA, Luis Almagro, ao apresentar o relatório sobre o primeiro turno. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos também destacou “sua preocupação com a interferência no processo eleitoral na Guatemala, em um contexto de falta de independência do Ministério Público e de seu Procurador Geral”.
Esta é a quarta vez que Sandra Torres tenta se tornar presidente. Em 2011, ela se divorciou do presidente Álvaro Colom “para se casar com o povo” através de sua candidatura, que não prosperou porque a Corte Constitucional da Guatemala decidiu que ela violava o artigo 186 da Constituição. Torres não desistiu e, em 2015, concorreu como candidata presidencial da UNE, o mesmo partido que levou Colom à presidência, e acabou perdendo no segundo turno para o comediante Jimmy Morales. Torres tentou de novo nas eleições de 2019, quando também perdeu no segundo turno para o atual presidente, Alejandro Giammattei.
Ex-primeiras-damas no Executivo
Desde 1990, ex-primeiras-damas tentaram onze vezes se tornar presidentes e conseguiram em três oportunidades (Cristina Fernández na Argentina, em 2007 e reeleita em 2011, e Xiomara Castro em Honduras, eleita em 2022). Sandra Torres e Patricia Escobar em 2011 na Guatemala, Xiomara Castro em Honduras em 2013, Marta Linares no Panamá em 2014 e Keiko Fujimori no Peru em 2011, 2016 e 2021 não tiveram sucesso. Ademais, em oito vezes ex-primeiras-damas foram candidatas à vice-presidência e ganharam em cinco oportunidades (Margarita Cedeño de Fernández na República Dominicana em 2012 e 2020; Cristina Fernández na Argentina desde 2019 e Rosario Murillo na Nicarágua em 2016 e reeleita em 2021).
Além dos casos descritos, nos últimos anos houve duas ex-primeiras-damas que foram pré-candidatas à presidência, mas não chegaram à eleição: Margarita Zavala renunciou antes da eleição presidencial de 2018 no México, enquanto Cristiana Chamorro não pôde concorrer em 2021 na Nicarágua porque foi presa por ordem do governo.
As candidaturas de ex-primeiras-damas a cargos de eleição nacional são uma tendência crescente na América Latina. Entre 1999 e 2016, elas concorreram 26 vezes como candidatas à presidência, vice-presidência ou ao Congresso, e foram eleitas em 19 ocasiões (Guerrero Valencia e Arana Araya, 2018). Na publicação When Do First Ladies Run for Office? Lessons from Latin America, mostramos que a probabilidade prevista de as primeiras-damas com experiência prévia como políticas eleitas concorrerem em eleições é de 70% e que há 86% de chance de elas concorrerem ao Congresso, à Presidência ou à Vice-Presidência na primeira oportunidade que tiverem após deixarem o Poder Executivo.
A tendência de aumento nas candidaturas é clara: 15 das 26 candidaturas que estudamos ocorreram entre 2010 e 2016. Desde 2016, cinco ex-primeiras-damas concorreram à presidência. Por que tantas primeiras-damas se lançam como candidatas?
Há três razões pelas quais são candidatas únicas. Primeiro, gozam de amplo reconhecimento público e cobertura midiática, o que lhes permite se tornar conhecidas, influenciar a agenda pública e se posicionar em temas relevantes. Segundo, as primeiras-damas desfrutam de inúmeros privilégios devido ao seu acesso à cúpula do Poder Executivo. A posição lhes permite desenvolver conexões pessoais com a elite política e, assim, aumentar seu próprio capital político. Terceiro, a imagem pública das primeiras-damas está inevitavelmente ligada ao político mais poderoso do país. Isso acarreta associações positivas e negativas, mas, inevitavelmente, a imagem presidencial se transfere parcialmente a elas. Nesta semana, Torres terá pela terceira vez a oportunidade de enfim abandonar a sombra de seu ex-marido.
Carolina Guerrero Valencia é pesquisadora associada do Instituto GIGA de Estudos Latino-Americanos, na Alemanha. Sua pesquisa se concentra em primeiras-damas, elites, poder executivo, relações executivo-legislativo e mulheres na política na América Latina.
Autor
Professor Assistente de Ciência Política na Carnegie Mellon University. Especializado em comportamento presidencial e estudo comparativo de instituições políticas na América Latina. Mais informações em www.ignacioarana.org