Co-autor Ángel Arellano
Somente em novembro de 2021, a América Latina terá cinco processos eleitorais, em contextos que diferem muito entre si. A Nicarágua realizará eleições gerais, a Argentina legislativas de meio-termo, o Chile gerais, a Venezuela regionais/municipais e Honduras gerais.
Duas dessas eleições, a nicaraguense e a venezuelana, são processos com muitas críticas por parte de diversas instituições internacionais. Dessa forma, esta agenda eleitoral terá a oportunidade de trazer uma renovação em alguns países, enquanto em outros devemos presenciar uma ratificação do regime existente.
A América Latina é hoje uma pista de pouso para vários projetos de investimento de potências não democráticas – China e Rússia na vanguarda – que fizeram desta vizinhança uma de suas prioridades de expansão; portanto, um olhar atento sobre os processos eleitorais na região é relevante do ponto de vista do fortalecimento das democracias, dos partidos políticos e da coexistência plural.
Nicarágua (gerais): domingo 7 de novembro
No domingo 7 de novembro, os nicaraguenses foram chamados a votar em umas eleições intensamente criticadas. Os eleitores tem que votar para 92 deputados nacionais, 70 deles para a Assembléia Nacional Nicaraguense e 20 para o Parlamento Centro-Americano. É uma eleição (ou melhor, uma votação) de ratificação, não de renovação do governo. A possibilidade de alternância no poder não está presente porque a oposição foi banida por sucessivas prisões de candidatos, ordenadas desde o gabinete do Presidente Daniel Ortega. Da mesma forma, o Conselho Supremo Eleitoral retirou o status legal de vários partidos da oposição.
Argentina (legislativas): domingo, 14 de novembro
Depois das primárias abertas, simultâneas e obrigatórias (PASO) de setembro passado – nas quais o governo do peronista Alberto Fernández e sua coalizão Frente de Todos sofreu uma derrota notável na maioria dos distritos, e a coalizão de oposição Juntos pelo Cambio teve um incremento importante de votos – o governo teve que enfrentar várias crises, com a renúncia de ministros e fortes divergências dentro do peronismo. Após uma remodelação do gabinete e um relançamento da administração do governo, a perspectiva é incerta e não muito encorajadora para o governo. A aprovação presidencial não melhorou e as críticas são abundantes, como as que se referem às dificuldades de acesso à informação pública.
A Argentina está passando por um delicado clima socioeconômico: 50% de sua população vive na pobreza e há pouca expectativa de uma retomada econômica no horizonte. Esta eleição legislativa, como qualquer teste de meio-termo, será decisiva para o futuro do governo de Fernández e da oposição.
Chile (gerais): domingo 21 de novembro
Nessas eleições gerais, o Chile elegerá um novo presidente, 155 cadeiras na Câmara dos Deputados e 27 dos 50 senadores. A eleição será realizada em um clima político rarefeito. A agitação durante os protestos que marcaram o segundo aniversário do surto social, no passado 18 de outubro, mostrou que os fantasmas da violência não desapareceram totalmente das ruas.
Segundo as pesquisas, este cenário parece favorecer a candidatura do direitista José Antonio Kast, que muitos consideravam extrema demais para ter uma chance de vencer as eleições. Tudo indica que seu oponente no segundo turno em dezembro será o esquerdista Gabriel Boric, cuja candidatura reúne muitos dos movimentos sociais por trás da agitação social e cuja coalizão eleitoral inclui forças de extrema esquerda que contrariam a imagem conciliadora cultivada pelo jovem candidato.
A polarização entre Boric e Kast deixou pelo caminho os candidatos dos blocos tradicionais, a ex-Concertación e a ex-Alianza por Chile, a democrata-cristã Yasna Provoste e o independente Sebastián Sichel, ambos muito atrás de Kast e Boric nas urnas.
A eleição chilena ganha especial relevância no contexto da Convenção Constitucional, dominada pelas forças de esquerda, que está em processo de elaboração de uma nova constituição. O novo Congresso terá que coexistir com esta Convenção e isto pode trazer incertezas institucionais.
Venezuela (regionais e municipais): domingo, 21 de novembro
Há alguns meses, a oposição ao regime de Nicolás Maduro e seu Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), reunidos na coalizão da Unidade Democrática, decidiram participar destas eleições. Isto ocorreu após uma renovação das autoridades do Conselho Nacional Eleitoral, no qual dois (dos cinco) reitores não alinhados com o partido governista foram incorporados.
A entrada de líderes da oposição na arena eleitoral aumentou o número de opções políticas e estimulou a mobilização em regiões e municípios. Entretanto, os 24 governos e 335 prefeituras em jogo, dos quais a oposição detém atualmente 4 e 30 respectivamente, têm muito pouca capacidade de gestão governamental autônoma, tendo sido esvaziados de poderes e recursos durante os 22 anos do regime Chavista. Assim, a luta nessa eleição não é por espaços locais, mas para ganhar terreno contra o PSUV.
Honduras (gerais): domingo 28 de novembro
A democracia hondurenha tem o teste de renovar suas autoridades políticas em uma eleição geral que inclui o presidente, todo o Congresso (128 deputados), os 20 representantes do país no Parlamento Centro-Americano e 298 prefeitos e vice-prefeitos. A batalha presidencial será entre Nasry Asfura, pró-governamental, e Xiomara Castro, esposa do ex-presidente esquerdista Manuel Zelaya.
O desafio mais importante será conseguir o reconhecimento geral dos resultados, diante de instituições eleitorais fracas e do crescente descrédito da atividade política. Este slogan tem sido ecoado por representantes de organizações multilaterais no país, como o chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Européia, que apelou para o respeito pelos resultados em um tenso clima político.
Eleições em regimes não-democráticos e a atenção externa
Embora ainda haja um longo caminho a percorrer na construção e consolidação de muitas democracias latino-americanas, a situação atual merece uma reflexão sobre os regimes autoritários hegemônicos que convocam uma votação – não uma eleição – para ratificar sua existência e mostrar alguma fachada de democracia, embora em um contexto de total cooptação de instituições.
A reação do Ocidente a esses eventos eleitorais será particularmente importante. A China e a Rússia, que não têm interesse em eleições democráticas, mas têm interesses na região, também estarão atentas, não apenas a esses dois resultados, mas também aos resultados das cinco eleições. A verdade é que não é apenas a América Latina que estará atenta às lições que deixará o novembro eleitoral.
Ángel Arellano é doutor em ciência política, mestre em estudos políticos com especialização em governo e administração, e é jornalista. Coordenador do projeto na Fundação Konrad Adenauer, escritório do Uruguai e coordenador da equipe editorial do Diálogo Político.
*Texto originalmente publicado em Diálogo Político
Autor
Diretor do Programa dos Partidos Políticos e Democracia na América Latina da Fundação Konrad Adenauer, com sede em Montevidéu, Uruguai.