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Crime organizado, extrativismo e ausência de estado de direito na Guatemala

Guatemala é um país no qual o fraco estado foi capturado há décadas por uma aliança entre o empresariado e o crime organizado, por um lado, e a classe política, configurada tanto por deputados como por membros do Executivo, por outra, em uma clara interconexão. Este cenário foi exacerbado durante a pandemia ao serem decretados Estados de Sítio em zonas ocupadas por empresas de mineração para perseguir líderes comunitários e em áreas de conflito social. 

Neste sentido, pode-se citar várias situações acerca da perseguição do governo do presidente Alejandro Giammattei de atores do poder judiciário que tem como missão trabalhos relacionados a atos de corrupção ou de proteção de violações dos direitos humanos, assim como a consolidação da impunidade com que o governo encobre os abusos ambientais dos quais as empresas transnacionais de mineração em conluio com a elite nacional são os beneficiários.

No primeiro âmbito, o desmantelamento de oficiais do Poder Judiciário que mantiveram uma atitude independente tem sido uma nota dominante nos últimos tempos. Assim, Juan Francisco Sandoval Alfaro, ex-Procurador da Promotoria Especial contra a Impunidade, que já estava sendo perseguido pelo aparato estatal desde o governo do presidente anterior, Jimmy Morales, ao descobrir o caso do Tapete – que os empresários mineiros russos  levaram à casa presidencial, contendo em seu interior maços de milhares de dólares – acionou o detonador para sua partida para o exílio, primeiro para El Salvador e depois para os Estados Unidos. 

Na mesma direção, em 9 de março a magistrada Erika Afián seguiu a mesma rota que Sandoval Alfaro, integrando uma lista de quinze operadores de justiça que recentemente deixaram o país. Afián abandonou uma carreira judicial de quase vinte anos na qual havia lidado com casos de corrupção, lavagem de dinheiro e narcotráfico envolvendo dezenas dos empresários, políticos e chefes criminosos mais poderosos de seu país, até chegar ao próprio presidente Giammattei. 

De maneira semelhante, até o momento, nesse cenário sombrio e em uma direção semelhante, o Supremo Tribunal de Justiça suspendeu, em 22 de março, o juiz anticorrupção Pablo  Xitumul, conhecido por seu combate contra a corrupção e o manejo de casos envolvendo altos cargos das Forças Armadas.

No segundo âmbito, em outubro de 2021, forças policiais e do exército entraram em algumas comunidades em El Estor, um povoado perto da costa caribenha, usando como escudo legal o Decreto do Estado de Sítio estabelecido para o município no contexto da pandemia. 

Então, uma família de ativistas comunitários em defesa do meio ambiente, perseguidos pelo Estado e pela mineradora, foi detida pelas forças policiais que apreenderam computadores e material armazenado em uma rádio católica/comunitária. 

Como muitas outras, tratou-se de pessoas altamente expostas e sem nenhum tipo de apoio ou proteção para sua luta contra a empresa suíço-russa Solway, proprietária de uma mina de níquel a céu aberto. Santa Catarina Ixtahuacán-Nahualá no oeste do país também são áreas conflituosas que também estão tomadas pelo crime organizado.

Este cenário, que em definitivo teve seus mais recentes prolegômenos quando a ex-procuradora-geral Thelma Aldana foi bloqueada em sua corrida presidencial com o Movimento das Sementes e teve que se exilar nos Estados Unidos em 2019, é, por outro lado, condizente com o desempenho do país em outros indicadores. Assim, o Índice de Transformação da Fundação Bertelsmann para 2022 coloca a Guatemala como o quarto pior desempenho na região, superando apenas Nicarágua, Cuba e Venezuela, algo já assinalado pelo índice de The Economist Intelligence Unit para 2021

Ambas as medidas confirmam o cenário acima indicado, o que também é consistente com o posto 150 que ocupa o país em um total de 180 no Índice de Percepção de Corrupção da Transparency International. O relatório sublinha que o caso poucas vezes citado da Guatemala, cujo nível de ingresso das remessas de seus migrantes a coloca em segundo lugar de toda a América Latina, atrás apenas do México (US$ 11 bilhões), situa o país na base do desempenho político latino-americano. Seu caráter de estado semifalido se combina com uma alta deterioração de sua institucionalidade democrática, que o conduz à beira do autoritarismo.

António Guterres, o secretário geral da ONU, em 24 de março, em resposta à perseguição que os promotores e juízes sofrem por parte do Estado, mostrou sua preocupação com esta situação, assinalando a importante contribuição que os funcionários judiciais guatemaltecos deram no combate à impunidade e à corrupção. Uma tarefa que durante anos foi apoiada pelo trabalho da Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG) desmantelada com vergonha em setembro de 2019.

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Otros artículos del autor

Profesor Emérito de la Universidad de Salamanca y de la UPB (Medellín). Últimos libros publicados (2020): “El oficio de político” (2ª ed., Tecnos, Madrid) y coordinado con Mercedes García Montero y Asbel Bohigues (2024): “Elecciones en América Latina: de pandemia y de derrotas (2020-2023)”, (Centro de Estudios Políticos y Constitucionales. Madrid)

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