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Discursos de ódio: um desafio para a convivência democrática

O protagonismo que esses discursos de ódios alcançaram é preocupante, entre outras coisas, porque amplifica a visibilidade e a ressonância dos preconceitos existentes e contribui para a deterioração da convivência social.

Você tem uma conta em uma rede social? Se sim, provavelmente já leu ou viu mensagens cheias de animosidade, rejeição ou, definitivamente, ódio contra um determinado grupo-alvo só por existir. Como reagimos a essas mensagens?

Embora não exista uma definição única de discurso de ódio, cremos que a proposta das Nações Unidas se aproxima de uma noção compartilhada. Ela é: “Qualquer tipo de comunicação, seja oral ou escrita – ou comportamento – que ataque ou use linguagem pejorativa ou discriminatória em referência a uma pessoa ou grupo em função do que são; em outras palavras, com base em sua religião, etnia, nacionalidade, raça, cor, descendência, gênero ou outras formas de identidade”.

O protagonismo que esses discursos de ódios alcançaram é preocupante, entre outras coisas, porque amplifica a visibilidade e a ressonância dos preconceitos existentes e contribui para a deterioração da convivência social. Esse fenômeno se intensifica de forma preocupante em períodos eleitorais, situação em que o Chile se encontra em 2024 com as eleições municipais e que continuará em 2025 com as eleições presidenciais e parlamentares. Nesse cenário, nossas sociedades parecem cada vez mais sensíveis a posições que não compartilham. Essa sensibilidade, embora compreensível, pode levar as pessoas a rotular como “discurso de ódio” qualquer opinião que seja diferente da sua.

Em um experimento conduzido por Datavoz, foi solicitado a uma amostra de pessoas que dissessem se achavam que as mensagens às quais eram expostas eram discurso de ódio ou não. A frase a ser avaliada dizia: “[X] são os que criam uma atmosfera de confronto e desrespeito. Deveriam receber uma lição”. O relevante para o experimento é que a frase era a mesma, mas o “X” mencionado era aleatoriamente designado a cada respondente entre as duas opções a seguir: “Grupos religiosos” ou “Ativistas de minorias sexuais”. Como a frase era a mesma e os grupos foram atribuídos aleatoriamente, o que deveria acontecer é que a distribuição das opiniões sobre se era ou não discurso de ódio seria similar entre quem viu a frase com grupos religiosos e quem viu a frase com minorias sexuais. Mas o que aconteceu?

Os resultados foram muito interessantes em relação à lente pela qual são avaliados, especialmente quando se considera a posição ideológica do receptor, ou seja, seu autoposicionamento no eixo esquerda-direita. A percepção da mensagem como discurso de ódio varia acentuadamente nesse eixo. Enquanto os entrevistados mais à direita tendiam a minimizar os danos quando a mensagem se referia a minorias sexuais e a acreditar que o autor não tinha a intenção de causar danos, os mais à esquerda consideravam a mensagem mais séria e percebiam uma intenção prejudicial maior. Isso sugere que nossa percepção do discurso de ódio depende não só do conteúdo, mas também de nossa própria visão de mundo.

Por outro lado, é preocupante ver como a responsabilidade de ofender parece ser uma carga seletiva. Quando se trata de minorias sexuais, as pessoas de esquerda tendem a considerar o autor da mensagem mais culpado por causar ofensa. Entretanto, quando os comentários são direcionados a grupos religiosos, a avaliação é mais neutra, exceto entre aqueles que se autoclassificam mais à direita, que tendem a discordar da ideia de que o autor da postagem não tem responsabilidade por ofender outras pessoas.

Isso nos permite argumentar que a percepção do discurso de ódio e a atribuição de responsabilidade são profundamente influenciadas por nossos próprios preconceitos ideológicos. Como receptores de mensagens, não somos meros objetos de comunicação, mas atores interpretativos que filtram as informações através de nossos próprios preconceitos e sensibilidades e, dessa forma, as compartilham.

A democracia é enriquecida pelo debate e pela discordância, mas só se formos capazes de manejar nossas diferenças com respeito e empatia. Neste período eleitoral, como cidadãos responsáveis, é crucial que cultivemos essas qualidades e nos comprometamos a manter um espaço público mais saudável e respeitoso. A convivência democrática não é um presente; é uma tarefa contínua que exige o esforço e a colaboração de todos.

Autor

Sócio Diretor de Tendências Sociais em Datavoz, consultor de opinião pública. Doutor em Políticas Públicas (U.Chicago), acadêmico da Universidad del Desarrollo (Chile).

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