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Regimes híbridos na América Latina: El Salvador e México

Passaram-se 35 anos desde que a América Latina se democratizou no início dos anos noventa, quando vários países passaram do autoritarismo à democracia. Desde então, esta tem sido uma das regiões politicamente mais diversas em termos da gama de regimes que acolhe e das particularidades de cada um deles. Na verdade, dois países estão atualmente passando de democracias imperfeitas para regimes híbridos: México e El Salvador.

Os regimes híbridos, segundo especialistas como Leonardo Morlino e Terry Kart, se caracterizam por países que compartilham quatro condições: têm Estado de Direito fraco, são polarizados, têm uma forte presença militar e contam com eleições periódicas em um sistema pluripartidário e com alternâncias.

No caso de México e El Salvador, ambos coincidem na formação particular dos líderes que o encabeçam e como eles aproveitaram a pandemia da COVID-19 e os confinamentos para fortalecer suas lideranças. A pandemia acarretou um retrocesso em matéria democrática na região, de acordo com o relatório IDEA 2021, pois representou a possibilidade de adiar eleições, reter o poder ou consolidar seu projeto de governo.

No México, os fundamentos do autoritarismo não desapareceram

No México, o próprio presidente Andrés Manuel López Obrador afirmou: “A pandemia caiu como uma luva para consolidar a transformação”. Não apenas a frase foi polêmica, mas desde então a retórica oficial e a agenda do governo, contrária a vários setores da sociedade, foi radicalizada. E quanto à liberdade de expressão, o Governo começou a desqualificar e atacar os jornalistas, o que é uma característica do avanço em direção à hibridização.

Outro setor sob ataque tem sido a classe média. Em 2021, nas eleições de meio-termo, o oficialismo perdeu a maioria qualificada na Câmara dos Deputados e metade da capital do país, que historicamente pertenceu à esquerda. O presidente não tardou em atacar este setor, afirmando que “a classe média apoiou Hitler e Pinochet”.

Do ponto de vista da polarização, o presidente López Obrador e seus correligionários dividiram o país em dois: o povo bom contra os aspirantes ou corruptos. De fato, o mandatário declarou que “você está com a transformação ou contra ela”, o que mostra que para ele não há meio-termo. Isto também agrava ainda mais a divisão.

O terceiro elemento, o mais preocupante, é a militarização de funções que, historicamente, têm sido civis. Embora desde 2006 os militares tenham um papel relevante em funções de segurança pública, neste Governo este papel se aprofundou quando o exército se tornou o principal construtor dos megaprojetos do Governo federal.

As Forças Armadas também participaram de tarefas de educação quando foram encarregados de distribuir livros, na vacinação durante a pandemia e na formação de um corpo civil-militar conhecido como Guarda Nacional, que tem o objetivo de retornar o exército ao quartel. Esta militarização da esfera civil gerou preocupação, pois violou o artigo 129 da Constituição, que estabelece que, em tempos de paz, as Forças Armadas só podem realizar atividades relacionadas com a disciplina militar. Segundo o acadêmico Roger Bartra, a democracia chegou ao México e se abriu à pluralidade, mas os fundamentos do autoritarismo não desapareceram.

A rápida decomposição da democracia em El Salvador

Outro caso de hibridização é El Salvador, que vem se transformando desde que Nayib Bukele chegou à presidência. Trata-se de um outsider que rompeu com o bipartidarismo de Arena e Frente Farabundo Martí, e mostrou uma linha antidemocrática desde cedo. Em 10 de fevereiro de 2020, Bukele chamou à insurreição e às Forças Armadas para entrar no Congresso e obrigar os deputados a aprovarem o empréstimo para o Plano de Controle Territorial e, assim, combater o crime.

O uso do Exército para pressionar o Congresso fala de uma rápida erosão democrática, além de um amplo respaldo da população, pois o presidente chamou à insurreição via Twitter. Logo, em março de 2021, seu partido Novas Ideias ganhou uma maioria qualificada, e dentro de um mês expulsou cinco magistrados da Suprema Corte e nomeou outras pessoas próximas ao governo. Esta decisão violou a independência judicial e minou ainda mais a democracia.

Em março de 2022, decretou o primeiro estado de exceção e o prorrogou dez vezes até março de 2023. Os militares ganharam relevância e o Presidente Bukele os utilizou para justificar o combate ao crime, a falta de transparência e a constante violação dos direitos humanos. Ninguém se opõe à redução da criminalidade, mas existe um marco normativo para isso. Ao romper esta barreira, também rompeu a democracia, pois sem leis, a democracia não existe.

Por outro lado, em 16 de setembro de 2022, Bukele anunciou que buscaria a reeleição nas eleições de 2024. A Constituição proíbe em pelo menos 6 artigos a reeleição imediata da Presidência, mas esta decisão se justificou mediante uma decisão que estabelece que, embora a reeleição consecutiva não seja permitida, se o mandatário deixar o poder com 6 meses de antecedência, poderá concorrer novamente. Desta maneira, El Salvador se tornou uma autocracia, um regime centrado na personalidade de um líder, e o sistema político está sendo moldado em sua imagem e semelhança.

Além do diagnóstico, devemos nos preocupar com o avanço do autoritarismo, apesar do alto nível de popularidade e respaldo de dirigentes como López Obrador e Bukele. A democracia não é perfeita, mas é aperfeiçoável. Vale a pena outorgar o poder e ceder direitos a líderes autoritários para solucionar problemas com métodos que prejudicam a pluralidade e a institucionalidade?

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Cientista político. Formado na Universidade Nacional Autônoma de México (UNAM). Diploma em Jornalismo pela Escola de Jornalismo Carlos Septién.

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