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O assassinato do candidato Villavicencio e as eleições presidenciais de 2023 no Equador

Ontem, poucos dias antes das eleições, Fernando Villavicencio, candidato à presidência do Equador, foi morto a tiros durante um comício na escola Anderson, em Quito. O presidente Guillermo Lasso declarou estado de emergência por 60 dias em todo o país. O primeiro assassinato de um candidato presidencial na história do país é um ataque à democracia e visibiliza a profunda crise e a onda de violência política sem precedentes no Equador. Esse ato, precedido por ameaças e um atentado por parte de grupos criminosos, reflete o crescente desafio do crime organizado transnacional para os países latino-americanos e marca um ponto de inflexão para o futuro do Equador.

Villavicencio era jornalista, ex-deputado e candidato à presidência pelo Movimiento Construye. Em um contexto eleitoral marcado pela indecisão, o ex-candidato ficava em segundo, terceiro ou quarto lugar, dependendo da pesquisa. Ele foi um opositor ferrenho do governo de Rafael Correa e, durante sua gestão, denunciou supostos casos de corrupção e foi condenado a 18 meses de prisão em 2014, mas não cumpriu a pena porque se escondeu na selva amazônica.

Em 2016, um juiz ordenou sua prisão por divulgar informações confidenciais. Naquela ocasião, ele se refugiou em Lima e, em 2017, retornou ao país durante o governo de Lenín Moreno (2017-2021). Desde então, Villavicencio manteve um perfil político ativo e teve proteção policial, denunciando nos últimos anos as ações do crime organizado. Villavicencio também era um colaborador próximo do governo de Guillermo Lasso. Seu assassinato chocou o país e, somente neste ano, outros quatro políticos locais de diferentes tendências políticas foram assassinados.

Antes considerado uma ilha de paz e segundo país mais seguro da América Latina até 2017, o Equador deixou de ser um território de trânsito para se tornar um centro de armazenamento, processamento e distribuição de drogas na região. Diante das ameaças do crime organizado e daqueles que buscam soluções autoritárias, o país chegou a um ponto em que é urgente priorizar e defender a democracia, a paz e a segurança cidadã acima das diferenças políticas.

O dia 20 de agosto será um momento decisivo por vários motivos. Primeiro, serão realizadas eleições presidenciais e legislativas. Essas são eleições de meio de mandato, convocadas pelo Presidente Guillermo Lasso, após a dissolução da Assembleia Nacional, de maioria oposicionista. Essa decisão ocorreu em meio a um julgamento de impeachment contra ele, acusado de corrupção e desvio de verba pública.

A investigação, denominada “Gran Padrino“, revelou uma suposta rede de tráfico de influência dentro de empresas públicas, envolvendo pessoas próximas ao presidente, como seu cunhado Danilo Carrera, bem como o financiamento ilícito de sua campanha presidencial. O presidente equatoriano negou repetidamente essas acusações e, de acordo com organizações como a Repórteres Sem Fronteiras, tentou censurar o trabalho jornalístico dos denunciantes, descrevendo-os como “terroristas da mídia”.

A violência extrema que afeta o Equador, as ameaças e o clima hostil que se estabeleceu contra o jornalismo levaram à recente saída do país de Andersson Boscán e Mónica Velásquez, jornalistas do La Posta, bem como ao exílio dos jornalistas Karol Noroña e Lissette Ormaza.

Os problemas atuais do Equador são resultado de fatores estruturais e da inação do atual governo, que carece de uma verdadeira estratégia de segurança e contribuiu para o agravamento da situação por meio de um processo de erosão democrática progressiva e de políticas de austeridade e ajuste econômico.

Em meio a esse cenário, os eleitores indecisos nas próximas eleições ultrapassam 50%, mas várias pesquisas apontam que Luisa González, candidata da Revolución Ciudadana do ex-presidente Rafael Correa, lidera as intenções de voto, tendo chances de vencer já no primeiro turno. A depender da pesquisa, os candidatos Otto Sonnenholzner (Actuemos), Yaku Pérez (Alianza Claro que se Puede) e Jan Topic (Por un país sin Miedo) disputam o lugar no segundo turno com a candidata correista.

Em 20 de agosto, o Equador também realizará um referendo histórico que poderá pôr fim a seis décadas de extrativismo de petróleo no Bloco ITT, localizado no coração do Parque Nacional Yasuní. Esse parque, criado em 1979 e declarado Reserva da Biosfera pela UNESCO, é considerado um dos lugares com maior biodiversidade do planeta e um refúgio para os Tagaeri e Taromenane, os últimos grupos indígenas em isolamento voluntário no país. A centralidade dessa consulta está na possibilidade de começar a construir um modelo alternativo ao extrativismo que busca garantir o bem-estar sustentável centrado nos interesses da maioria. É também uma forma de preservar uma região de importância estratégica para o mundo e uma contribuição concreta contra as mudanças climáticas que colocaria o país na vanguarda da preservação e defesa ambiental.

O Equador é hoje um país mortalmente ferido que precisa urgentemente de um projeto de unidade, paz e reconstrução nacional. Nesse contexto, é essencial evitar a instrumentalização de assassinatos como o de Fernando Villavicencio e impedir a criminalização de qualquer movimento político. Diante das ameaças do crime organizado e das forças desestabilizadoras, o melhor antídoto é a unidade nacional e a condução adequada das eleições planejadas, com a observação e o apoio da comunidade internacional.

Embora o próximo governo será de transição, o próximo presidente do país terá uma tarefa hercúlea na qual a reconstrução do Equador, a garantia da democracia, da segurança pública e da justiça social devem ser a prioridade. Juntamente com esses objetivos, a consulta sobre o Yasuní também oferece uma oportunidade histórica para começar a pôr fim ao extrativismo e implementar ações de justiça ambiental e climática para o benefício de todos.

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Cientista política. Profesora de Relaciones Internacionales de la Universidad Federal Rural de Rio de Janeiro (UFRRJ) y del Postgrado en Ciencia Política de la UNIRIO. Doctora en Ciencia Política por la Universidad Complutense de Madrid.

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