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Lasso e o novo parlamento equatoriano

Em 22 de agosto, o novo parlamento equatoriano completou os seus primeiros 100 dias de mandato. Estes primeiros meses nos dão uma visão das frentes que irão marcar a relação entre o Legislativo e o Executivo liderado por Guillermo Lasso. E o rosto que começa a posicionar-se como chave para os próximos dois anos é o de Guadalupe Llori, um deputado indígena do partido Pachakutik que encarna a resistência à criação de uma frente comum de esquerda juntamente com o Correísmo, o principal grupo político nesta nova legislatura.

As controversas e duramente disputadas eleições presidenciais equatorianas mostraram o importante peso eleitoral que o Correísmo ainda tem. No entanto, por outro lado, especialmente no segundo turno, a enorme rejeição que suscita entre os seus opositores foi também evidente. Isso foi expresso, em certa medida, na atribuição de lugares na nova Assembleia Nacional. Para além do efeito que a implementação do método Webster possa ter tido nessa eleição, parece que o Poder Legislativo será o principal órgão coordenador e articulador com o qual o novo governo terá de lidar nesta nova etapa política no Equador.

Mesmo assim, o parlamento equatoriano como instituição pública tem muita credibilidade a reconstruir. A administração cessante conseguiu cerca de 10% de apoio popular para a sua administração. E embora as expectativas dos cidadãos em relação à nova legislatura tenham melhorado consideravelmente para uma média de 38% de confiança, a gravidade da crise sanitária e financeira do país não oferece muito espaço para apoio social.

Essa desconfiança deve-se também ao fato de mais da metade da representação parlamentar da última legislatura (2017-2021) ter mudado de filiação partidária durante o seu mandato. Este fenómeno de transfuguismo – conhecido coloquialmente no Equador como “camisetazos” – não só distorce a representação política, como também contribui para o descrédito generalizado que persiste sobre a Assembleia Nacional como um todo. Apesar do comprovado repúdio público desta prática, sete casos de transfuguismo já foram registados na atual legislatura.

O novo arco parlamentar

Neste contexto, à primeira vista, a nova correlação de forças destaca a desagregação organizacional do Correísmo. A Alianza País, para além da cisão na legislatura anterior, encontra-se atualmente sem lugares. No entanto, correísmo tem presença nos 49 deputados do partido Unión por la Esperanza (UNES), que foi alimentado eleitoralmente pela candidatura de Andrés Arauz. Por outro lado, houve um aumento na representação de partidos de esquerda não alinhados com o Correismo, tais como a Esquerda Democrática (18 lugares) e o movimento indigenista Pachakutik (27 lugares).

Esse distanciamento marcado entre os partidos de esquerda oferece espaços de diálogo com o partido que apoia o Presidente Lasso (Movimiento Creando Oportunidades CREO), que obteve apenas 12% de representação parlamentar. Do mesmo modo, o crescimento da representação política do Partido Social Cristão (PSC), o principal aliado estratégico do governo, também é digno de nota.

Apesar desta correlação de forças, em que o governo está em minoria, após ultrapassar algumas dificuldades foi possível alcançar uma aliança inicial, pelo menos para a nomeação das principais autoridades da Assembleia Nacional. Uma prévia, talvez, do tipo de relação que teremos entre o executivo e o legislativo durante, pelo menos, os próximos dois anos. Um padrão de governabilidade que, embora não pareça ser de hostilidade ou bloqueio, como ocorre em sistemas políticos como o do Peru, poderia levar a uma vigilância apertada do Executivo e a uma contenção política das suas iniciativas. Esse seria um ambiente desfavorável para mudanças muito radicais, pelo menos a curto ou médio prazo.

Ambiente parlamentar 2021

É importante notar que a análise da gestão legislativa não se deve basear apenas na produção quantitativa de leis e na ratificação de tratados internacionais. É também importante examinar a capacidade de supervisão do Parlamento sobre a administração pública como um todo. Daí a importância da sua operacionalidade institucional, independentemente da sua correlação de forças, o que permite a governação democrática do país.

Uma característica importante a destacar é a agenda parlamentar 2021-2024, que pela primeira vez desde 2008 não tinha sido elaborada em conformidade com a Lei Orgânica da Função Legislativa. Essa é uma característica importante da autonomia institucional que contrasta com as administrações anteriores.

Contudo, para além desta declaração de boas intenções, durante estes primeiros meses assistimos a tensões entre as bancadas principais, que se expressam na proliferação de exortações, bem como nas objeções às leis aprovadas pela administração cessante. Isto também tem sido visto nas acusações recorrentes de corrupção, na rejeição do relatório de gestão do Presidente Lenín Moreno e nos protestos de setores sociais importantes como os professores.

Assim, o tabuleiro de xadrez político resultante das eleições no Equador para 2021 já está a desenrolar-se, contra o pano de fundo dos rigores ainda impostos pela pandemia e por uma administração cessante com resultados socioeconômicos questionáveis.

Neste sentido, o principal ponto de tensão será certamente a aprovação do orçamento geral do Estado, bem como as principais iniciativas legislativas procuradas pelo novo governo, tais como a Lei da Comunicação. Mesmo assim, a Assembleia Nacional já aprovou quatro leis, três das quais são orientadas para a reativação econômica. Um interessante piscar de olhos temático considerando que quem ocupa o Palácio Carondelet chegou lá prometendo uma nova gestão fiscal do país para melhorar a economia equatoriana maltratada.

* Tradução do espanhol por Dâmaris Burity

Autor

Politólogo egresado de la Univ. Central de Venezuela y la Universidad Autónoma de Barcelona. Master en Estudios Latinoamericanos, Universidad de Salamanca. Analista de asuntos parlamentarios.

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