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Venezuela: ditaduras nunca perdem

Revisar o futuro da Venezuela, as possíveis saídas para a instabilidade política e a dramática situação social e humanitária não é uma tarefa fácil diante da avalanche de notícias e decisões diárias tomadas pelo regime de Nicolas Maduro. Assim, tendo em vista o anúncio de “antecipar o Natal”, a entrada em vigor da Lei Anti-bloqueio e os resultados da investigação realizada pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, parece que as eleições organizadas pelo regime ficarão em segundo plano. Entretanto, não devemos perder de vista o fato de que cada uma de suas decisões e pronunciamentos visam manter este processo, que foi feito sob medida.

Talvez a memória chilena, onde a saída do regime ditatorial ocorreu através das urnas, muitas vezes turva as decisões políticas daqueles que anseiam por uma saída pacífica e democrática a crise na Venezuela. Mas é importante ter em mente que a saída de Pinochet não foi determinada apenas por um processo eleitoral e que a situação do Chile naquela época era muito diferente da situação na Venezuela de hoje.

Estamos lidando com um regime vinculado ao narcotráfico que enfrenta numerosas pressões internacionais”

Estamos lidando com um regime vinculado ao narcotráfico que enfrenta numerosas pressões internacionais, que vão desde a econômica até a sua responsabilidade pela violação dos direitos humanos na Venezuela. Dada esta realidade, seus incentivos para uma solução negociada são poucos, se não inexistentes.

É necessário lembrar que, desde a chegada da Revolução Bolivariana na Venezuela, mais de 15 processos eleitorais já ocorreram. Destes, o regime foi capaz de calcular com precisão quais eram os movimentos necessários para assegurar sua vitória. Nos poucos casos em que concedeu uma vitória aparente, foi apenas para demonstrar uma certa transparência e participação da oposição. Entretanto, nesses casos, o governo já tinha um caminho claro para lidar com esses resultados e que na prática não se viam afetados.

Um dos exemplos mais claros desta manipulação eleitoral foi o Referendo Constitucional de 2007 onde, apesar de perder a consulta, se justificou por meio do Supremo Tribunal de Justiça (TSJ) a realização de uma emenda com os mesmos propósitos da reforma. E o segundo, a declaração de nulidade de todos os atos da Assembleia Nacional (AN) eleita para o período constitucional 2016-2021, declarando-a em desacato, o que significava que a oposição teria uma maioria qualificada.

Estas manipulações foram realizadas graças a uma constituição adaptada à Revolução, produto das bases eleitorais estabelecidas pelo Executivo Nacional para o processo constitucional de 1999, que permitiram que o chavismo obtivesse 95% das cadeiras com 60% dos votos. Mas, paradoxalmente, esta estrutura agora se revela muito apertada para seus propósitos, levando-os a fazer uma nova convocação para uma Assembleia Nacional Constituinte que, além de ter sido convocada e eleita de forma inconstitucional, foi criada com o propósito de usurpar as funções da AN.

Assim, uma nova e fraudulenta nomeação dos reitores do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e a suspensão das diretrizes dos partidos de oposição é alcançada, sem esquecer que anteriormente foi realizado o processo de (in)validação dos partidos políticos opositores ao regime e uma constante limpeza do partido único do governo. É com esta recente CNE que as eleições legislativas são convocadas, que não são livres nem justas, diante de uma divisão de poderes inexistente e de uma liberdade de expressão limitada.

Um dos pontos mais importantes a considerar é o das limitações impostas e das perseguições realizadas a qualquer voz da oposição”

Por esta razão, um dos pontos mais importantes a considerar é o das limitações impostas e das perseguições realizadas a qualquer voz da oposição na Venezuela. Pressão que já havia sido implementada pelo governo de Hugo Chávez, mas agora, amparando-se sob a Lei contra o Ódio, pela Coexistência Pacífica e a Tolerância – que além de ser emitida por uma Assembleia Nacional Constituinte que não tem o poder de fazê-la – é usada para suprimir qualquer vestígio de liberdade de expressão. E como não basta eliminar qualquer pronunciamento dissidente das ações do regime, ela é aplicada de forma discricionária e suas sanções são completamente desproporcionais, sendo a pena por homicídio intencional muito menor do que a imposta por supostas incitações ao ódio. 

Sendo assim, não existem condições mínimas para considerar um processo eleitoral desta natureza levando em conta que é uma das muitas ações exercidas pelo regime de Nicolas Maduro para tentar legitimar sua permanência no poder perante a Comunidade Internacional.

Todas estas são razões mais do que suficientes para não duvidar que se está enfrentando uma ditadura que por sua natureza não estará disposta a sair do poder e menos ainda pela via eleitoral.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

Autor

Professora na Pontificia Universidad Javeriana (Bogotá) e doutorando em Direito na Universidade Nacional da Colômbia. Especializada em movimentos migratórios, estudos de género e política venezuelana.

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